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Marketplace sem qualidade de dados é dor de cabeça certa

Por André França Cardoso

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Quase toda empresa que tenha certo porte e marca reconhecida foi seduzida a expandir a operação na forma de um marketplace, o que fez com que muitas crescessem rapidamente em faturamento, número de parceiros e quantidade de produtos à disposição dos consumidores. Contudo, nem sempre as empresas se preparam para ganhar escala e sofrem por deixar de lado o coração de todo empreendimento na era da Revolução 4.0: a gestão de qualidade dos dados.

As cabeças pensantes por trás desse tipo de negócio, é óbvio, mostram a competência que têm em diversas áreas. Vamos imaginar o seguinte cenário: uma empresa usa a força da marca, o conhecimento sobre o público-alvo e a curadoria de sortimento, que é saber o que o cliente quer para oferecer a melhor solução de compra, para abrir um marketplace e reforçar a presença em quase todos os momentos de consumo.

Para concretizar os planos, a empresa incorpora algumas startups, absorve conceitos como Jornada do Cliente, Experiência do Cliente, Mínimo Produto Viável (MVP, na sigla em inglês) e metodologia Ágil. São boas estratégias para romper com os paradigmas culturais que a mantinha presa ao passado. Em pouco tempo, a empresa tem um belíssimo protótipo, com interfaces visualmente atrativas e intuitivas, capaz de se adaptar facilmente à toda gama de dispositivos usados pelos clientes para interagir com o marketplace e uma infinidade de recursos de análise de dados para apoiar as decisões de compra.

A infraestrutura é dimensionada para responder à demanda em alto nível e fundos de investimento que tiveram acesso ao protótipo e ao plano de negócios da empresa começam a fazer ofertas de participação e de financiamento para o novo negócio. O valor de mercado do marketplace passa a ser considerado várias vezes maior do que o da empresa-mãe.

A área comercial também é reformulada para o desenvolvimento de parceiros e vendedores, que passam a acessar clientes muito além do que pensavam e a expandir os negócios também, mesmo que às custas de comissões originadas nessa nova arena. É então que aparecem os problemas operacionais.

Quando o marketplace já se firmava como um dos maiores em operação no país, os clientes começaram a perceber que diversos parceiros vendiam produtos similares e até iguais, mas cada um com uma descrição diferente. Os códigos criados nos sistemas de vendas de origem eram distintos e a classificação dos produtos em hierarquia de categoria, subcategoria, linha, família, entre outras, eram também diferentes.

A equipe de programadores começa a criar filtros e mecanismos para resolver o problema, mas a capacidade do marketplace de apresentar aos clientes todas as alternativas de compra de determinado produto com uma descrição relativamente homogênea se mostra quase inviável. A gestão do sortimento, para avaliar o equilíbrio da linha de produtos e a necessidade de incorporar novos ou eliminar alguns, ficou impraticável porque não há como classificar produtos como semelhantes baseado nas descrições heterogêneas.

Chovem reclamações sobre envios para endereços antigos ou errados, porque muitos consumidores estavam presentes simultaneamente nos cadastros de vários dos parceiros e, em uma nova venda, era difícil determinar o correto endereço de entrega. Os problemas são reverberados nas redes sociais e o marketplace entra na lista dos dez com mais reclamações do portal “Reclame Aqui”. A busca por culpados gera uma atmosfera tóxica e muitos funcionários-chave pulam fora do barco.

Finalmente, uma consultoria internacional de renome é chamada e, após a descrição cuidadosa dos problemas que o marketplace enfrentava, faz uma pergunta, aparentemente simples. Ele queria saber a solução de qualidade de dados usada e de que forma os cadastros dos diversos parceiros eram integrados, padronizados e saneados.

Não havia resposta. Esse é um processo de aprendizagem pelo qual passaram muitos marketplaces nos últimos anos, seja porque cresceram rápido demais, seja por desprezarem a importância da gestão de qualidade de dados na era digital. Basta fazer pesquisa em alguns marketplaces por aí para ver o quanto esse problema é comum.

* André França Cardoso é CEO da Assesso, provedora de software e consultoria para Gestão da Informação e Qualidade de Dados, que atende empresas como Natura, Gol, Santander e Honda.

**As opiniões expressas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores e não coincidem, necessariamente, com as do RCIARARAQUARA.COM.BR