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Cantor João Gilberto será sepultado nesta segunda no Rio

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João Gilberto, referência brasileira em todo o mundo

O cantor João Gilberto, (Juazeiro – Bahia, 1931) morreu neste sábado, aos 88 anos. O músico, que vivia no Rio de Janeiro, foi um dos maiores responsáveis por apresentar a Bossa Nova ao mundo. A informação da morte foi confirmada pelo filho do músico, João Marcelo, nas redes sociais, mas a causa ainda não foi divulgada. “Meu pai morreu. Sua luta foi nobre, ele tentou manter a dignidade à luz da perda de sua soberania. Agradeço à minha família (meu lado da família) por estar lá para ele, e Gustavo [Gustavo Carvalho Miranda, advogado e amigo pessoal] por ser um amigo de verdade para nós e cuidar dele como um de nós. Por fim, gostaria de agradecer a Maria do Céu [a moçambicana Maria do Céu Harris, 55, era companheira do músico há mais de 30 anos] por estar ao seu lado até o final. Ela era sua verdadeira amiga e companheira”, escreveu o filho, em inglês. Além de Marcelo, o cantor deixa mais dois filhos, Bebel e Luísa.

Os últimos anos da carreira e vida do cantor foram marcados por sua reclusão, dívidas e conflitos familiares. Não recebia ninguém em casa, a não ser alguns familiares, tampouco concedia entrevistas ou se apresentava nos palcos. Em 2017, sua filha, a também cantora Bebel Gilberto, começou a mover um processo de interdição do pai. A razão era sua situação financeira precária: ele chegou a ser despejado do apartamento em que vivia no Rio de Janeiro.

Mas em março deste ano, uma pequena vitória de uma história, porém, que não chegou ao fim a tempo: um tribunal no Rio de Janeiro deu razão a ele em sua batalha judicial contra a gravadora Universal Music. A sentença, unânime, obrigava a empresa a devolver ao músico os royalties que deixaram de ser pagos desde 1964, além de danos morais. Estimava-se que as cifras chegariam a 173 milhões de reais. A gravadora porém recorrera ao Supremo Tribunal federal (STF) e o processo, relacionado aos discos Chega de Saudade (1959), O Amor, o Sorriso e a Flor (1960) e João Gilberto (1961), ainda não foi julgado.

Caetano Veloso definiu em poucas palavras o que a música de João Gilberto significou para o Brasil e o mundo. Após recitar estrofes de canções de outros famosos intérpretes brasileiros, proclamou: “melhor que isso só o silêncio. Melhor que o silêncio, só João”.

Com sua interpretação de Chega de Saudade, composta por Tom Jobim e Vinícius de Moraes, deu início a uma revolução que sacudiria a música brasileira e mundial. Sem aquele disco, Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil e muitos outros não existiriam. João Gilberto sempre foi um perfeccionista e um sofredor nato: “Minha imagem dele é a de um Quixote que luta por afinar um universo inevitavelmente desafinado, afirmou Zuza Homem de Mello, crítico musical e amigo pessoal do cantor.

João Gilberto começou muito jovem a cantar música que escutava pelo rádio na praça de sua cidade antes de se mudar para Salvador com a intenção de viver de sua paixão, segundo relata o jornal O Globo. Mais tarde, se estabeleceria no Rio de Janeiro como cantor de um grupo chamado Garotos de Lua. Mas a tentativa não funcionou e ele abandonou a cidade, na época a capital do Brasil, em buscas de novos rumos. Durante seis meses que passou na casa de uma de suas irmãs em Diamantina (MG), saiu pouco de casa, foi econômico nas palavras e passou as noites provando novos ritmos com o violão. Ritmos que acabaram sendo revolucionários.

Tinha 26 anos quando voltou ao Rio de Janeiro, em 1957, para, como afirmou Tom Jobim, influenciar “toda uma geração de compositores, músicos e cantores”.

Sua última apresentação foi em 2008. Em 2011, cancelou mais um show e seu produtor foi condenado a pagar o local onde a apresentação aconteceria. Estava tão recluso, que seus últimos shows foram verdadeiros acontecimentos. Gostava de cantar sozinho, de terno e gravata, num banquinho e com um violão que abraçava cm doçura.

João Gilberto morreu na casa onde vivia, no Rio de Janeiro, e deixou o imenso legado da Bossa Nova, ritmo que colocou a música brasileira em um novo patamar em relação ao mundo. O gênero, surgido no final da década de 50 pelas vozes de João Gilberto, Tom Jobim e Vinícius de Moraes, revolucionou o jeito de se fazer música no país, com uma mistura refinada de samba com jazz. Mais do que o resultado sonoro, a Bossa Nova tornou-se um estilo, um movimento, remetendo ao Rio de Janeiro da metade do século passado e sua Garota de Ipanema, regravada mais de 200 vezes ao redor do mundo.

Diferentemente do samba, que surge nos guetos e trazidos ao Brasil pelos africanos, a Bossa Nova emerge de uma classe média branca na zona sul carioca, onde se concentram os bairros mais nobres da cidade. E se o primeiro ritmo é uma explosão, a elitizada Bossa Nova chega com fala mansa, em cima de um banquinho e acompanhada de um violão que leva a melodia às letras que falavam sobre amor e saudade.

Embora de vida curta – durou cerca de uma década – o movimento deixou um legado valioso para a música brasileira, do jazz ao rock, influenciando fortemente a contemporânea Música Popular Brasileira. Para além das incansáveis regravações de seus clássicos ao redor do mundo, a Bossa Nova quebrou alguns estereótipos do “país do samba”, dando uma nova cara para os ritmos brasileiros. Desafinados ou não.

SEPULTAMENTO

O corpo de João Gilberto será velado nesta segunda-feira (8), das 9h às 14h, no Theatro Municipal do Rio, no Centro. A despedida será aberta ao público. O enterro será às 16h no cemitério Parque da Colina, em Niterói.

O músico morreu em casa. No início da tarde deste domingo (7), a viúva de João, Maria do Céu Harris, de 55 anos, saiu do apartamento onde vivia com o músico por volta das 12h. Muito emocionada, ela não quis falar com a imprensa. O corpo do cantor havia sido levado do apartamento da família no Leblon, na Zona Sul do Rio, ainda durante a madrugada.