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Doria: O desafio e a lógica

Por Marcel Solimeo

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A recente decisão do governador Doria, que visa conter a expansão dos casos de covid-19 colocando todo o Estado na fase amarela do Plano São Paulo, foi recebida com surpresa e estranheza porque as condições da economia, sanitárias e sociais da atualidade são completamente diferentes das existentes quando da elaboração do Plano.

A preocupação com o aumento dos casos de contaminação e, principalmente, de mortes pelo vírus no Estado é válida e pode exigir algumas medidas para tentar conter o crescimento.

Isso não significa, contudo, que qualquer medida seja justificável.

É preciso analisar as causas e, então, estudar o que se pode fazer para atenuar o quadro da pandemia, procurando, no entanto, soluções que acarretem o menor custo econômico e social. É necessário que se verifique as causas da expansão, e as medidas compatíveis com a situação.

Quando da elaboração do Plano, a contaminação estava espalhada por várias regiões e era mais intensa nos locais de maior deficiência das habitações e da infraestrutura, enquanto no momento, o que se observa é que ela aumenta em “ondas”, como caracterizou o psiquiatra Daniel Martins de Barros, e ocorre, na maior parte, em “eventos” que promovem aglomeração.

Para Barros, esse aumento resulta do cansaço da população com o isolamento extremamente prolongado, e da menor percepção de risco, na medida em que os indicadores melhoraram. A “fadiga do isolamento”, segundo ele, desaconselha restrições rígidas, que não terão a adesão da sociedade.

Recorrer ao Plano nas condições atuais não parece compatível com a realidade, mas, como diria um conhecido economista, “pior para a realidade”.

Aplicar a todo o Estado o mesmo remédio não parece uma medida racional e compatível com a realidade de muitas cidades, o que pode implicar em sacrifícios desnecessários para sua população.

O que, no entanto, desafia qualquer raciocínio lógico, é aplicar essa medida em São Paulo, que se encontrava na fase verde, e que ao regredir para a amarela, teve o horário e a área de atendimento do comércio reduzidos, exatamente no período em que se espera o aumento da demanda. Qual a lógica dessa decisão?

O que se esperava, e escrevi sobre isso em outubro, é que se ampliasse o horário e a área, para atender ao aumento da demanda sem o risco de aglomeração. Não consta que o comércio, incluído os shoppings, tenham sido focos de contaminação, pois investiram em segurança de seus funcionários e dos consumidores. Sem isso, não atrairiam os consumidores.

Além do mais, diversas atividades comerciais funcionaram durante todo período da pandemia sem restrições de horário, e vão continuar funcionando com liberdade. Por que as demais têm que ser punidas com as restrições? E são exatamente os setores que já foram castigados com as restrições durante mais de seis meses.

As empresas desses setores que sobreviveram – muitas morreram pelo caminho – no geral encontram-se fragilizadas financeiramente, porque para sobreviver adiaram pagamentos de compromissos e, agora, têm que pagar o vencido e o corrente. Quando surge uma esperança, eis que uma medida injustificável os atinge novamente.

A sociedade e, principalmente, as empresas atingidas, têm o direito a uma explicação sobre a razão das medidas. Justificar apenas com os parâmetros do Plano São Paulo não explica e nem justifica.

Dizia Hayek, prêmio Nobel de economia, que “é difícil imaginar um mundo mais intolerável e também mais irracional do que aquele em que se permitisse aos mais eminentes especialistas de cada campo, proceder sem entraves à realização de seus ideais”.

*Marcel Solimeo, é economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo

**As opiniões expressas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores e não coincidem, necessariamente, com as do RCIARARAQUARA.COM.BR