O cidadão quando contrata um plano de saúde cria uma expectativa de que sua saúde e integridade física serão garantidas pelo contrato, mormente ao fato de que está gastando uma polpuda parte de seus recursos para tanto, aliada à premissa de que se fosse para depender do mínimo de cobertura e assistência estaria contanto apenas com a cobertura de saúde prevista pelo Sistema Único de Saúde. Nesse compasso a expectativa e a boa-fé do consumidor devem ser levadas em consideração ao longo do tratamento custeado pelo plano.
É o que ocorre com a obrigatoriedade dos planos de saúde de fornecer a prótese para o consumidor que sofreu acidente de veículo e perdeu parte ou a totalidade de membro, bem como a substituição da prótese acaso houver indicação médica. Cumpre lembrar que cabe ao médico indicar o tratamento, medicamento, prótese etc., e não a operadora de plano de saúde. Portanto a autoridade máxima a indicar um tratamento, um medicamento ou a colocação ou substituição de uma prótese é o médico que possui legitimidade e conhecimento técnico, nunca a operadora de plano de saúde, que visando economia, confronta o posicionamento médico nem sempre visando o bem estar ou a cura do paciente.
A prótese nesses casos não tem finalidade estética e sim funcional ao paciente que poderá ter uma qualidade de vida melhor. O mesmo se diga a substituição da prótese por outra que melhor atenda a funcionalidade de movimentação do paciente. Cito um exemplo mais específico trazido pela Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 1.850.800, onde imaginem um paciente que sofreu uma amputação do membro inferior esquerdo, na altura da coxa, e fez uma cirurgia reparadora na mão esquerda, devido a um acidente automobilístico. Considerando ainda, que o mesmo possui parcialidade em sua reabilitação por utilizar prótese hidráulica, limitando-se o grau de sua mobilidade, apresentando uma marcha antálgica devido a dores intensas em sua coluna vertebral e o seu coto de amputação apresenta múltiplas escaras (feridas) devido ao sistema de encaixe rígido (inadequado), sem equilíbrio ao praticar sua marcha na fase de balanço a apoio ao solo (ato de caminhar), hesitação em mudar de direção, com perigo de quedas, pouco desenvolvimento em atividades diárias e autocuidado. Sendo assim, é nítido a de uma prótese de joelho eletrônico com pé de carbono, um liner de silicone e válvula de expulsão de ar (sistema de suspensão da prótese), devido a todos os benefícios que estes sistema agregam à segurança e proporcionam um conforto (evitando lesão em seu coto), autonomia na colocação da prótese e uma reabilitação correta ao nível de mobilidade deste paciente que é MOBIS 3 (totalmente ativo), evitando até uma possível reamputação devido à gravidade das lesões existentes em seu coto e evitando uma possível queda, visto que a lesão em seu quarto dedo da mão esquerda lesionada no trauma, decorrente do acidente, diminui sua firmeza em se segurar em caso de tropeço ao caminhar. Este tipo de prótese e seus sistemas auxiliares possui tecnologia para que evite problemas futuros de artrose em sua coluna vertebral, assegurando-lhe segurança em terrenos irregulares (calçada e seus desníveis), subida e descida de escadas e obstáculos existentes em sua rotina.
Esse exemplo é claro em exigir a substituição de uma prótese para o fim funcional e não estético, bem como visa garantir uma melhor condição de vida do paciente, devendo ser custeado pela operadora de plano de saúde, sem qualquer justificativa de exclusão de cobertura.
É certo que após uma cirurgia de amputação de membro ou parte de um membro por acidente de veículo a expectativa do consumidor é ter disponibilizado uma prótese que o ajudará a ter uma melhor condição de vida, de caminhar, não agravar suas lesões, enfim, levar uma condição de vida digna. Portanto, suprir essa expectativa do consumidor é negar o objeto do contrato de prestação de serviço à saúde, violando a boa-fé. Dessa feita a negativa de cobertura para a prótese se caracteriza como ilegal. O inciso IV do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor reza que são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.
Em suma as operadoras de planos de saúde devem arcar com a prótese ou a substituição da mesma em casos de amputação de membro por parte deste, decorrente de acidente de veículo.
Por Tiago Romano[i] – Advogado e Presidente da OAB-Araraquara