Esse contrato modernamente é estabelecido numa lei maior, a Cons-tituição, a qual, por meio de outras leis infraconstitucionais, traça normas que devem ser seguidas pelas pessoas e também pelos órgãos do Estado para que não se cometam injustiças contra aqueles que praticam crimes. Por isso lhes assegura ampla defesa e, só então depois, após condenação, têm de cumprir a pena determinada pela justiça, com o principal objetivo de poderem retornar ao convívio social.
No entanto nem sempre foi assim. Num passado distante, nem Estado havia, menos ainda um extenso rol de ações ou omissões consideradas crimes: era a antiga Lei de Talião, “olho por olho, dente por dente”. Mas ainda remanescem, hoje previstas em lei, algumas ações que as pessoas podem, embora limitadamente, agir sem se-rem consideradas crimes, como, principalmente, a legítima defesa.
A questão que se coloca — e que ainda é objeto de controvérsias pelos operadores do Direito — é saber se é considerada suficiente a tentativa de reinserção na sociedade, pelo cumprimento da pena, por quem cometeu um crime. Alguns dizem que não, porque entendem ser também uma das finalidades da pena prevenir que não se cometam mais crimes pelas pessoas (menos ainda pelo condenado), pelo exemplo dado por seu encarceramento (ou por algumas outras formas de cumprimento da pena). Por medo mesmo.
Outros, que a pena é um castigo pelo mal praticado, mas determinado pelo Estado; ou ainda que é uma forma de vingança, não pessoal, mas que serve de consolo à vítima, seus familiares ou à própria sociedade. Prevenção, recuperação, vingança ou castigo? Qual das teorias devem ser adotadas pelo Estado moderno?
Certamente deveria ser a recuperação, a ressocialização do apenado à vida em sociedade. Isso porque, pelo menos a nossa civilização ocidental, oriunda principalmente das ideias cristãs, há de existir uma segunda chance, o seu arrependimento. Além do que nem sempre o crime praticado foi fruto da vontade exclusiva do cri-minoso e sim devido ao ambiente em que ele foi criado o que, inevitavelmente o levou a praticar o ato antissocial.
No entanto, sabe-se que é pequena a tentativa de ressocialização do criminoso devido a uma série de circunstâncias, entre as quais, no caso do encarceramento, pois geralmente ele retorna à sociedade mais ainda revoltado do que quando entrou. Tudo pelo estado precário em que se encontram as cadeias e penitenciárias, consideradas como uma escola ou universidade de crimes. Pelo menos em nosso país e talvez no mundo todo, mesmo naqueles considerados de Primeiro Mundo.
Assim é que ele se considera um injustiçado, nem tanto pelo crime que praticou — pois dele muitas vezes tem consciência plena de que cometera um ato antissocial — mas, sobretudo, pelo próprio Estado que talvez não lhe tenha dado condições mínimas para ser recuperado. Apesar de tudo, a própria Lei de Execução Penal dá subsídios para que a pena seja mitigada, desde que estabelecidos alguns parâmetros que têm de ser cumpridos pelo apenado e até mesmo pelo próprio Estado como seu executor.
Tudo isso vem à tona ante a condenação do ex-presidente da República e pelo cumprimento de sua pena. Ela servirá de exemplo à sociedade para que não mais se cometam tais crimes por ele praticados? A sociedade (ou melhor, seus adversários) vingou-se dele? O ‘castigo’ foi suficiente?
Será que ele, que se considera um injustiçado, após o cumprimento da pena, estará subjetivamente arrependido e não cometerá mais os tipos de crime pelo quais foi condenado? E a pergunta final: será que ele voltará ao convívio social, depois de receber do Estado algum trabalho na prisão e toda assistência psicológica, completamente ‘reeducado’ ou ressocializado?
P.S.: Quando este artigo for publicado, pode ser que tudo o que se disse ao final de nada valerá e ele até mesmo poderá ser entendido como uma mera peça de ficção literária. Um ‘faz-de-conta’, tal como inventou o grande Monteiro Lobato. Porque impossível ter-se alguma previsão razoável, em curto prazo, sobre o entendimento dos ínclitos ministros do Supremo Tribunal Federal sobre tantos recursos legais, tamanha a divergência entre eles na interpretação da Constituição e das leis infraconstitucionais.
**Luís Carlos Bedran, é sociólogo e cronista da Revista Comércio, Indústria e Agronegócio de Araraquara
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