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Quem diria! O DER disputou vaga para participar do “Paulistão” em 52

Para montar um time de futebol com característica profissional na época, o DER contratava jogadores de peso e os tornavam funcionários com a sigla PO - Pessoal de Obra. Eles ficavam comprometidos apenas em defender a equipe no Campeonato Paulista.

1753
28 de dezembro de 1952. O EC DER está pronto para enfrentar a Ferroviária pelo Campeonato Profissional de Acesso no Estádio Municipal. Para defendê-lo estão Euclides, Amaral, Rudy, Humaitá, Linho, Elcias e Antônio Spagaro (treinador); Juracy, Abacaxi, Ferrari, Natal e Tom-Mix

Não estou lembrado se era março ou abril. O ano 69. Pouco antes de começar o programa “Janela Esportiva”, passa pelo estúdio da Rádio Cultura, o cronista Mário Boschiero, também funcionário do DER e eu lhe pergunto sobre o DERAC, um time de futebol montado pelos funcionários do Departamento de Estradas de Rodagem. Jeito bem simples ele respondeu: “Qualquer hora eu te conto de um outro time do DER, o primeiro que surgiu nos anos 30, chamado EC DER”. Mário até então tinha uns 45 anos e a vida como Contador Chefe do DER já havia lhe dado grandes alegrias. Fatos curiosos também. Um deles, de ir buscar em São Carlos um juiz de futebol que chegaria de São Paulo para apitar um jogo do seu DER em 1953. Foi entre São Carlos e Araraquara que ele convenceu o juiz a apitar bem a partida. Quando me contou a façanha só foram risos. E do Mário, filho da dona Luzia e do “seo” Humberto Boschiero, tenho enormes saudades, como amigo e companheiro de imprensa. Ele foi correspondente esportivo da Folha de São Paulo por muito tempo, chegou a fazer o programa Música Romance, pela antiga Voz da Araraquarense. Sua partida em 1996, aos 72 anos, deixou em nós um grande vazio. Era uma notável pessoa. (Texto de abertura: Ivan Roberto Peroni)

ANOS DE OURO DO E.C. DER

Distintivo do Esporte Clube DER de Araraquara

Quando o Departamento de Estradas de Rodagem foi criado em 1934, tinha o intuito de trazer segurança e a integração dos meios de transporte com as principais rodovias municipais e federais, ordenando maior capacitação na circulação de veículos de passeio e de carga.

Mas nem só de estradas o departamento viveu. Em 1948, quando se instalou entre a Rua Castro Alves e Avenida Presidente Vargas, no Quitandinha, a Divisão Regional 04 de Araraquara tomou posse e uma das ideias era formar um time de futebol amador assim que tudo estivesse normalizado na nova unidade.

No time de 1951, quando ainda em formação, o EC DER tinha como atleta conhecido o famoso ponteiro esquerdo Tom Mix, tirado da ADA

Foi então que no dia 13 de abril de 1951, em ata divulgada pelo diretor do DER e um dos grandes incentivadores do futebol dentro da regional, Alberto Maricato, anunciou em assembleia a fundação do Esporte Clube DER, que teria as cores brancas e azul em seu uniforme.

“Para maior união e estreitamento das relações entre seus funcionários, um clube, que terá por fim promover e estimular a prática e o desenvolvimento de todos os jogos de salão, exercício atlético e desportos amadoristas”.

Natal, Walter e Flávio Constantino em festa de confraternização organizada pelos diretores do time do DER. Eles se reuniam após as partidas como forma de manter unida a equipe. Foi assim que o E.C. DER caminhou por um bom tempo

Com uma estrutura aliada as outras regionais, Bernardino Pimentel Mendes, um dos pioneiros do projeto, incentivou a construção de um campo e ginásio para a prática de esportes, logo finalizada no ano de 1952.

E o projeto do DER era tentador e audacioso: queria fazer frente à Associação Ferroviária de Esportes. Por isso, seus diretores contrataram alguns dos veteranos do Paulista e São Paulo que haviam fundado a Associação Desportiva Araraquara.

O DER no começo dos anos 60 com Demazinho que jogou no Itamaraty, Renato do Jabaquara no Santa Angelina, Tom Mix e outros atletas do nosso futebol amador

Entre eles estava Tom-Mix, um dos principais jogadores da cidade na década de 50, passando por ADA e Ferroviária. Nos jogos contra o esquadrão, a equipe azulina deixou uma grande impressão para os entusiastas do futebol araraquarense. Apesar de perder dois jogos por 2 a 1, um disputado na Fonte Luminosa e outro no Estádio Municipal, a equipe demonstrou qualidade e tinha tudo para ser um gigante da região.

