O clima seco, que tem provocado incêndios em plantações de cana-de-açúcar do Brasil, ameaça reduzir a safra do próximo ano no maior produtor mundial da commodity.
Imagens de canaviais em chamas na principal área de cultivo do Brasil têm circulado entre tradings, corretores e analistas, e alguns já esperam uma safra menor no próximo ano. O efeito dos incêndios, juntamente com o clima seco que afeta o desenvolvimento da cana, pode reduzir a produção de açúcar em 2,8 milhões de toneladas em 2021, disse o sócio da Archer Consulting, Arnaldo Luiz Corrêa.
As áreas de cultivo dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul registraram apenas de 5% a 25% das chuvas normais nos últimos meses, o que deixou as lavouras “extremamente secas”, disse o meteorologista agrícola sênior Donald Keeney, da Maxar, em Gaithersburg, Maryland. O fenômeno climático La Niña pode prolongar ainda mais a seca e ameaçar a colheita que começa em abril.
“Sabemos que o La Niña historicamente traz clima seco para o Centro-Sul do Brasil”, disse a chefe de análise agrícola e biocombustíveis da S&P Global Platts, Patricia Luis-Manso, em entrevista na semana passada. “Essa é uma tendência histórica, nem todos os La Niñas significaram tempo seco, mas, se isso acontecer, pode ser um risco”.
Uma safra menor no Brasil poderia reduzir a oferta global e ajudar a determinar se o mercado terá superávit ou déficit na temporada 2020-21, que começa em outubro. Analistas já estão divididos sobre isso. A diferença de opiniões se apoia em quanto a pandemia reduzirá o consumo ou levará o Brasil a produzir açúcar, que é mais rentável, às custas do etanol.
Alguns agrônomos já esperam queda de 5% na safra de cana no próximo ano, enquanto várias usinas estimam que a colheita deste ano terminará antes do previsto, disse Corrêa, da Archer, em post no LinkedIn. A cana afetada ainda pode ser esmagada neste ano e, embora possa impactar a safra de 2021, ainda é muito cedo para fazer qualquer avaliação, disse Luis-Manso.
O La Niña deve se intensificar nos próximos meses e diminuir entre março e maio, disse Keeney. O fenômeno tende a durar de seis a oito meses, mas às vezes dura um ano. Ainda assim, nas últimas duas vezes que o fenômeno climático ocorreu – com força em 2010/11 e de forma mais amena em 2017/18 –, o Brasil perdeu pouca produção.
Analista do Group Sopex, John Stansfield, disse estar menos pessimista sobre a safra e espera que as usinas esmaguem entre 590 milhões de toneladas e 610 milhões de toneladas de cana, volume praticamente estável em relação aos últimos anos. A S&P Platts prevê produção de cana de 595 milhões de toneladas, disse Luis-Manso.
O tempo seco ajudou a aumentar a produtividade industrial – a quantidade de sacarose na cana – neste ano e muitos pés de cana são jovens, resistentes e capazes de suportar o estresse, disse Stansfield em webinar da Platts na semana passada. Condições secas podem aumentar o teor de açúcar, mas prejudicar o crescimento dos pés de cana.
“Mesmo que esteja muito seco até janeiro, se as chuvas em fevereiro e março forem muito boas, parte disso pode ser compensado”, disse Luis-Manso. “Já vimos isso antes. Além disso, a idade da cana é relativamente jovem em comparação com alguns anos atrás, então a cana é menos vulnerável”.
Fonte: Bloomberg