O Brasil é o 3º país com mais pets no mundo e 72% dos lares têm animais de estimação, de acordo com o Censo Pet do IPB (Instituto Pet Brasil). Com o avanço das chamadas famílias multiespécies, cresce o número de ações judiciais envolvendo guarda, pensão, direito de visitas e até erro médico veterinário. Também são comuns disputas com pet shops, hotéis e companhias aéreas.
“O avanço na judicialização e no reconhecimento dos animais como sujeitos de direitos é um fenômeno que se intensificou nos últimos anos, em parte pelo crescimento do número de pets nos lares brasileiros. Isso fez surgir o conceito de família multiespécie, dando mais força ao reconhecimento de direitos na esfera cível”, informa o advogado Stefano Ribeiro Ferri, especialista em Direito do Consumidor.
Ele explica ainda quando e em que situações cabe recorrer ao Judiciário. “É possível acionar a Justiça sempre que houver uma violação de direitos relacionados à posse, guarda, saúde, bem-estar ou relação contratual envolvendo animais de estimação”, afirma Ferri.
Mas qualquer pessoa pode ingressar com um processo judicial? Ferri esclarece a questão: “Normalmente, quem ingressa com ações judiciais são os tutores dos animais, com base nos danos sofridos por eles próprios (materiais ou morais) em razão de fatos que atingiram seus pets. Em casos excepcionais, associações de proteção animal, ONGs e até o Ministério Público podem ingressar com ações civis públicas em defesa de animais, especialmente em casos de maus-tratos ou interesses coletivos”, diz o especialista.
Vale ressaltar que o reconhecimento jurídico dos pets como parte das famílias tem impulsionado o conceito de família multiespécie e levado o Judiciário a decisões mais sensíveis. “A Justiça brasileira tem reconhecido cada vez mais a ideia de família multiespécie, em que os animais de estimação são considerados parte da entidade familiar. Exemplo disso são decisões que permitem guarda compartilhada, direito de visitas ou indenizações por danos morais pela perda do pet”, explica o advogado.
As ações judiciais mais frequentes, segundo Ferri, envolvem não só erro médico, mas também disputas por guarda e visitas em separações, conflitos com condomínios, abandono em hotéis para pets, mordidas, e até problemas com adestradores, pet sitters e creches.
“O tutor tem legitimidade plena, pois as ações costumam ser fundamentadas nos direitos do tutor, como a dor emocional pela perda ou maus-tratos ao animal, ou ainda pela disputa de posse (guarda) do pet após uma separação conjugal. A legitimidade decorre da posse ou propriedade do animal, ainda que este seja considerado “bem semovente” pelo Código Civil. Contudo, a jurisprudência tem flexibilizado essa classificação diante da afetividade envolvida”, analisa o especialista.
Os principais fundamentos legais que amparam esse tipo de ação incluem a Constituição Federal, que veda práticas cruéis contra animais; a Lei de Crimes Ambientais (9.605/98), que tipifica maus-tratos; além de dispositivos do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor, usados para responsabilizar prestadores de serviço por falhas, omissões ou negligência.
Diante desse cenário, tutores e prestadores de serviço também precisam se resguardar. “É fundamental formalizar contratos com cláusulas claras, exigir orçamentos por escrito e usar termos de consentimento para procedimentos. Ter tudo documentado pode ser decisivo em caso de disputa judicial”, alerta Ferri. Já clínicas e pet shops devem investir em treinamento, registro de atendimentos, e até seguro de responsabilidade civil.
AUMENTO
A tendência é de crescimento desse tipo de judicialização, mas também de evolução na legislação, avalia Ferri. “Há projetos no Congresso para reconhecer os animais como seres sencientes e regulamentar, por exemplo, o direito de visitas em separações. Além disso, o STF já sinalizou que os animais não podem ser tratados como meros objetos, como ocorreu no julgamento da vaquejada”.
Saiba quais são os direitos já reconhecidos aos animais
>Direito à vida e integridade física (proibição de maus-tratos);
>Direito ao bem-estar, conforme normas sanitárias e ambientais;
>Possibilidade de indenização ao tutor por morte ou lesão do pet;
>Guarda compartilhada ou direito de visitas após divórcio dos tutores.