A saga do terceiro grande time com poderio financeiro resultou na disputa do campeonato de acesso para o Paulistão de 1953, mas sem grande sucesso. Foram 20 partidas disputadas, com cinco vitórias, três empates e 12 derrotas. Foram 41 gols marcados e 52 sofridos. Destaque para a goleada aplicada no Olímpia, 7 a 1, e da derrota para o Botafogo-SP pelo mesmo placar.

Nesta foto de 1960 já aparece Paschoal Gonçalves da Rocha que se tornou funcionário do DER e um dos divulgadores das atividades do time

Ao longo da sua caminhada esportiva, o E.C. DER teve o apoio de incontáveis diretores e funcionários. Porém, é plenamente justo que se reconheça a importância daqueles que decidiram fundar naquele 1934 a agremiação.

Fundadores: Bernardino Pimentel Mendes, Alberto Maricato, Lesko de Araújo Junior, Olavo Guimarães Cupertino, Antônio de Vasconcellos, Laerte Torres Santiago, Jayme Nardy Vasconcellos, Nelson Carlos Alberci, João Roberto Pasenow, Geraldo Gonçalves, Percyla Rodrigues, Arcênio M. Amaral, Clodoaldo de Oliveira, Newton de Oliveira Bueno, Gabriel do Nascimento, Célio Biller Teixeira e Pedro Rodrigues Oliveira Filho.

Muitos deles deixaram o apego familiar pelo DER, exercendo com dignidade a função que ocupavam e ainda hoje são lembrados com saudade pelos antigos colegas de trabalho.

TAÇAS E TROFÉUS ESTÃO GUARDADOS COMO SÍMBOLO

Laerte Torres Santiago, 43 anos de serviços dentro do DER esteve na fundação do clube em 1954; ao apanhar a foto, se emocionou por ver tantos amigos que estiveram ao seu lado fazendo parte da história da unidade em Araraquara. Ao lado a taça do Campeonato Varzeano de Araraquara em 51.

A história contada por quem esteve na reunião de fundação do Esporte Clube DER em 34. Falamos de Laerte Torres Santiago, pois a vida lhe ensinou muita coisa durante o caminho que trilhou por 43 anos dentro do DER. O seu nome está na ata de fundação do clube. Aos 88 anos, o aposentado do departamento recorda aquele grande momento vivido na regional de Araraquara.

Um dos símbolos do DER sempre foi este trator no seu terreno na Presidente Vargas

“O Alberto [Maricato] foi um dos que mais se dedicaram no DER para que o time de futebol acontecesse. Traçamos um plano para contratar os jogadores mesmo não trabalhando na regional”.

Como o DER não contava com funcionários que poderiam fazer parte do time, as contratações dos jogadores eram feitas através de uma P.O. (Pessoal de Obras), sigla usada dentro da unidade para pessoas que vinham dar manutenção às obras edificadas.

Na equipe de futebol de salão do E.C. DER nos anos 60 aparece Paraguaio, que se transformou num dos grandes jogadores do nosso Campeonato Amador

“Eles não poderiam trabalhar no DER. Sendo assim, abríamos um chamado de P.O. e o pagamento deles seria o salário para jogar pela equipe do DER, mas isso durou muito pouco, infelizmente”, relata Santiago.

Com o passar dos anos, ficava difícil manter o grupo ligado ao DER e não demorou muito para que o time encerrasse as atividades. “O legado daquilo tudo foi de ter ajudado aquelas pessoas a ter um padrão de vida. Sempre ajudamos no que fosse preciso, na confecção de uniformes e chuteiras. Os treinamentos eram realizados em um campo próximo onde é o Senac (antigo Paulista). Conseguimos alavancar a vida de cada um deles”.

O encerramento do time profissional do DER não fez o departamento acabar de vez com o futebol. Jogos no Dia do Trabalho eram realizados e as disputas intensas no campeonato amador da cidade fizeram parte de seus anos dourados.

Veteranos E. C. DER em 1973; Nelson Mariottini (Batata), seo Barros, Valdir, Tiana, Braga e Linho; Chirito, Tom Mix, Pedrinho, Canhoto e Chaffic (Chafizinho).

O PRESENTE

A história que o ECDER – como era chamado popularmente – construiu, ainda está guardada na Regional 04 de Araraquara. O interessante desta pesquisa fez com que a parte administrativa do DER resgatasse artefatos que comprovam o quanto o clube foi importante, não só para eles, mas para a cidade. Um quadro com fotos dos jogadores que fizeram história no clube, juntamente com Paschoal Gonçalves da Rocha, eterno funcionário da instituição e o “Papa Grená” da Ferroviária, encontra-se intacto mesmo com o passar do tempo.

