ARTIGO: BENEDITO SALVADOR CARLOS (BENÊ)
em que se praticavam esta modalidade esportiva. Araraquara chamava a atenção pela ousadia dos seus pilotos
Imagino ter nascido sonhando ser piloto de competição de motocicleta de velocidade, desde menino. Este era meu sonho. Lembro-me de um caixote de madeira surrado que existia na área da casa de meus pais, na rua 10, e que eu me debruçava, deitava em cima, tombava, remexia, simulava chacoalhões, e na sua companhia rugiam sons que saíam da alma e acelerava, no guidão improvisado de cabo de vassoura. Corria, corria, mas corria tanto, que imaginariamente, vivia momentos de transe, puro êxtase! Não sei de onde vinha essa áurea, esse Nirvana; mas sei que esses momentos vinham e me tomavam por inteiro. Imagino ter nascido sonhando ser piloto de competição de motocicleta de velocidade, desde menino.
Este era meu sonho. Lembro-me de um caixote de madeira surrado que existia na área da casa de meus pais, na rua 10, e que eu me debruçava, deitava em cima, tombava, remexia, simulava chacoalhões, e na sua companhia rugiam sons que saíam da alma e acelerava, no guidão improvisado de cabo de vassoura. Corria, corria, mas corria tanto, que imaginariamente, vivia momentos de transe, puro êxtase! Não sei de onde vinha essa áurea, esse Nirvana; mas sei que esses momentos vinham e me tomavam por inteiro.
Quando cresci um pouco, aos 11 anos aproximadamente, foi minha bicicleta Caloi, uma “Fiorentina modelo 64”, vermelha, aro 26; que servia de plataforma para os meus devaneios de piloto. Nela pedalava incansavelmente para ganhar velocidade e levar sobre o peito o doce aroma do vento. Nunca perdia uma oportunidade de fazer uma curva e enfrentar a emoção do desafio de ser cada vez mais rápido, mais veloz. Alguns lugares me eram especiais, e bem propícios para esses feitos. Um deles era a avenida Dr. Leite de Moraes rumando em direção ao pontilhão da estrada de ferro na Av. São Paulo, não tinha preço. Já vinha com muita velocidade desde a Igreja de Sto. Antonio, virava a Pe. Luciano e logo à frente o grande desafio da curva perigosíssima, muito fechada, de alta, e o frio na espinha por passar tão rente defronte ao muro da Escola Profissional mantida pela EFA (Estrada de Ferro Araraquarense), fazendo primeiro o pêndulo para a esquerda e logo na sequência, outro pêndulo à direita para passar como um cometa sob o pontilhão. São e salvo, mais salvo do que são.
Outro lugar era impagável: iniciava-se na Avenida Presidente Vargas, em direção ao bairro do “Quitandinha”, uma descida em linha reta, que minha bicicleta só se acalmava quando passava em frente ao prédio da indústria do “seo” Totó (Antonio Maria Brandão), pai do nosso escritor maior, o Ignácio de Loyola.Começava ali, na esquina com a Rua Tenente Joaquim Nunes Cabral, no prédio do ferro velho da família de Francisco Merlos, anexo à sorveteria Spumell, o local onde conheci o deslumbramento de um motor de corrida, o som, o cheiro, a plástica e as formas e cores das carenagens, todo aquele conjunto harmonioso de coisas relacionadas à motovelocidade que, agora então, começava a desabrochar e tomar conta do meu mundinho.Naquele lugar, ninguém me conhecia, era quase invisível, ninguém sabia da minha existência, da minha vida e dos meus sonhos, mas eu sim conhecia muito bem a todos. Conhecia o talentosíssimo Bianchini da Zundapp vermelha, o Luzia da Ducati, já um astro, o Eduardo Silva da AERMACCHI Ala Verde 250cc , o “Peninha”, (Fiscarelli) adolescente aprendiz de mecânico, mas que tinha o poder de tocar, funcionar e montar em todas as motocicletas, o que me dava um doce ciúme. Tinha também o Julião da sorveteria, que gostava do cheiro da graxa, mais do que dos sorvetes que seu pai fabricava. O Zé Duvilio (José Roberto Tedeschi) jovem piloto que já reluzia, de quem eu ficava maravilhado quando o via experimentar a AERMACCHI – Alla d’oro 250cc, com escapamento super dimensionado em forma de funil, trajeto este que eu acompanhava mentalmente, só ouvindo e sentindo na alma cada marcha que precisamente ele engatava, fazendo lá embaixo, na entrada do posto Quitandinha a curva que me era distante, para depois retornar asfalto acima, altaneiro, motor cheio, até estacionar, sem desligar o motor e iniciar uma conversa técnica com seu irmão, Adolpho Tedeschi Neto, “O CARA”.
Inauguração do Circuito de Motocross na Cachangal aparecendo Paulé, Nivanor e Denisio
Nego, como carinhosamente o chamamos até hoje, falando impressões, carburando, enfim; respirando corridas.Adolpho ou “Nego”, como queiram, apesar de loiro e olhos claros, foi muito mais que um dono de oficina, foi, na verdade, o grande propulsor do movimento que exaltou e abrilhantou, dos anos dourados até os anos 80, Araraquara como uma das equipes mais respeitadas no motociclismo nacional, tornando nossa cidade reconhecidamente um polo de velocidade.Adolpho (Nego) somava e soma até hoje qualidades únicas de um empreendedor. Mecânico histórico de motocicletas, caprichoso ao extremo e ainda incansável na arte de promover os eventos da velocidade, trabalhando somente nos bastidores, em silêncio e por amor ao esporte. Isso me veio à cabeça por mera observação, convidado que fui outro dia pelo Nilton “Boca” Gonçalves (super campeão de kart, que muito nos enobrece) e Zé Faito para assistir no kartódromo Adalberto Cattani, circuito de rodas denominado José da Penha Moreira.
