Escritor paulista ocupará a cadeira 11, vaga após a morte do jurista Hélio Jaguaribe
Ignácio de Loyola Brandão em discurso na ABL, quando ganhou o Prêmio Machado de Assis, em 2016- Foto: Guilherme Gonçalves
O escritor Ignácio de Loyola Brandão foi eleito nesta quinta-feira, por unanimidade, para a cadeira 11 da Academia Brasileira de Letras, vaga após a morte do jurista e sociólogo Hélio Jaguaribe, em setembro do ano passado. O contista, romancista e jornalista paulista recebeu todos os 31 votos. Os demais concorrentes foram Eloi Angelos Ghio D’Aracosia, Placidino Guerrieri Brigagão, José Roberto Guedes de Oliveira, Remilson Soares Candeia, José Itamar Abreu Costa, Marilena Barreiros Salazar, Raquel Naveira, Felisbelo da Silva, Sérgio Caldeira de Araújo, Rodrigo Cabrera Gonzales e Lucas Menezes.
— Por mais que o resultado fosse esperado, aguardei até o último minuto, porque sou jornalista e sei o que é uma eleição — disse o novo imortal, de 82 anos. — É um momento curioso, para mim é o reconhecimento a alguém que passou a vida inteira tentando mostrar o Brasil, o homem brasileiro e a situação do brasileiro.
Descrito por Antonio Candido como um escritor de “realismo feroz”, Brandão tem uma vasta contribuição na área da ficção, mas também incursões na biografia, na crônica, no memorialismo e na literatura infantojuvenil. Nesta última, venceu o Prêmio Jabuti em 2008 pelo livro “O menino que vendia palavras”. Mas foi nos contos que o escritor natural de Araraquara começou sua carreira. Lançado em 1965, “Depois do sol” fazia o registro da noite paulistana ao acompanhar a história de cafetões, prostitutas e esportistas, mostrando o realismo observado por Candido.
‘Zero’, um marco
Três anos depois, destacou-se com o romance “Bebel que a cidade comeu” (1968), um retrato desiludido da cidade grande. Publicado em 1974 na Itália após ser recusado por diversas editoras, o polêmico “Zero” se tornou um marco da literatura brasileira. Quando finalmente chegou ao Brasil, um ano depois, provocou reações vívidas por seu tom agressivo e as situações libidinosas. O romance mostrava um país despedaçado e acabou sendo proibido de circular pela ditadura militar. Só voltou às livrarias em 1979.
Brandão ingressou na narrativa distópica em “Não verás país nenhum”, de 1981, no qual retrata uma São Paulo caótica e tentacular. Ele voltaria a esse registro em 2018 com “Desta terra nada vai sobrar, a não ser o vento que sopra sobre ela”, seu romance mais recente.
Entre 2002 e 2018, Brandão se manteve afastado do romance. Nesse período, escreveu livros infantojuvenis, além de uma biografia da ex-primeira-dama Ruth Cardoso e um relato autobiográfico. Também mantém uma coluna no “Estado de S. Paulo”.
Antes de ser eleito, Brandão já havia vencido o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto da sua obra, em 2016. Trata-se do principal prêmio atribuído pela academia. O seu ingresso representa a presença de mais um escritor de ficção na casa, após os ingressos recentes de um cineasta (Carlos Diegues) e de um jurista (Joaquim Falcão).
Na ABL, encontrará diversos amigos. Nascido em 1936, ele é da mesma geração de imortais como Nélida Piñon, Rosiska Darcy e Antonio Torres. Este último foi seu colega na redação da “Última Hora” em São Paulo, no início dos anos 1960, onde ambos foram repórteres.
— Fico emocionado com esse reencontro — diz Torres. — Somos parte de uma geração que se projetou nos anos 1970, na contramão da ditadura militar, que foi muito lida e ainda é lida. E ele é um dos grandes expoentes dessa geração. A Academia vai ter um se humano de peso neste ano de 2019.
— Temos uma história em comum e respondemos por ela, porque somos criadores responsáveis — diz Nélida Piñon. — O Ignácio é devotado à ficção, é um homem voltado para o mundo da ilusão, e que lutou pelo Brasil em um momento difícil ( a ditadura militar ).
A cadeira ocupada a partir de agora por Brandão foi fundada por Lúcio de Mendonça e tem como patrono Fagundes Varela. Já teve entre seus imortais Eduardo Ramos, João Luís Alves, Adelmar Tavares, Deolindo Couto, Darcy Ribeiro e Celso Furtado.