Considerada uma referência na luta pelos direitos das pessoas com HIV/Aids, Brenda Lee foi pioneira em sua comunidade. Na década de 1980, no auge da epidemia da Aids, a travesti abriu as portas de sua pensão, dando origem ao primeiro centro de acolhimento para travestis com HIV na América Latina. A história da vida de Brenda Lee, sua solidariedade às travestis e os frutos que deixou até hoje, 28 anos depois de sua morte, são o tema do Caminhos da Reportagem.
Tornar-se travesti foi um longo processo para Brenda. Ela nasceu como Cícero Caetano Leonardo, em 10 de janeiro de 1948, na pequena cidade de Bodocó, no sertão pernambucano. Aos 13 anos, mudou-se com a mãe e irmãos para o Rio de Janeiro. Com vergonha do comportamento afeminado, fugiu da família e rumou para São Paulo, onde adotou o nome de Caetana, como ficou conhecida entre as pessoas mais próximas. Mais tarde, Caetana começa a usar Brenda Lee como nome artístico, inspirado na cantora dos Estados Unidos, que ficou famosa pelo hit “Jambalaya”.
Contudo, a São Paulo dos anos 1970 era hostil à diversidade sexual. “As polícias tinham um direito tácito, não oficial, de fazer o que elas quisessem, com quem elas quisessem, a hora que elas quisessem”, diz o pesquisador Ubirajara Caputo, que estuda a vida de Brenda Lee. Além do abandono da família, as travestis enfrentavam a violência de grupos de ódio e do aparato da repressão da Ditadura Militar. Para sobreviver, muitas recorreram à prostituição, como a própria Brenda Lee: “Vida de travesti de rua foi um pouco difícil no início, né? O que me deu coragem e eu me senti obrigada foi quando a polícia começou a perseguir a gente, prender, pôr em cana, torturar”, disse ela, em uma entrevista nos anos 1990.
Brenda Lee começou a prosperar e comprou alguns imóveis. Em um deles, na rua Major Diogo, na região central de São Paulo, abriu um pensionato que abrigava travestis que eram abandonadas pela família ou que chegavam à capital paulista para ganhar a vida. Logo Brenda ficou conhecida na imprensa, e o local foi chamado de “Palácio das Bruxas”. A partir dessa ofensa, Brenda Lee batizou a casa de “Palácio das Princesas”.