Na oportunidade, comentei que aquele espetáculo, pela beleza de suas disputas, mereceria muito mais público e jogando conversa fora, sugeri que nós (ex-pilotos) poderíamos promover como incentivo e na preliminar, uma prova de motocicletas amadoras. As ideias foram aflorando. Eduardo Luzia, de tantas vitórias e títulos, comentou que haveria de ser uma competição de 125cc, denominada como fórmula Honda CG, devido ao baixo custo e que, com um bom regulamento, proporcionaria grandes duelos e o surgimento de uma nova geração de “cobras” em Araraquara. Assunto emendado pelo piloto extraordinário Evaldo (Nezinho) Salerno, em relação à necessidade de ser uma competição de baixo custo e mesma competitividade. Assim a conversa foi aumentando, que até o nosso campeoníssimo Olympio Bernardes Ferreira (Neto Dob), de tantas glórias no motociclismo e atual tetra-campeão Brasileiro de Bicicross, com brilho nos olhos, lábios marotamente torcidos e as mãos se esfregando, deixou-se confessar: “Dá até pra gente voltar”.
Foi o suficiente para que o Baiano Faito recomendasse: “o campeonato ideal seria o que o “Nego” sempre propôs: motor e carburação original, tudo muito simples, baixo custo, pneu original, gasolina comum”, ou seja, um campeonato com o objetivo de revelar novos campeões.Foi o suficiente para que o Baiano Faito recomendasse: “o campeonato ideal seria o que o “Nego” sempre propôs: motor e carburação original, tudo muito simples, baixo custo, pneu original, gasolina comum”, ou seja, um campeonato com o objetivo de revelar novos campeões.
Pensei comigo, a primeira vez que vi e ouvi uma motocicleta de corrida foi na oficina do cara (Moto Dumbo). Foi também meu primeiro mecânico na ITALJET (cinquentinha italiana 2 tempos e 1 cilindro). Era também do Moto Clube; na motovelocidade promoveu ou fez parte da organização de todas as corridas na Bento de Abreu, na Alameda Paulista, acompanhou e cuidou da equipe do Moto Clube Araraquara em Interlagos, no Rio de Janeiro, em Curitiba, Goiânia, Santos, palco de apresentação dos melhores pilotos deste País, como Adu Celso, Edmar Ferreira, Walter “Tucano” Barchi, Denisio Casarini, Carlos Alberto “Jacaré” Pavan, Ramón Macaya, Denilson Peres, Paulo Sérgio Castroviejo, os internacionais Jhonny Ceccoto, Carlos Alberto Lavado, Kent Andersson e ainda, pioneiro no off- road, construiu na Fazenda Cachangal, aqui em Araraquara, localizada nas proximidades da Estação de trem do Ouro, a primeira pista de corridas de MotoCross do interior do Brasil, recebendo como convidado para inauguração, pilotos do porte de Nivanor Bernardes, campeão paranaense, paulista, brasileiro e sul-americano de MotoCross, devidamente acompanhado de outras feras como Paulé Salvalagio e também na oportunidade, do jovem promissor Roberto Boetcher, que o tempo transformou no mais extraordinário piloto brasileiro de MotoCross, e ainda, passados tantos anos, está construindo gaiolinhas (chassi tubular impulsionado por motor de motocicleta) Pra que!? Pra quem??
Ah… meu Deus do céu, tá dentro do cara, tá na alma dele e o que é mais importante, ele só fez e faz para os outros. Curioso, fui procurá-lo e saber desta novidade.“Fiz pra molecada e tem mais, a gente poderia construir ainda outras coisas: pista de competição mista, um centro de lazer, um lugar onde as famílias pudessem passar fins de semana juntas. Estou aqui com meu moleque, meu irmão… simples pô”.Simples pra ele, mas, não é nada simples. Nesta visita, pedi para ver algumas de suas fotos e levei um susto. O cara é um arquivo do esporte a motor de Araraquara e deste País. Começamos a olhar. Uma, duas,… cento e cinquenta, duzentas e por aí afora. No seu arquivo em competições, de épocas diferentes, posam no exercício de seus mandatos os ex-prefeitos Rômulo Lupo, Benedito de Oliveira, Rubens Cruz, Clodoaldo Medina, Waldemar De Santi, o iniciante jornalista Geraldo Polezze acompanhado de Cármine Antonio Tucci e Nildson Leite Amaral, além de tantas outras pessoas que também ajudaram a escrever a história do esporte de Araraquara. Como o saudoso vereador Mazinho, Neil dos Passos e o brilhante Dr. José Wellington Pinto. Assim ele continua construindo pela vida, pistas de verdade, história e momentos de sonho. Vai com seu carinho escrevendo cada vez mais páginas de dedicação a uma modalidade esportiva que tanto ama. Vai aumentando seu círculo de admiradores e, sem qualquer alarde, vaidade pessoal ou interesse próprio, vai criando possibilidades para o surgimento de outros Zé Duvilio’s, Victorinhos, Nezinhos, Baianinhos, Netinhos, Luzia’s e Penhas do futuro. Com certeza também é um grande campeão do motociclismo araraquarense.