
Durante muitos anos, Gérson Ferreira Júnior e o irmão Gumercindo Ferreira, viveram a glória de confeccionar a calça mais cobiçada do Brasil nos anos 80: Chaban, que era sinônimo de requinte, modelagem e poderio econômico. Se Araraquara vestia Chaban, o Brasil disputava no mercado o desejo de possuir uma calça que tinha – queda, segundo os estilistas.
Neste domingo (27), faleceu Gerson Ferreira, que vinha convivendo com uma doença degenerativa. Recentemente foi acometido pela Covid-19, ficou um período internado, recuperou-se, porém por complicações renais voltou ao hospital onde faleceu na madrugada deste domingo. Seu corpo foi sepultado ainda no mesmo dia, período da tarde no Cemitério Parque dos Lírios. Por ser fim de semana poucos tiveram conhecimento sobre sua partida.

Seu irmão Gumercindo faleceu cerca de 10 anos atrás, mas ambos escreveram uma história importante em todo processo de desenvolvimento econômico de Araraquara; da pequena fábrica na Avenida Bandeirantes, em frente a Escola Industrial , para a nova indústria montada na Avenida Padre Francisco Salles Colturato onde hoje está a Justiça Federal, foi um enorme salto na vida da Chaban.
Gérson era o cérebro da fábrica, Gumercindo uma espécie de relações públicas, o que lhe valeu o cargo de diretor regional do Ciesp em Araraquara. Retraído e afinado com a gestão da empresa se surpreenderam um dia com o desejo do estilista Paco Rabane conhecer as calças fabricadas pela Chaban.

O GRANDE DIA DE PACO RABANE EM ARARAQUARA
16 de setembro de 1988, sexta- feira. A Chaban, nome fantasia de Chapéus Bandeirantes em Araraquara, está pronta para receber Paco Rabanne, estilista que ficou famoso por suas confecções futuristas, que fizeram o guarda-roupa dos grandes centros da moda mundial na década de 1960. A confirmação veio dois dias antes através do representante da marca no Brasil.
Mas o que estaria trazendo o estilista transformado em empresário da moda mundial à nossa cidade? Vinte e sete anos depois, em seu escritório, Gerson Ferreira, antigo diretor da indústria, contou para um seleto grupo de amigos a razão da visita à fábrica: “O nosso nome era muito forte e a Chaban buscava uma marca importada para se consolidar ainda mais. Através de um representante da Paco Rabanne, as conversas avançaram e fechamos acordo. Eles fizeram uma grande proposta na época, mas nós não concordamos pois tínhamos que preservar o grande número de clientes que possuíamos. A modelagem feita para a marca seria idêntica à modelagem das calças que já fabricávamos para os lojistas daqui”.

Da produção da Chaban, cerca de mil calças por dia, pelo menos 30% eram enviadas aos revendedores da Paco Rabanne em todo território nacional. “Nunca mandamos fazer nada fora da fábrica. Contávamos com uma equipe de 350 funcionários. Tudo era supervisionado por um chefe de produção, o Pedro Martini Neto e por mim. A gente sempre fiscalizava os setores para saber se o material estava com qualidade”, assegurou Gerson naquele dia.
Paco Rabanne ficou impressionado com a modelagem das calças; ela havia sido feita por um dos mais famosos alfaiates de Araraquara, Álvaro Ferrarezi, conhecido como “Lili Ferrarezi”, nascido em Matão em 1914 e diplomado Alfaiate em 1939 pela Escola “José Lazarini”, em São Paulo.

O início da fabricação de calças, no entanto, começou em 1964, quando Gerson Ferreira procurou Lili Ferrarezi para confeccionar duas calças: uma para ele e outra para o irmão Gumercindo. Eles aprovaram e decidiram criar o projeto de fabricação em série, mesmo porque a venda de chapéus estava caindo no mercado nacional.
“Chapéus Bandeirantes veio através do meu pai, o Gumercindo Ferreira Silva, em 1940. Ele tinha na garagem de casa, localizada na Rua Nove de Julho, esquina com a Monteiro Lobato, a pequena fábrica onde fazia chapéu de palha. O material (carapuça) vinha de Sobral, no Ceará, e ele confeccionava para o trabalhador. Logo depois comprou um terreno na Avenida Bandeirantes e montou a indústria para a fabricação de chapéus de palha”, contou Gérson.

Os filhos Gumercindo e Gerson começaram a trabalhar cedo ajudando o pai na fábrica, ambos com menos de 20 anos. Assumiram os negócios em 1953, e 16 anos depois, a fábrica de chapéus contabilizava 110 funcionários. Porém, a partir de 1965, as vendas de chapéu começaram a cair. “Conseguimos nos alavancar quando o músico Nat King Cole veio ao Brasil usando um pequeno chapéu de aba estreita. A moda foi lançada e a Fábrica de Chapéus Bandeirantes ganhou impulso”. Com visão de futuro, Gerson e Gumercindo não ficaram alheios à decadência do uso de chapéus e decidiram partir para a fabricação de calças. Assim nasceu a Chaban.
“Os clientes queriam sempre comprar coisas novas e interessantes para colocar em suas lojas. As peças saiam em grande quantidade, mas nada além do normal, até para não encalhar as vendas caso surgisse uma novidade”, revelou Gerson aos seus amigos.

Com a entrada de Collor de Mello no governo, o panorama econômico começou a mudar. A abertura da importação na época fez com que os produtos subsidiados da China devastassem não só a Chaban, mas várias empresas como as da cidade de Americana (SP), por exemplo. “Conversei com o meu irmão Gumercindo e chegamos à conclusão de que se continuássemos com a fábrica, poderíamos perder tudo o que havíamos conquistado com o trabalho árduo durante anos”.
Seu envolvimento social foi muito grande na cidade e uma de suas principais ações foi patrocinar o time de futebol da Ferroviária, de 1983 a 1985. A Chaban foi um orgulho para a cidade e quase toda história foi levada por Gérson Ferreira neste domingo, com muita tristeza para todos nós e principalmente sua esposa Marisa Rodrigues Ferreira, os filhos Fernanda, Fabiana, Flávia e Gerson Ferreira Júnior. Ele deixou ainda genros, nora e netos, além de parentes e inúmeros amigos.