Engenheiro Walter Barreto Levy mostra orgulhoso a taça conquistada pelo DER em 1952, quando o time disputou um torneio organizado pela Liga Araraquarense de Futebol, a nossa LAF

“Este armário que encontramos estava muito empoeirado. Aí observamos que só havia taças de campeonatos que o time disputou”, conta o engenheiro do DER, Walter Barreto Levy.

Ele não viveu aquela época de ouro, mas sentiu muito orgulho de ver que o departamento escreveu histórias pelos gramados araraquarenses e feliz por ter achado um pedaço desta existência ainda dentro do DER.

“Vamos trabalhar; deixar isso exposto para quem vier nos visitar aqui no DER. É um pedaço da história que não pode ser jamais esquecido aqui dentro e para a população de Araraquara”, conta segurando o objeto mais importante encontrado: a taça de campeão de um torneio realizado pela LAF (Liga Araraquarense de Futebol) de 1952.

1952: TIME MONTADO PELO DER PARA DISPUTAR O ACESSO À DIVISÃO ESPECIAL DO CAMPEONATO PAULISTA

Hoje, o departamento tem um campo de futebol e um ginásio para jogos de futsal, mas apenas o campo é usado para partidas particulares nos finais de semana por membros da Polícia Rodoviária e seus funcionários.

UM CAPÍTULO Á PARTE – MÁRIO BOSCHIERO

Mário Boschiero foi um dos grandes incentivadores do time de futebol do DER. Ele nasceu em 21 de agosto de 1924, em Bocaina, vindo a falecer na capital, em 15 de julho de 1996. Filho de Humberto Boschiero e Luzia Cicarelli, foi casado com Yone Fattori Boschiero, com quem teve dois filhos: Mário Augusto e Eduardo.

Residiu em Bocaina até os 15 anos de idade, onde cursou o então grupo e ginásio, mudando-se em 1939 para Araraquara, onde formou-se Contador pela então Escola de Comércio de Araraquara.

Jornalista Ivan Roberto Peroni e Mário Boschiero em 1978

Filho de família humilde, trabalhou desde jovem em várias atividades, como carregador, escriturário, motorista e finalmente Contador. Ingressou no Departamento de Estradas de Rodagem – DER, em 1950, onde permaneceu até a sua aposentadoria como Contador-Chefe.

Homem dedicado à comunidade, colaborou com o Poder Judiciário exercendo a função de COMISSÁRIO junto ao Juizado de Menores, colaborando com a Justiça Eleitoral durante os pleitos eleitorais. Mário Boschiero participou também de atividades jornalísticas, sendo correspondente esportivo do Jornal “FOLHA DE SÃO PAULO”. Foi também cronista esportivo, exercendo a Presidência da Associação dos Cronistas Esportivos de Araraquara em dois mandatos. Na antiga Rádio “VOZ DA ARARAQUARENSE” teve um programa dominical denominado “A MÚSICA ROMANCE”.

Uma história que jamais poderá ser esquecida.

GOL DE ABACAXI NARRADO POR FIORE GIGLIOTTI

Fato curioso na história do EC DER é que o ponta direita Abacaxi, cujo nome verdadeiro era Ezio Martimiano de Oliveira teve um dos seus gols narrados por Fiore Gigliotti, do Scratch do Rádio da Bandeirantes de São Paulo de forma fictícia em 2006. O filho de Abacaxi, o compositor José Henrique Martimiano fez em parceria com Nelson Wellington a música “É Gol” que faz parte do CD gravado pela cantora Adriana Gennari/Mecânica dos Solos em 2006, pouco antes do falecimento de Fiore, aos 77 anos (8 de junho de 2006).

Com ajuda de Paschoal Gonçalves da Rocha, muito amigo de Fiore, convenceu o locutor a gravar um gol do EC DER que entraria em trechos da melodia. Fiore gravou e pouco depois veio a falecer.

Segundo Zé Henrique o gol montado foi contra o América, em São José do Rio Preto, com vitória do DER por 2 a 1, em 1952. Por que Abacaxi?, perguntamos a Zé Henrique: “Meu avô tinha uma venda (secos e molhados) em Américo e o meu pai cuidava da banca de abacaxis, daí o apelido. Ele faleceu em 2015, aos 81 anos”.

Ouça a música cantada por Adriana/Mecânica dos Solos e o gol narrado por Fiore Gigliotti no final.

Texto: Rafael Zocco