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Unica prevê quebra histórica de 75 mi de toneladas de cana no Centro-Sul

Caso seja concretizada, projeção representará pior resultado do setor nos últimos 10 anos, afirma diretor técnico da entidade. Com prejuízos na colheita, produção pode ter recuo de 5 milhões de toneladas de açúcar e de 3 bilhões de litros de etanol

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Canavial em Santa Lúcia, vizinha de Araraquara, com a geada

Perdas causadas por geadas e mais recentemente pelos incêndios, associadas a uma redução já prevista na área de plantio, devem levar o Centro-Sul à pior safra de cana-de-açúcar dos últimos dez anos, projeta o diretor técnico da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), Antônio de Pádua Rodrigues.

A expectativa é de que a moagem nas usinas que representam a maior parte da produção sucroalcooleira do país tenha uma redução de 12% e atinja um patamar de 530 milhões de toneladas, 75 milhões a menos do que a moagem registrada na safra 2020/2021.

A redução é quase quatro vezes maior do que a projetada no início do ano por especialistas do setor, que previram um recuo de 3,5% na produção para a safra 2021/2022 em um cenário influenciado por reflexos da pandemia, chuvas irregulares e atraso no início das atividades das indústrias.

Entre abril e a primeira quinzena de agosto, segundo o relatório mais recente, a moagem total foi de 349,46 milhões, com uma queda que já chega a 6% em relação ao período anterior. Se essa quebra histórica se concretizar, 5 milhões de toneladas de açúcar e 3 bilhões de litros de etanol podem deixar de ser produzidos até o fim do ciclo. Futuras elevações nos preços não são descartadas, mas dependem de outros fatores como cotação do dólar, preço da gasolina e demanda dos consumidores no mercado interno.

Quebra da safra
Quatro fatores explicam as projeções pessimistas do setor sucroenergético para a possível quebra histórica:
– menor área de plantio;
– estiagem;
– geadas;
– incêndios.

Já esperada, a redução dos canaviais do Centro-Sul foi de 3% para a safra 2021/2022, segundo Pádua. “As empresas, em janeiro, fevereiro e março, prepararam mais áreas para o plantio, mas não conseguiram por falta de muda e de insumo”, diz o diretor técnico. Com a estiagem registrada desde abril, a produtividade caiu ainda mais. “A falta de chuva de abril até o presente momento jogou de novo a produtividade para baixo”, diz.

Entre junho e julho, as geadas resultantes das quedas bruscas nas temperaturas, incluindo regiões como a de Ribeirão Preto (SP), atingiram 1 milhão de hectares dos canaviais no Centro-Sul, o equivalente a 13% da área total destinada ao plantio, de 7,6 milhões de hectares. Cerca de metade disso, segundo Pádua, foi em território paulista. “Em São Paulo chegou próximo dos 500 mil hectares.”

Para se evitar a perda dessas plantações, que já estavam com crescimento comprometido, as colheitas foram antecipadas e a matéria-prima obtida ainda não estava no estágio ideal. “Quando você entra para colher uma área com geada, você tem que ser o mais rápido possível para a cana não morrer. Aí você vai colher cana com seis meses, com oito meses, cana com todo tipo de estágio de desenvolvimento. Em uma condição dessa você vai jogar a produtividade para baixo”, explica.

O cenário, que já se desenhava ruim com 20,4 milhões de toneladas processadas a menos até julho, ficou ainda pior com a baixa umidade do ar e o aumento dos incêndios nas plantações. A Unica ainda não sabe o tamanho da área atingida, mas acredita que consiste tanto de lavouras onde já tinha sido realizada a colheita quanto em canaviais que ainda renderiam matéria-prima para ser retirada.

PERDA DE PRODUTIVIDADE

Os efeitos são sentidos de imediato, no caso da área ainda disponível para colheita, que rende menos toneladas de cana. Segundo o balanço divulgado esta semana pelas usinas, a qualidade da cana, medida em açúcares totais recuperáveis (ATRs), está relativamente estável, com um incremento de 0,78% na comparação entre safras. Por outro lado, para cada hectare plantado, os canaviais do Centro-Sul renderam 75 toneladas, 12,8% a menos do que o rendimento do ano passado, de 86,1 toneladas.

