Um araraquarense criado no São Geraldo e no Jardim Universal conquistou espaço profissional no cinema francês, um dos mais tradicionais do mundo. Aluno das Oficinas Culturais no primeiro mandato do prefeito Edinho, entre 2001 e 2004, Tiago Andrade, de 39 anos, seguiu sua paixão pelo cinema e chegou até a Europa.
Mas essa história começa em 1980, quando Tiago nasceu. Filho de Mauro (vindo da região do Sul do Brasil) e de Heloísa (do Norte), o araraquarense teve desde cedo, dentro de casa, a “possibilidade de olhar para as diferentes identidades culturais que se desenham em um mesmo país de maneiras tão diferentes”, como explicou por e-mail à Secretaria de Comunicação da Prefeitura.
A paixão pelas câmeras veio desde a infância. Enquanto cursava o ensino fundamental e o ensino médio (entre outras escolas, foi aluno do EEBA, a tradicional Escola Estadual Bento de Abreu), Tiago começou a trabalhar na empresa do pai com fotografias e filmagens de formaturas, casamentos e eventos.
“Eu trabalhava como cameraman [operador de câmera] e no laboratório. Na escola, não fui um gênio, mas gostava de literatura, filosofia, música, artes plásticas. No trabalho, eu me dava bem com a câmera, mesmo se minha mãe pensasse outra coisa. Ela vivia dizendo que eu deveria olhar minhas imagens para fazer melhor da próxima vez”, revela.
E foi por meio dos pais que as Oficinas Culturais chegaram até aquele menino. “Meus pais me falaram da Casa da Cultura, da Biblioteca Municipal. Para meus pais, a educação era muito importante. Comecei, pouco a pouco, a me interessar pelos eventos da Casa da Cultura. E um dia eles me falaram das Oficinas de Teatro Lélia Abramo. Sempre me apoiando, nós fomos ver como eu poderia participar.”
Tiago frequentou a primeira Oficina de Teatro Lélia Abramo. “Lembro-me de cada criação teatral, cada bairro que visitamos, pois o objetivo final era levar a cultura para todos. A ideia das oficinas Lélia Abramo, para mim, foi gigantesca”, afirma.
“Para mim, a Casa da Cultura foi o coração cultural de Araraquara. Graças às oficinas Lélia Abramo, conheci outras maneiras de pensar e viver. Passávamos a maior parte do tempo estudando e produzindo peças teatrais. Quando estávamos prontos, saíamos para todo canto da cidade. Araraquara respirava cultura”, lembra.
Destino: França
Depois de concluir as Oficinas e obter o DRT (registro para trabalhar na área), Tiago participou de um grupo teatral que levou um projeto para Paraty/RJ, sob acompanhamento de Lauro Monteiro (artista plástico, produtor cultural e secretário municipal de Cultura naquela época). Foi ali que a França cruzou seu caminho.
“Conheci muitas pessoas de horizontes diferentes, mas com as mesmas práticas, seja de teatro, seja de cinema. Guardei contatos com pessoas do Nordeste do Brasil, São Paulo, Minas Gerais. Conheci uma francesa que trabalhava para um canal de televisão na França. Um novo mundo que começava”, conta.
Depois de mais um período de estudos, incluindo a língua francesa, Tiago embarcou para a França. “O cinema começou a tomar o lugar do teatro, e a França, o do Brasil. Pouco a pouco, eu me encorajava a aprender o francês e um dia trabalhar com esses homens que ‘inventaram o cinema’”, revela. Tiago superou dificuldades de adaptação e já está em território francês há 15 anos (mora em Nice).
“No cinema, encontrei facilidade de trabalhar. Juntei um pouco de dinheiro para entrar numa escola de cinema e comprar meu próprio material de edição de filmes. Eu me especializei na parte da edição de filmes e filmagens. Trabalhei em alguns festivais de curtas metragens aqui na região do sul da França”, afirma.
Entre os trabalhos realizados estão um documentário sobre a Pré-História, filmado na Tanzânia (África), além de projetos em escolas, colégios e universidades. Na televisão, Tiago já fez filmagens de corridas de carros e outros eventos.
No momento, ele trabalha na associação Casa Doc, um local que tem como objetivo mostrar a produção de documentários brasileiros na França. “O olhar francês sobre a produção audiovisual brasileira mudou muito por aqui. Depois de muitos anos de pesquisa, constatei que são poucos os projetos voltados para essa cultura cinematográfica maravilhosa que é a brasileira”, explicou.
Tiago trabalha nesse projeto associativo desde 2016, junto com quatro colaboradores. Eles têm parceria com o festival Curta Brasília e, uma vez por ano, organizam uma mostra de filmes brasileiros. “Nosso próximo projeto vai trazer o cinema paraibano para a França no mês de maio”, afirma.
Inclusão pela arte
Para Lauro Monteiro, que participou de forma decisiva na formação cultural de Tiago Andrade, a arte é fundamental na construção da sociedade. “Eu desenho desde criança e fiz vários cursos particulares de desenho e pintura. Na minha época, não havia cursos e programas de formação gratuita em artes e nem oficinas para que pudesse concorrer a uma vaga. Então, essa bandeira de democratização e acesso às linguagens artísticas eu sempre carreguei. Quando, em 2001, fui convidado pelo prefeito Edinho para dirigir a pasta da Cultura, acreditei que poderia colaborar no que eu chamo de cidadania cultural”, afirma Lauro, que atualmente desenvolve projetos de inclusão pela arte em Torres Vedras, cidade portuguesa que mantém parcerias e acordo de cooperação com Araraquara.
A história de Tiago mostra que esse trabalho se transforma em resultados concretos, segundo o produtor cultural. “O relato do Tiago — e certamente há tantos outros jovens talentosos Tiagos — emociona e dá a certeza de que o caminho sonhado está sendo realidade”, conclui Lauro Monteiro.