Entrei pelo portão lateral carregando o pequeno vaso de begônias. Rosadas, quase vermelhas, com manchas brancas. Ela gostava de flores. Segui pela vereda que parecia não ter fim. O sol sugava a energia dos homens, das plantas, do chão, dos jazigos. Sentidos alternavam-se. A graça dos beija-flores passeando pelas flores acalentava a alma. O medo das mangavas zunindo e cruzando meu caminho intimidava o espírito.
Continuei pela passarela da memória. Cada lápide com suas lembranças. Nos túmulos, flores secas. Funcionários da limpeza aproximam-se. Era hora de limpar a sujeira do feriado de finados. Vasos recolhidos em carriolas. Restos de vela, cigarro, latas de cerveja amassadas e baratas mortas também eram retirados.
Chego a meu destino. Ofereço as begônias com os olhos marejados. Fico ali parado, velando quem se foi. Receio ir embora. Espero que deixem as begônias intactas por pelo menos mais alguns dias. Ela gostava de flores. Espero a limpeza acabar para ter certeza de que não tocariam nelas. Flora morta toda recolhida. Restaram flores de plástico. Não é a mesma coisa. Por isso permaneci. Begônias têm vida.
Retorno pela vereda. Beija-flores continuam a bater asas por ali. Desvio de outras mangavas. O sol esquartejava meu rosto, o suor se mistura a uma gota de lágrima. Enfim, o portão. Dos muros para fora a vida pulsa, é preciso continuar. Fim do mergulho interior. Volta às raízes. Vida que segue. Lição que fica. E saudade.
Para minha mãe, Vilma Ambrozino Zakaib, em memória, que faria aniversário em 7 de novembro