“Essa cana vai ser colhida, com autorização da Polícia Ambiental, mas que produtividade ela vai ter?”, questiona Pádua. Além disso, isso deve se refletir na próxima safra, já que o fogo interrompe o ciclo de um ano, considerado ideal entre rebrota e colheita.

“Tem uma grande área da cana que pegou fogo. A cana já estava com três ou quatro meses, e se queimou tudo vou ter roçar e quando é que vou colher essa cana? É outro período, vai mudar o período de completar o ciclo. Geralmente a cana que é colhida em maio deste ano é colhida em maio do ano que vem”, explica.

Pádua afirma que esses incêndios, considerados criminosos, ocorrem a despeito dos investimentos feitos em caminhões-pipa e brigadas de incêndio nas usinas. Somente nas indústrias do estado de São Paulo, segundo ele, os gastos somam R$ 500 milhões por ano. “Em média cada usina tem mais de 11 carros-pipa para manutenção e tentar atacar esse fogo.”

MENOS ETANOL E MENOS AÇÚCAR

Com a produtividade em baixa, a união das usinas já projeta uma menor oferta dos principais subprodutos da cana. No caso do açúcar, a queda na oferta pode chegar a 5 milhões de toneladas, o que representa 13% do resultado total do ano passado, quando foram produzidos 38,46 milhões de toneladas. Entre abril e agosto deste ano, a queda acumulada já chega a 1,7 milhão de toneladas, ou 7,5%.

Mesmo antes dessa previsão, o preço do açúcar, que é cotado em dólar e tem como referência os contratos negociados nas bolsas de Nova York e Londres, já estava em alta. Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/USP), a cotação da saca de 50kg na quarta-feira (25) foi de R$ 130 ou US$ 24,55.

Como os contratos de exportação, que balizam os preços também no mercado interno, já foram realizados no início da safra, não deve haver impacto imediato ao consumidor por conta dessa redução na produção, segundo Pádua. “Com o preço do açúcar subindo hoje, o grande beneficiado é o fornecedor de cana, não a usina, porque você vai pagar a cana pelo preço atual do açúcar”, acrescenta.

No caso do etanol, a baixa pode atingir 3 bilhões de litros, quase 10% do total obtido no ciclo 2020/2021, com mais de 30 bilhões de litros. Entre abril e a primeira quizena de agosto, a baixa foi de 2,82% e só não foi maior porque a produção de etanol anidro – o que é usado na composição da gasolina brasileira – registrou alta de 25,3% diante de uma queda de 14,51% no hidratado, concorrente da gasolina nos postos.

Segundo a Unica, a redução do produto destinado às exportações e a crescente produção de etanol a partir do milho podem incrementar a oferta para o mercado interno na ordem de 1,75 bilhão de litros e ajudar a amenizar essa baixa. O diretor técnico não descarta a possibilidade de os preços do etanol hidratado se manterem em alta para os consumidores, mas a oscilação depende, segundo ele, do comportamento dos motoristas. Desde o início da safra, as vendas do produto no mercado interno acumulam uma retração de 12,29%.

“Enquanto tiver procura pelo consumidor, demanda e as distribuidoras estiverem dispostas a pagar esse preço ao produtor, ele vai continuar nesses patamares de preço. Amanhã, ao haver uma mudança mais forte do consumidor para a gasolina, e caíam as vendas de etanol hidratado, provavelmente vai ter um impacto de preço, porque vai mudar o cenário, o balaço entre oferta e demanda”, diz.

FATURAMENTO DAS USINAS

Diante dessas projeções de queda na produção, o faturamento das usinas pode se elevar de R$ 121 bilhões para R$ 132 bilhões este ano, estima o diretor técnico da Unica, porque a receita obtida por tonelada de cana, hoje em R$ 245, subiu na ordem de 20% em relação ao fim do ano passado, mais do que a possível quebra na produção, de 12%. Mesmo assim, Pádua afirma que os custos de produção também subiram.

“Os patamares de custo aumentaram significativamente. Aumentou custo do transporte, da colheita, meu custo por tonelada de cana. Isso não significa que esse aumento no faturamento possa resultar em resultado positivo. Vai depender da estrutura de custo de cada unidade produtora”, diz. (Fonte G1/Brasil Agro)