Já se reconhece que os pequenos e médios prestadores de serviço e a incorporação imobiliária terão um aumento desproporcional de carga tributária, sob a alegação de que são subtributados (como se existisse uma tributação “normal”) e que consultas médicas, mensalidades escolares, prestações da casa própria, aluguéis, passagens de ônibus, diárias de hotéis, etc. são gastos de “ricos”, o que para a classe média pode parecer ofensivo.
De igual modo, já se admite que os maiores beneficiários da brutal redistribuição de carga decorrente da PEC seriam as instituições financeiras, que provavelmente devem estar reclamando de seus modestos lucros.
Os profissionais autônomos, os produtores rurais, qualificados como pessoas físicas equiparadas às jurídicas, e os pequenos e médios comerciantes e industriais ainda não entenderam claramente que estão no rol das vítimas potenciais. Suas pequeníssimas margens seriam tragadas pela proposta, o que inviabilizaria seus negócios, mesmo sabendo que são justamente serviços e agronegócios a sustentação dos raquíticos crescimentos do PIB brasileiro. Quando se aperceberem da tragédia, é pouco provável que fiquem felizes.
Pude perceber que o principal elogio à proposta se concentra na sua índole simplificadora, porque reduz o número de tributos. Seria isso realmente uma simplificação?
O Simples, instituído em 1996, era apurado pela singela aplicação de uma alíquota sobre uma base de cálculo, substituindo praticamente a arrecadação de todos os tributos federais incidentes sobre micro e pequenas empresas. Com ele, coexistiam harmonicamente sistemas estaduais simplificados (Simples Caipira, Simples Candango, etc.).
No bem-intencionado propósito de torná-los ainda mais simples, a Emenda Constitucional nº 43, de 2003, previu a instituição do Simples Nacional, abrangendo todas as entidades federativas.
Paradoxalmente, o sistema se tornou complexo, a ponto de a Lei Complementar nº 123, de 2006, que implementou o Simples Nacional, admitir, em seu art. 18, parágrafo 15, a indispensabilidade de um sistema operacional para possibilitar a apuração de um tributo presumidamente simples. Era um pedido de desculpas do legislador.
Hoje, o Simples Nacional precisa ser reformado, antes que se torne alvo dos “simplificadores”.
Imagine reunir em um só tributo incidências sobre a receita, como PIS/Cofins, e sobre o consumo, como IPI, ICMS e ISS, com administração compartilhada por todas as administrações tributárias dos entes federativos.
Como é constitucionalmente vedado converter o País em um estado unitário, seria instituída uma ciclópica administração tributária, com ares de um hipopótamo trôpego, sem falar na expansão descomunal da justiça federal, considerando que o tributo seria incluído em sua jurisdição.
PIS e Cofins têm praticamente a mesma legislação. Fundi-los implica tão somente abrir um contencioso sobre suas respectivas destinações (fundo de amparo ao trabalhador e orçamento de seguridade social). Para o contribuinte, nenhuma vantagem. É, portanto, mero simplismo e não simplificação.
Se a inclusão do IPI nesse bolo volta-se para extinguir a Zona Franca de Manaus, a do ISS e do ICMS é ofensiva ao pacto federativo.
O aumento de carga tributária sobre os optantes do lucro presumido, sob a égide da simplificação, é, paradoxalmente, um preconceito contra os regimes simplificados.
Seguramente nenhum dos mais de 850 mil contribuintes optantes do lucro presumido, os incorporadores com regime do patrimônio de afetação e os produtores rurais equiparados a pessoas jurídicas tem qualquer queixa quanto à complexidade de seus respectivos modelos de incidência. Mas o que sabem eles sobre tributos, quando pessoas pretensamente mais informadas optam por trotar sobre suas preferências?
Não é demais lembrar a lição do jornalista americano Henry Mencken (1880-1956): “todo problema complexo tem uma solução simples, fácil e errada”.
Everardo Maciel, jornalista
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