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“Em briga de marido e mulher”, agora o síndico “mete a colher”

Lei que obriga síndicos a comunicarem casos de violência doméstica entrou em vigor nesta semana; em Araraquara, síndica já age dessa forma há quase dois anos

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Síndica do Residencial Áster, Livia Rochetto de Souza, de 30 anos, já comunica casos de violência doméstica à polícia há quase dois anos

A lei que acaba de entrar em vigor nesta segunda (15) enterra de vez a expressão “Em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. Agora os síndicos que atuam no estado de São Paulo são obrigados a comunicar aos órgãos de segurança os casos de violência doméstica ou familiar que ocorram em seus condomínios, sejam eles residenciais ou comerciais.

Diante de qualquer indício de violência contra mulheres, crianças, adolescentes e idosos em áreas privadas ou comuns, os administradores devem atuar. A comunicação deve ser feita durante a ocorrência ou em até 24 horas após tomarem ciência do caso, levando à polícia o máximo de informações para a identificação da vítima e do agressor.

Em Araraquara, pelo menos um condomínio já atua dessa forma há quase dois anos. Eleita em setembro de 2019 para ser síndica de um condomínio entregue em fevereiro de 2020, Livia Rochetto de Souza, de 30 anos, conta que com a nova legislação, a realidade não muda muito no Residencial Áster, pois sempre foi comprometida com a segurança dos moradores em situação de maior vulnerabilidade.

Livia Rochetto de Souza, de 30 anos já denunciou casos de violência doméstica enquanto síndica

“Mesmo antes da lei, já acionávamos conselho tutelar, polícia e serviços sociais. A nossa portaria já é orientada a me comunicar e acionar a polícia em casos de necessidade e autorizar a entrada de viaturas e serviços sociais identificados, para socorrer qualquer morador em situação de perigo. Chamar a polícia em casos de agressão pode ser delicado, pois nem sempre a vítima está pronta pra aceitar o socorro, mas persistência é a chave pra conquistar a confiança e poder ajudar essas pessoas”, avalia Livia.

O condomínio em que Livia é síndica conta com 256 apartamentos, divididos em 16 blocos, onde residem atualmente cerca de 700 moradores. Ao longo desses dois anos de trabalho, ela já enfrentou situações em que teve de comunicar a ocorrência de violência doméstica à polícia e lidar inclusive com a ameaça do agressor. “Eles tentam intimidar quando veem que a síndica é uma mulher, mas eu enfrento”, completa.

Comunicação e legislação

A nova lei obriga ainda os condomínios a fixarem comunicados divulgando as diretrizes e incentivando os moradores a notificarem a administração quando tomarem conhecimento de casos.

O texto ressalta ainda que não é preciso ter certeza de que está ocorrendo um episódio de violência doméstica para que a polícia seja acionada. Uma suspeita é suficiente para enviar uma comunicação por telefone ou aplicativo às delegacias especializadas ou órgãos de segurança.

A lei foi proposta em março de 2020 pelo deputado estadual Professor Kenny (PP) e aprovada pela Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) em agosto deste ano.

O texto original previa sanções para os condomínios que não cumprissem as orientações. Na primeira infração, seria aplicada apenas uma advertência. Caso houvesse omissão pela segunda vez, haveria multa, de 50 a cem vezes o valor da Ufesp (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo), ou seja, valores entre R$ 1.454,50 e R$ 2.909,00.

As penalidades, no entanto, foram vetadas pelo governador João Doria (PSDB) ao sancionar a lei, em 15 de setembro. A legislação paulista é semelhante ao Projeto de Lei 2.510/20, proposto pelo senador Luiz do Carmo (MDB-GO), que já foi aprovado no Senado e remetido à Câmara dos Deputados.

A proposição também obriga os síndicos a comunicarem os casos de violência doméstica e familiar, mas estende aos moradores a responsabilidade legal de avisar os administradores caso tenham ciência de algum caso. A recomendação, no texto, é que façam denúncias anônimas.

Em caso de descumprimento, o projeto que tramita no Congresso prevê que o morador pode ser multado, assim como o síndico. Além disso, o administrador pode ser destituído do cargo.