Imediatamente são chamados a dar pitacos alguns próceres do relativismo moral brasileiro como o ministro Marco Aurélio do STF e o presidente da OAB Felipe Santa Cruz, todos arautos das ameaças à democracia.
Mais uma vez se confunde e se corrompe o valor da liberdade que não pode prescindir de limite, uma vez que não se trata de um valor absoluto, sobretudo quando viola o mesmo direito à liberdade de outrem. O que está dito com todas as letras pelo desembargador.
Pois cabe ao Estado defender preceitos fundamentais de direitos individuais e coletivos como manda o artigo V da CF. Entre o direito de manifestação da crença e o direito à liberdade de expressão é que deve ponderar a Justiça.
Como corre nas redes sociais, o que demonstra o facciosismo esquerdista de humoristas, artistas e jornalistas é exatamente a perseguição aos valores da tradição cristã conservadora brasileira. Ou o grupo de humoristas ativistas teria a mesma empáfia de fazer um “Especial sobre a tentação de Maomé”, por acaso?
O problema é que todos os valores da tradição ocidental legados pela cultura judaico-cristã são sempre objetos de torções e distorções pelo barroquismo mental esquerdista que tomou conta da facciosa “inteligência” nacional. Sobretudo a extrema imprensa que se diz imparcial, mas nunca garante dar o mesmo espaço de opinião à direita conservadora brasileira que dá à esquerda progressista.
Assim como o valor da vida não existe sem o direito à defesa da vida e jamais pode ser metonímia de “condições de vida” como quer o esquerdismo barroquista. Como o valor da propriedade que é por definição privada e não pode se corromper em propriedade coletiva sem o direito de livre adesão ou da discricionária “função social” que a obrigue.
Como o valor da própria justiça que não pode se corromper em justiça “social”, o valor da liberdade não pode ser absoluto e às custas do constrangimento da liberdade do outro. A liberdade deve ser entendida como liberdade de alteridade e não de identidade, como já satirizou alguém: “a minha liberdade começa quando acabo com a liberdade alheia.”
Por outro lado, o episódio do ataque terrorista à produtora Porta dos Fundos teve o condão de suscitar o debate mesmo entre direita e esquerda no Brasil, ou dos distintos atributos de conservadores e progressistas. Sobretudo o debate sobre a condenação dos extremismos como forma de ação política.
Na sua falsa reivindicação de imparcialidade, por considerar a socialdemocracia como a terceira via entre os extremos, a grande mídia, enviesada de um esquerdismo vegano e socialdemocrata que muitas vezes sequer percebe, erra ao enquadrar o atual governo como de extrema direita, quando não fascista, o que é deletério para a qualificação do debate público.
Sobre o passado do já foragido terrorista do atentado à Porta dos Fundos, circula nas redes um confuso depoimento em que tenta justificar a sua tresloucada ação, ora se dizendo militante de um comando integralista, negado pela própria direção da AIB, Ação Integralista Brasileira, ora tentando se justificar por suas relações passadas com notórios esquerdistas, como o ideólogo russo Alexandre Dugin.
Aliás, vale a pena revisitar o oportuno filme sobre o integralismo no Brasil que circula das redes sociais e que tem como fio condutor um depoimento do poeta Gerardo Melo Mourão, que participou da fundação da AIB, como o primeiro grande partido de massas brasileiro, de 1932.
Entre as décadas de 20 e 30, aliás, é que temos o início do embate entre conservadores e progressistas através da Ação Integralista Nacional, bem como do PCB, Partido Comunista Brasileiro, fundado em 1922, além do movimento tenentista que teve a participação do que viria a ser o grande líder comunista brasileiro, Luiz Carlos Prestes. Mesmo ano da Semana de Arte Moderna, que, aliás, teve atuante presença do líder integralista Plínio Salgado.
Isto por que muitos pseudo-intelectuais, artistas, acadêmicos e jornalistas soi-disant social democratas estão sempre a pregar uma “terceira via” fraudadora do embate franco entre direita x esquerda, única forma de não repetir a história como farsa, superando o impasse entre falsos rótulos de conservadores x progressistas, e forçando uma falsa radicalização do debate público. A velha sina que nos persegue desde a Colônia de não ter experimentado o Iluminismo por nunca ter saído do barroquismo mental!
Mesmo no debate mundial, vemos a dificuldade de se enquadrar os movimentos nazista e fascista no espectro da direita ou da esquerda. Uma vez que todos são totalitários e revolucionários, sobretudo o movimento vencedor do comunismo internacional que derrotou os dois em 1945.
A vitória do movimento comunista internacional não foi apenas militar e política, mas sobretudo cultural e ideológica a partir da Segunda Grande Guerra até a queda do muro de Berlin, em 1989.
E a grande vítima do totalitarismo de direita, como o fascismo, contra o totalitarismo de esquerda, como o comunismo, Antonio Gramsci, foi o grande pensador da hegemonia cultural esquerdista. E a tal ponto que ficou célebre a negação dos crimes de genocídio de Lênin e Stalin por intelectuais do porte de um Jean-Paul Sartre, quando do disclosure dos arquivos secretos da Revolução Russa pelo próprio XXº Congresso do Partido Comunista em 1956.
Não seria por que a guerra dos rótulos já está por demais desgastada? Direita como, a priori, um rótulo do mal, como esquerda um rótulo do bem? A oposição do barroco com o clássico não seria muito mais fértil?
Esta é a proposta que tenho feito para o enriquecimento do debate público: colocar o debate político brasileiro em sua perspectiva histórica e cultural, para entender os compromissos fundamentais do classicismo e do barroquismo desde a Renascença e a Idade Moderna. Como manda a tradição cultural grega, via o embate da filosofia e da sofística. E também o legado judaico-cristão, via o embate da lei de Deus e das leis dos homens. No fundo o mesmo embate entre as atitudes da humildade de não saber e da arrogância de ditar.
*Jorge Maranhão, Mestre em filosofia pela UFRJ, dirige o Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão e autor de “Destorcer o Brasil. De sua cultura de torções, contorções e distorções barroquistas”
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