A discussão em torno do avanço das queimadas na Amazônia deixou mais evidente que o Brasil precisa decidir com urgência uma estratégia para a região. É a primeira vez, em mais de quatro décadas, que a região passou a ser o tema principal dos debates no país, principalmente pelo aumento da pressão feita tanto por investidores estrangeiros quanto por grandes empresários brasileiros.
As soluções propostas para a região passam pelo desenvolvimento de uma bioeconomia (economia sustentável) que surge com cada vez mais força. Entidades civis, empresários de diversos setores, especialistas em meio ambiente e até ex-presidentes do Banco Central e ex-ministros da Economia já levaram ao governo sugestões para a criação de uma economia verde na região. A ideia unânime é usar recursos da floresta sem derrubá-la.
Na semana passada, o movimento recebeu reforço dos três maiores bancos do país. Bradesco, Itaú e Santander apresentaram plano com dez propostas que vão do estímulo às monoculturas sustentáveis, por meio de linhas de financiamento, ao plano de atrair investimentos que promovam parcerias e o desenvolvimento de tecnologias voltadas à bioeconomia.
Para Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), a Amazônia pode ser um foco de desenvolvimento, principalmente neste momento em que o país precisa sair da crise, buscar financiamento externo e afastar o risco de ter produtos da área agrícola boicotados no exterior.
Junto com o Instituto Escolhas, o Irice entregou ao vice-presidente Hamilton Mourão propostas para destravar a bioeconomia da Amazônia nas áreas de financiamento e estrutura, desenvolvimento de produtos e de mercados e proteção da biodiversidade.
Em artigo para a revista Interesse Nacional, que preparou uma edição especial sobre bioeconomia, o próprio Mourão defende uma articulação entre governo e iniciativa privada para o desenvolvimento sustentável da região. “O futuro da Amazônia depende de uma articulação original entre capital, conhecimento, trabalho, tecnologia e natureza”, diz.
EMPREGOS
Nos planos para a Amazônia, uma das preocupações é a geração de empregos. O potencial é de milhares de vagas. Apenas dois projetos já apresentados pelo Instituto Escolhas preveem a criação de quase 500 mil empregos nas áreas de reflorestamento e desenvolvimento da piscicultura.
Um dos projetos do instituto prevê o reflorestamento de 12 milhões de hectares de áreas desmatadas, meta assumida pelo governo brasileiro em 2015 no Acordo de Paris. Pronto há quatro anos, o estudo prevê a necessidade de investimentos públicos e privados de R$ 52 bilhões até 2030. A estimativa é de geração de R$ 28 bilhões em receitas e 215 mil empregos. “Seriam necessárias 8 bilhões de árvores nativas para cobrir a área”, diz Leitão. “O país criaria uma indústria de recuperação de floresta tropical e envolveria uma grande cadeia produtiva.”
Várias instituições querem que projetos para uma Amazônia sustentável façam parte do programa de retomada da economia no pós-pandemia, até porque as pressões externas pelo fim do desmatamento colocam em risco novos investimentos no país.
“Os investidores estão carimbando o dinheiro e ele só poderá ser usado em projetos com impacto social e ambiental positivo”, diz Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), que reúne 60 grandes grupos empresariais e também levou propostas ao governo.
Acabar com o desmatamento na Amazônia e no Cerrado. O desmatamento responde por emissões de CO2 maiores que as de todo o setor industrial ou o de transporte.
Lastro verde (Bradesco, Itaú e Santander)
Fomentar projetos de desenvolvimento econômico e conservação por meio de ativos e instrumentos financeiros de lastro verde, como o pagamento por serviços ambientais e CBIOs – mercado de créditos de descarbonização.
Desenvolvimento industrial (Irice e Instituto Escolhas)
Mapear as matérias-primas e recursos da região amazônica, identificando a vocação de cada microrregião, e estimular o desenvolvimento da indústria local. Criar programas de atração e fixação de pesquisadores na Amazônia.
Sebrae da Floresta (Irice e Escolhas)
Implementar o “Sebrae da Floresta”, com foco nos produtores para estimular a cultura empreendedora na região. Incentivar, via acesso a crédito e a políticas públicas, a formalização dos produtores, cooperativas e associações locais.
Plano de zoneamento (iCS)
Fazer valer o plano de zoneamento econômico ecológico para definir as vocações de cada estado. O plano prevê, por exemplo, o desenvolvimento de sistemas agroflorestais, técnicas sustentáveis para a pecuária onde a atividade já existe e concessões para exploração sustentável.
Plano Safra (iCS)
Adequação do Plano Safra, colocando metas de financiamento para a agricultura de baixo carbono e, assim, evitar a degradação da floresta pelo uso não sustentável, principalmente pela pecuária. Ampliar a verba do programa Agricultura de Baixo Carbono (ABC), que hoje não chega a 5% do total de financiamentos do Plano Safra.
Bolsa de Mercadorias (Governo do Estado do Amazonas)
Criação da Bolsa de Mercadorias da Amazônia (BMA), que funcionaria como um mercado onde vendedores e compradores se reúnem para negociar os produtos do bioma amazônico, com garantia de qualidade, entrega e pagamento. Isso seria garantido por meio de instrumentos como contratos padronizados, unidades de recebimento e armazenamento de produtos estrategicamente posicionados, além da disseminação em massa dos preços em tempo real.