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A garapa virou fonte de renda e elegeu um dos homens mais populares de Araraquara

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O Sindicato Rural resgata a história de Benvindo Siqueira que já nos anos 60 reinava absoluto como ‘garapeiro’ em um terreno onde hoje é a Justiça Federal. Tornou-se ele um dos homens mais populares de Araraquara durante os cinco anos que manteve a garaparia.

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Era uma coisa quase que santificada: todos os domingos, lá pelas 10 horas da manhã, Benvindo Siqueira começava a armar aquilo que seria o ponto de atração e de lazer dos araraquarenses depois do almoço. A cidade, considerada economicamente emergente para os padrões da época, era puxada pela enorme quantidade de ferroviários da EFA e Paulista, além de um comércio envolvido pelas tendências do mercado renovador (municipal) que começou a ser construído em 1951 e foi inaugurado em 1959, no último ano do primeiro mandato do Governo de Rômulo Lupo, que atraia os consumidores da região.

Mas, lá estava ‘seo Benvindo’ instalando sua moenda na manhã de um domingo, ajeitando as mesas e os bancos embaixo das árvores que nasciam do chão batido e admirando a ‘36’ que ainda era de terra bruta, desaguando suas enxurradas no Buracão do Bairro de São Geraldo (onde hoje está o Tonin Hipermercados).

A área ocupada pela garaparia era enorme, pelo menos uns 2 mil metros quadrados. As mesas devidamente distribuídas no lugar eram feitas com tábuas e fixadas no chão, bem como os bancos e nelas as famílias se ajeitavam e por lá ficavam durante horas. Os jovens casais de namorados também viam no ‘garapeiro da 36’ o lugar ideal para as juras de amor e o clima dominical era de paz, chegou a comentar em uma das suas missas, o padre Armando Salgado, da Igreja de São Geraldo.

garapeiroBenvindo viu naquele verão de 1960 a grande oportunidade de ganhar um bom dinheiro, pois as datas para isso estavam surgindo. Primeiro, o Finados em novembro, pois além do dia 2 – data realmente dedicada aos mortos – também o dia 1 era ‘guardado’ como diziam os católicos (Dia de Todos os Santos). O feriado prolongado levaria muita gente ao Cemitério dos Britos, descendo o estradão que servia de estrada boiadeira para o gado que acabaria no Matadouro Municipal.

No mês seguinte o Natal e o Ano Novo (1961) exigiriam também de Benvindo muito trabalho, pois era comum vir gente de fora, principalmente da região ou então que deixava sítios e fazendas para as festas de fim de ano. Ele contava à esposa Aparecida Dameto Siqueira e aos filhos ainda crianças, que precisava de todo mundo no trabalho.

Até então, diz Osvaldir, um dos oito filhos de Benvindo, a cana não vinha limpa e nem amarrada: solta e em ‘casca’ precisava ser preparada para entrar nos dois cilindros da moenda. Os filhos ainda com pouca idade, porém, pautados pelo respeito, tinham o perfil do pai, voltado para o trabalho, criando com isso histórias e lembranças diferentes que contabilizavam memórias humanizadas.

Naquele atendimento nas tardes de domingo viam-se rostos, sorrisos e o gosto dos clientes a cada rodada da moenda espremendo a cana trazidada redondeza. Foi alí na Avenida 36 depois de muito trabalho que Benvindo viu a vida tomar forma, perdendo apenas para o progresso, com a abertura da 36 e o passarelar dos carros e caminhões.

O GARAPEIRO

De uma família de lavradores, Benvindo nasceu em Ibitinga, instalando-se em Araraquara em 1960. Quando chegou trabalhava como agricultor. Mas foi como garapeiro que ganhou fama em Araraquara. Ele foi o terceiro vendedor de caldo de cana a ocupar uma área que ia da Rua Armando Salles de Oliveira até as proximidades do Lar Juvenil.O local era conhecido como Jardim das Oliveiras.

À época, seu primeiro moedor de cana funcionava com a ajuda de um ou dois animais, via de regra burros,que o giravam. O bagaço que restava também era vendido. “Depois, meu pai conseguiu comprar uma máquina melhor. Ele era uma pessoa inteligente e conseguia fazer tudo muito bem. Ele mal conseguia assinar seu nome, mas sempre encontrava alguma solução para os problemas que surgiam. Também ganhava dinheiro com carreto e até com bicos de barbeiro”, diz Osvaldir. Hoje com 71 anos, o filho conta que não acompanhava o trabalho do pai de perto, pois ajudava na serralheria do tio e também estudava desenho. Porém, lembra com orgulho do sucesso do empreendimento.

“Minha mãe estava lá e me recordo dela comentando que o garapeiro vivia lotado. O trabalho era de segunda a segunda, sem descanso. Certa vez, num feriado de Finados, eu passei por lá e nunca vi tanta gente, tanto em pé, quanto nas mesas”, diz.

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Na profissão, Benvindo ficou por cerca de 5 anos, até que o local no qual trabalhava foi vendido para a construção do Nosso Clube, que abrigaria o time do Cestobol Clube de Araraquara, o que acabou não ocorrendo. No lugar depois funcionou a Chaban – fábrica de calças – que havia deixado a Avenida Bandeirantes. Atualmente o prédio é ocupado pela Justiça Federal tendo sido necessária sua reestruturação arquitetônica, preservando contudo o telhado e a fachada que era a entrada do Ginásio de Esportes. Com a construção do ginásio, Benvindo que pagava aluguel para o então vereador Mário Ananias, perdeu seu espaço. Depois, atuou como zelador no Clube Náutico e também na Pensão dos Atletas da Ferroviária. Ele faleceu em 2001, aos 85 anos.