Comemorado internacionalmente, 20 de outubro é o Dia Mundial de combate ao Bullying e, esta data é um alerta para a problemática encarada por crianças, adolescentes e adultos, nos mais variados espaços frequentáveis.
Por ser um fenômeno social, o Bullying é manifestado de maneira sutil e tem características próprias, pois trata-se de um tipo de violência escolar e, segundo a literatura, há registros de ocorrências de pessoas que sofriam Bullying que, em atos de extremismo, para findar seu sofrimento, cometeram homicídio seguido de suicídio, pela incapacidade de agir contra a opressão imposta pelos agressores/intimidadores e, segundo relatos, essas vítimas não tinham intenção de atingir especificamente um ou outro estudante, porque o objetivo era “matar a escola”, ou seja, o espaço geográfico onde passaram momentos de frustração, vergonha, medo, humilhação, perante professores, pais e colegas omissos.
A correlação entre tentativas de homicídio seguidas de suicídio tem sido pesquisada, nas últimas décadas, e está relacionada ao Bullying – fenômeno que exibe atitudes covardes, intencionais e repetidas, exibida por uma relação desigual de poder, a fim de tirar a paz de suas vítimas predestinadas e, quando não causa sequela física, provoca consequências psicológicas ou emocionais graves nas vitimas, pois as atitudes agressivas não têm um motivo justo e são adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor, angústia, esgotamento e insegurança, decorrentes dessas experiências negativas.
Infelizmente, a mesma sociedade que lamenta o que aconteceu em Suzano/SP (2019), Medianeira/PR (2018), Goiânia/GO (2017), é a mesma que ignora ou negligencia os sinais, porque as vítimas dão sinais, como por exemplo, o aluno quieto em sala de aula ou o filho que fica trancado no quarto, o que usa moletom em dias insuportavelmente quentes, o que cobre a cabeça com capuz, o isolado no intervalo, o que passa a noite na internet, o de “olhar” vazio, etc.
As vítimas de Bullying mostram-se inábil para solicitar ajuda ou reagir frente à situação de conflito, porque são pessoas pouco sociáveis, inseguras, desesperançadas, com baixa auto-estima, quietas, passivas e com forte sentimento de insegurança e, isso as afeta no rendimento escolar e na frequência às aulas, pois acabam se recusando a ir à escola, visto que os agressores/intimidadores, na maioria dos casos, são da mesma sala de aula.
Nesse contexto, a questão a ser esclarecida é muito mais complexa do que brincadeiras diárias entre crianças ou adolescentes, no ambiente escolar, pois, a problemática enfrentada por alunos, pais e professores emerge quando, involuntariamente, a vítima toma para si as agressões impostas pelo Bullying, permitindo-se sofrer em um ponto muito específico do ser humano, chamado alma.
A dor na alma de uma vítima de Bullying é devastadora, podendo ser percebida pelo declínio do seu rendimento escolar, isolamento e ausência às aulas e, assim, arrisco-me a descrever que para prevenir o Bullying há a necessidade de que pais, alunos e professores estejam dispostos a interpretar o silêncio de possíveis vítimas, pois, sem o apoio de que elas precisam, jamais irão suportar as situações impostas pelo fenômeno, por inúmeros fatores e, dentre eles, a vulnerabilidade frente aos ataques contra suas almas. Em decorrência disso, toda a comunidade escolar sofrerá por consequência.
Ao mesmo tempo em que a vítima não encontra ajuda necessária, capaz de lhe dar suporte, o agressor/intimidador também dificilmente encontra quem o faça cessar e/ou o conscientize e o sensibilize para a boa convivência em sociedade.
Em relação especificamente ao caso de Bullying, tanto para agressores, quanto para vítimas e espectadores existe a carência de habilidades relacionais pelo fato de não as desenvolveram individualmente e porque lhes faltou oportunidade de se sentirem inseridos em contextos caracterizados pedagogicamente, nos quais poderiam aprendê-las e exercitá-las.
