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Milho tem vantagem em relação à cana, mas não deve superar 50% do mercado de etanol

Biocombustível fabricado a partir do grão tem menor custo por litro, mas etanol de cana ainda deve crescer

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O consumo de combustíveis do ciclo Otto deverá crescer 2% ao ano, no curto prazo

O etanol já teve um protagonismo maior dentro do Brasil. Analista de mercado da StoneX, Marcelo di Bonifácio Filho relembrou um pouco do passado do biocombustível no país em painel realizado no segundo dia da Conferência NovaCana, nesta terça-feira, 16.

Bonifácio Filho destaca que houve uma consolidação de mercado para o renovável ao longo da década de 2010. Mas vários fatores, como safras ruins e a questão de precificação, trouxeram anos prejudiciais ao etanol. “Em 2024, por outro lado, foi um período positivo e pode trazer uma pista do futuro, na direção do etanol de milho”, revela o analista.

Para o CEO da Evolua Etanol, Pedro Paranhos, a oferta de etanol de cana e etanol de milho devem crescer nos próximos dois anos. Para o biocombustível da gramínea, o aumento deverá ser de 2 bilhões de litros, enquanto o do grão deve trazer um volume adicional de 4 bilhões de litros.

Mesmo com esse aumento expressivo, Paranhos acredita que ainda falta muito para que o milho se torne a principal matéria-prima do etanol brasileiro. “A cana ainda deve representar 70% do total pelos próximos três anos”, detalha.

Ainda assim, o analista de equity do BTG Pactual, Thiago Duarte, reforça que o etanol de milho é mais competitivo que o de cana e deve continuar ganhando participação no mercado.

CRESCIMENTO DO CICLO OTTO

Paranhos estima que o consumo de combustíveis do ciclo Otto deverá crescer 2% ao ano, no curto prazo. Desta forma, o mercado interno não poderia absorver o volume adicional total de etanol, de milho e de cana, que surgirá nos próximos anos.

Ele indica que a participação de mercado do etanol hidratado deveria atingir 27% para que o Brasil pudesse consumir todo o biocombustível fabricado.

“Não tem mágica. É necessário um preço competitivo para que o valor chegue na bomba e o consumidor migre da gasolina para o etanol”, Pedro Paranhos (Evolua Etanol)

Para Bonifácio Filho, haverá um crescimento relevante do ciclo Otto em um horizonte de dez anos. Após 2035, entretanto, pode trazer uma estagnação, com a alta do mercado de carros elétricos, alerta.

“O longo prazo deverá ser liderado por consumo de hidratado, mas políticas públicas e incentivos devem acontecer para isso”, afirma e completa: “Existe a premissa do encarecimento da gasolina em detrimento do etanol”.

Além disso, Bonifácio Filho também aponta que questões tributárias, como a monofasia do ICMS para o etanol hidratado, podem melhorar o preço e favorecer o consumo, com aumento na participação de mercado.

ETANOL DE MILHO

A StoneX espera que o etanol de milho atinja 12 bilhões de litros ainda em 2025, revela Bonifácio Filho. Com este volume, e levando em conta o crescimento vertiginoso do setor, o biocombustível fabricado a partir do grão pode atingir 55% do mercado total de etanol brasileiro.

O analista considera as usinas em ampliação prometem 900 milhões de litros adicionais até 2030. Além disso, mais 4 bilhões de litros virão de plantas que ainda estão em construção.

“Em um horizonte certo, teremos cerca de 5 bilhões de litros adicionais de etanol de milho. Não apenas pelo Centro-Oeste, que é o grande líder do mercado, mas por todo o Brasil”, Marcelo Di Bonifácio Filho (StoneX)

Uma das principais razões para esse crescimento do setor de etanol de milho é a diferença do custo entre as usinas. De acordo com o analista do BTG Pactual, uma unidade de etanol de milho tem um custo fixo em R$ 1,94 por litro, enquanto uma usina de cana já atinge R$ 2,54/L.

Além disso, Duarte aponta que os gastos com manutenção são pouco representativos com o milho, enquanto as usinas de cana têm dispêndios com plantio e trato de canavial. “Há vinte anos, a produtividade de cana não sai do lugar e os custos vão sendo repassados. No milho, essas questões são absorvidas em produtividade”, complementa.

OS COPRODUTOS DO ETANOL DE MILHO

Os grãos secos de destilaria (DDGs) têm diferentes tipos de potencial de inserção no mercado, segundo Bonifácio Filho. Ainda de acordo com ele, o Brasil poderia consumir 14 milhões de toneladas do coproduto de etanol de milho. Também segundo o analista, há um potencial exportável, com diferentes países interessados no produto.

Ele ainda destaca que o DDG é uma parte robusta das receitas das usinas de etanol de milho, podendo cobrir até 40% dos custos de uma planta teórica no Mato Grosso. “Diante da competitividade, o etanol de cana fica refém do etanol de milho”, resume.

Duarte também acredita que há uma oportunidade “maravilhosa” para o mercado de DDG, com a possibilidade de intensificação da pecuária de confinamento.

OPÇÕES PARA O ETANOL DE CANA

Com a ascensão do etanol de milho, o de cana pode perder parcela de mercado. Os palestrantes da Conferência NovaCana, entretanto, indicam que existem outras possibilidades.

Bonifácio Filho destaca que o combustível sustentável de aviação (SAF) pode trazer um fôlego ao etanol de cana, mas que dependerá da preferência industrial. Ainda assim, a rota de óleos vegetais e gordura animal (Hefa) deverá ser a mais utilizada.

Em relação ao mercado de exportação, Bonifácio Filho relembra que o Brasil tem diversos parceiros, e que há uma demanda pelo mundo, ainda que seja variável. “Alguns países têm anunciado misturas de etanol à gasolina, como o Japão, que não tem produto para ofertar toda a demanda de 10% de etanol até 2028”, afirma.

Paranhos corrobora com essa visão, afirmando que a demanda poderá atingir 20 bilhões de litros, considerando SAF, o combustível sustentável marítimo (biobunker), o álcool para química e a mistura da gasolina. “Os melhores anos do etanol ainda estão por vir”, afirma o CEO da Evolua Etanol.

O analista do BTG, por outro lado, destaca que a história da exportação de etanol já é antiga: “O mercado ainda não aconteceu, ganhou diferentes desenhos e rotas, mas o pico da exportação de etanol ocorreu 15 anos atrás. É difícil acreditar que virá”.

De acordo com ele, a aposta mais segura é a participação do hidratado no ciclo Otto. Para isso, segundo Duarte, o incentivo deverá vir pela queda no preço. Ele acredita que a fatia de mercado tem que subir para 30%, com uma queda acentuada nos valores do biocombustível, para que a demanda possa absorver o volume da oferta adicional, sem grandes mudanças na frota ou no mercado de exportação.

Outra preocupação de Duarte é em relação à alíquota de importação de etanol. Se forem removidas as taxas, será desvantajoso principalmente para as usinas da região Nordeste. “Espero que essa remoção seja hipotética”, torce. (Giully Regina / NovaCana)