A escola pública no Brasil desempenha um papel central na formação de milhões de estudantes, mas a qualificação de profissionais para essa rede ainda é um dos grandes desafios do país. Nesse contexto, o Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da Faculdade de Ciências e Letras (FCL) da Unesp, em Araraquara, se destaca por sua forte integração com a rede pública de ensino, consolidando-se como um polo de pesquisa e formação continuada de professores. “Nosso Programa tem buscado, desde o início, desenvolver ações com, para e sobre a escola pública”, explica a coordenadora do Programa, professora Maria José Fernandes.
O Programa, que foi desenvolvido a partir de um projeto vinculado aos Núcleos de Ensino da Unesp, é único no Brasil com esse foco específico, sendo um diferencial entre os mais de 200 programas de pós-graduação em Educação no país. “Nosso Programa surgiu de uma demanda real das escolas públicas da região, onde professores universitários e da educação básica trabalhavam para melhorar o ensino. Esse histórico de colaboração foi a base para o desenvolvimento do que é hoje o nosso Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar”, destaca a professora.
Desde o início, o Programa ofereceu tanto mestrado quanto doutorado, um diferencial significativo. “Ambos os cursos foram aprovados simultaneamente, o que é incomum, mas foi viabilizado pela Capes, que reconheceu o projeto como sendo de altíssima qualidade, contando com professores de vasta experiência em pesquisa”, explica a coordenadora.
Integração – A integração com a rede pública não é apenas uma característica, mas o alicerce do Programa. Desde sua criação, em 1997, a maior parte dos alunos está vinculada às redes públicas de ensino, e as pesquisas e projetos de extensão buscam transformar a realidade educacional.
Esse compromisso com a rede pública pode ser visto em projetos como o “Reforço e Recuperação da Aprendizagem”, coordenado pelo professor Francisco Mazzeu, que tem como objetivo melhorar a alfabetização em escolas públicas de Araraquara e que conta com pós-graduandas do Programa. Outro exemplo é o “Cresça e Apareça,” da professora Eliza Maria Barbosa, voltado para a formação de professores da educação infantil.
A professora Luciene Regina Tognetta conduz projetos que abordam questões urgentes nas escolas, como bullying e o acolhimento de crianças e adolescentes. Entre eles, destacam-se o “Acolhida e Cuidado com Crianças e Adolescentes em Tempos de Escola”, “A Convivência como Valor”, e o “Projeto Anti-Bullying”. “Esses temas se tornaram ainda mais relevantes após a pandemia, quando os problemas de convivência escolar e a necessidade de acolhimento aumentaram significativamente”, explica Maria José.
Segundo a coordenadora, os projetos desenvolvidos nas escolas estabelecem uma relação dialética, na qual os docentes, além de atuarem diretamente nas escolas, participam de grupos de estudo na universidade. “Essa dinâmica cria uma ponte sólida entre a prática escolar e o ambiente acadêmico, promovendo uma troca contínua e enriquecedora de experiências”, afirma.
Outro projeto relevante no âmbito da Pós Graduação foi o desenvolvimento da Proposta, coordenado pela professora Juliana Pasqualini. “Essa iniciativa resultou em uma proposta curricular num município de significativo porte e com professoras da rede de Bauru ingressando no mestrado e doutorado”, comenta Maria José, que afirma que este foi um “um ótimo exemplo de como é possível realizar pesquisa em educação enquanto também formamos professores e desenvolvemos novas metodologias”.
Esse diálogo constante entre a academia e as escolas é vivenciado por alunos como Cristiane Moraes Escudeiro, doutoranda e professora da rede pública de Araraquara. “O Programa me deu as ferramentas para articular minha prática em sala de aula com a pesquisa acadêmica. Essa conexão fortalece minha atuação e me permite ter um impacto real na educação infantil”, conta Cristiane, que está realizando um estágio de doutorado sanduíche no Programa Intercalar de Doutoramento da Universidade de Lisboa, onde investiga novas metodologias para a alfabetização infantil.
LINHAS DE PESQUISA
As linhas de pesquisa do Programa são desenhadas para dialogar diretamente com os desafios práticos e teóricos enfrentados nas escolas. A Linha 1, voltada para educação sexual, e a Linha 5, que foca em Políticas e Gestão Educacional, possuem um recorte mais específico. Embora tenham uma demanda menor, essas linhas abordam temas essenciais e continuam sendo altamente relevantes.
Por outro lado, as Linhas 2 e 3 têm sido as mais procuradas nos últimos anos. A Linha 2 aborda a formação docente e as práticas de ensino, enquanto a Linha 3 explora teorias pedagógicas, trabalho educativo e sociedade. “A Linha 3 é especialmente procurada porque conta com professores amplamente reconhecidos, como Newton Duarte, uma referência nacional na Pedagogia Histórico-crítica”, ressalta a professora.
A Linha 4, que examina estudos históricos, filosóficos e antropológicos sobre a escola, tem atraído crescente interesse, particularmente por seu enfoque em diversidade étnico-racial. “O aumento da procura reflete a urgência em abordar questões de diversidade, que são amplamente discutidas nas escolas e na sociedade atual”, afirma a coordenadora.
Internacionalização e perspectivas futuras – Embora o Programa tenha um foco regional, ele também promove a internacionalização, oferecendo oportunidades de intercâmbio para seus alunos e professores. “A experiência internacional expande nossos horizontes e traz novas perspectivas para a educação no Brasil”, diz a coordenadora. Cristiane Moraes Escudeiro, em estágio na Universidade de Lisboa, exemplifica essa troca de saberes. “Estou conhecendo novas metodologias que espero poder incorporar às práticas pedagógicas já existentes no Brasil, e o apoio do Programa tem sido fundamental para isso”, comenta.
Com quase três décadas de existência, o Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da FCL já formou 576 mestres e 451 doutores até 2023. Muitos desses profissionais retornaram à rede pública ou assumiram posições em instituições de ensino superior e pesquisa. “Nosso objetivo é intensificar essa colaboração com a rede pública, desenvolvendo ações que transformem a realidade educacional, impactando diretamente a formação de professores e a qualidade do ensino oferecido aos alunos”, conclui Maria José. ( Gabriele Maciel, da FCLAr/Unesp)