Entendo que, a sociedade brasileira, no tocante ao Bullying, demonstra, infelizmente, noções equivocadas sobre o fenômeno e seus significados, as consequências negativas, a covardia dos opressores, o silêncio dos oprimidos, a conivência dos espectadores, e o que é previsto na legislação vigente no país, porque esse fenômeno tem reflexos na vida do indivíduo, ocasionando violência contra a dignidade, causando danos psíquicos, morais, mentais, físicos e emocionais, impossibilitando-o ao pleno desenvolvimento de suas habilidades.
Porém, o problema não é apenas familiar, pois nem sempre o contexto-escola e o grupo-classe têm sido para agressores/intimidadores e vítimas, educativos, significativos ou úteis, porque o sistema educativo que os cerca não foi suficientemente incisivo para evitar que caíssem nesses dois estereótipos.
Assim, um contexto significativo, para a vítima, é aquele que consegue protegê-la das intimidações e humilhações; e que, depois, permite desenvolver com menos tensões sua capacidade de autodefesa. Para o agressor, por sua vez, é um contexto que, de um lado, o paralisa e o revela em sua ação transgressiva e, de outro, o induz a aprender as regras básicas da vida em comum (respeito ao outro, controle dos impulsos etc.), da sociabilidade e da solidariedade.
Segundo a UNICEF, uma em cada três crianças do mundo, entre os 13 e os 15 anos, é vítima de Bullying, na escola regular e, embora aconteça em todos os níveis de ensino, a presença do fenômeno é notada com certa frequência no Ensino Médio, fase que coincide com a adolescência, onde o indivíduo se encontra em transição física, emocional e psicológica entre a infância e a fase adulta. Esta última característica justificou a minha pesquisa com alunos de primeira série de Ensino Médio, de três escolas distintas, de clientela oriunda de bairros variados, alcançando assim uma representatividade do município de Araraquara – SP, estudo esse que resultou na primeira Dissertação de Mestrado publicada, no Brasil, sobre o tema.
Acredito que a solução, ou pelo menos a busca de solução, está na união de esforços entre poder público e sociedade, assumindo a existência de fenômeno em todos os lugares freqüentáveis e assim, ter a possibilidade de agir em favor dos atores sociais para que haja uma mudança real de comportamento e por consequência, a minimização, a prevenção e o combate eficaz ao Bullying.
De autoria do Vereador Elias Chediek, neste ano, foi aprovada e sancionada a Lei Municipal que institui e inclui no Calendário Oficial de Eventos do Município de Araraquara a “Semana de Conscientização, Prevenção e Combate ao Bullying” a ser comemorada anualmente na segunda semana de abril, em concordância ao dia 7 de abril que é o Dia Nacional de Combate ao Bullying.
Por fim, é urgente que tal temática seja abordada em sala de aula, pois segundo a minha pesquisa, três em cada dez alunos, percebem a presença do Bullying no espaço escolar e, conscientizá-los é o papel da escola, pois acredito que, o espaço escolar deve oferecer meios de conscientização sobre o respeito e as regras de conduta frente ao coletivo, neutralizando possíveis ações transgressivas e, ao mesmo tempo, cumprindo o que está previsto na Lei 13.185 – Programa de Combate à Violência Sistemática, vigente em todo o território nacional.
* Profª Ms. Juliana Munaretti de Oliveira Barbieri, com Mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (2007), Licenciatura Plena em Geografia (1998) e graduanda em Direito (2017), é professora efetiva no Governo do Estado de São Paulo e no Ceeteps – Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza. Ministra palestras e oferece treinamento sobre os temas: Bullying e Mobbing, pois é de sua autoria a primeira Dissertação de Mestrado publicada, no Brasil, sobre o tema, intitulada por Indícios de casos de Bullying no Ensino Médio de Araraquara-SP. Autora do Projeto Desvendando e Prevenindo Bullying, aplicado em Instituições de Ensino Públicas e Privadas, desde 2005. Atua de forma independente como editora, autora e co-autora de livros, artigos e textos que abordam os temas: Bullying, Mobbing, Violência Sistemática, Assédio Moral e o que é previsto na legislação vigente, no Brasil.
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