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Reitor faz histórico e aponta desequilíbrios da Unesp

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Universidade se encontra em situação financeira e orçamentária difícil

Há dois anos no cargo de reitor da Unesp, o professor Sandro Roberto Valentini perdeu a conta de quantas audiências agendou com secretários ou governadores para levar a eles um quadro fiel da situação da Universidade e dialogar em busca de uma saída para o reequilíbrio financeiro da instituição. Nesta entrevista, anterior à sessão extraordinária do Conselho Universitário de 22 de janeiro, Valentini faz um histórico e aponta as principais causas do desequilíbrio orçamentário e financeiro da Unesp.

Portal da Unesp: Qual era a real situação da Unesp quando o senhor assumiu a gestão em janeiro de 2017?

Sandro Valentini: Para explicar como estava a Unesp quando eu assumi, é preciso voltar um pouco no tempo. A partir do ano de 2013, ocorre uma estagnação na tendência de crescimento da cota-parte da Universidade, devido à redução da arrecadação do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) no Estado de São Paulo. Isso em um momento em que a Unesp sentia os efeitos de sua grande expansão. Era um esqueleto de Universidade muito maior do que o da década anterior, pois havia criado oito câmpus novos e, naturalmente, tinha que atender uma demanda crescente de despesas, inclusive de Permanência Estudantil. No período de 2014 a 2016, na gestão anterior à minha, ocorreu uma redução significativa na reserva para cobrir as despesas da Universidade, que ultrapassavam as liberações financeiras, uma vez que o ritmo de crescimento das despesas não foi desacelerado a tempo. A redução da reserva nesse período, sem considerar recursos de convênio, foi de cerca de 70%. O dinheiro em caixa caiu de R$ 856 milhões para R$ 270 milhões. Essa era a situação financeira da Universidade quando assumi a gestão em 2017.

PU: Como estava a Universidade em termos orçamentários?

SV: Em termos orçamentários, recebi um orçamento com déficit de aproximadamente R$ 200 milhões. O orçamento herdado da gestão anterior não contemplava o pagamento do 13º salário daquele ano. Uma folha de pagamento da Unesp corresponde a cerca de R$ 175 milhões, incluindo os servidores ativos e os inativos.

PU: Diante desse deficit, como equacionar a questão?

SV: É uma questão de alta complexidade. Em 2017, como não houve crédito suplementar por excesso de arrecadação de ICMS –ao contrário, houve contingenciamento– não tínhamos orçamento para empenhar o 13º salário. Como dispúnhamos de uma reserva financeira de R$ 234 milhões na época, era um problema apenas de caráter orçamentário. A reserva era compatível com o pagamento do 13º salário. Importante salientar que, durante a nossa gestão, diminuímos a tendência de baixa da reserva financeira. Entre 2013 e 2016, caiu 70%; entre 2016 e 2018, caiu 44%. Isso só foi possível porque, além de um crescimento nominal da liberação financeira, houve contenção e redução de nossas despesas. Retomando, não dispúnhamos de orçamento para empenhar o 13º salário em 2017 e, desde o início da minha gestão, levei esse problema ao ex-governador Geraldo Alckmin e à sua equipe, mas não contamos com qualquer crédito suplementar extra-limite que pudesse contribuir para o reequilíbrio das contas da Universidade. Como disse anteriormente, é uma questão de alta complexidade.

PU: Por que o problema persistiu em 2018?

SV: Para 2018, pudemos construir um orçamento melhor, com 13 folhas de pagamento. Como dispúnhamos de reserva financeira, a decisão tomada foi a de pagar o 13º salário de 2017 no início de 2018 utilizando o orçamento de 2018. Ou seja, apenas postergamos o problema. Do ponto de vista financeiro, a decisão de honrar o pagamento do 13º salário dos estatutários, além de ter interrompido os processos de mandados de segurança, resultou no uso de cerca de R$ 126 milhões das nossas reservas financeiras, reduzidas a aproximadamente R$ 150 milhões ao final de 2018. Essa decisão foi tomada porque, ao longo de 2017, durante as audiências realizadas com o então vice-governador Márcio França, ele nos prometeu uma solução para o déficit orçamentário e financeiro da Unesp a partir do momento em que ele assumisse como governador, após a desincompatibilização do Geraldo Alckmin. Infelizmente, ele não cumpriu com a sua palavra e, dessa forma, o 13º salário dos servidores estatutários de 2018 não foi pago dentro do exercício fiscal.

PU: E como está a situação atual?

SV: Construímos um orçamento para 2019 com 13 folhas de pagamento e até poderíamos usar a mesma estratégia adotada em 2018, mas desta vez não dispomos mais de reserva financeira suficiente, que permita o pagamento do 13º salário de 2018 sem comprometer o pagamento de despesas correntes no segundo semestre de 2019. Os cerca de R$ 150 milhões de que dispomos em caixa formam nosso saldo financeiro bruto, sem descontar os restos a pagar. Assim, atingimos no final de 2018 um limite insustentável do nosso desequilíbrio orçamentário e financeiro e precisaremos contar com o apoio do governo do Estado na busca de uma solução. Se este apoio não se materializar ou a arrecadação prevista não se concretizar, terá de ocorrer necessariamente novos cortes de despesas, como indicou a nossa comissão de orçamento. 

PU: Neste ano, em ofício enviado ao governador João Doria, a Unesp expôs causas para este desequilíbrio orçamentário e financeiro. Poderia resumi-las?

SV: Uma delas foi a nossa expansão acentuada. Nos últimos 15 anos, a Unesp criou cerca de 50 cursos de graduação e nove câmpus universitários, em nove cidades diferentes, levando ensino superior de qualidade e contribuindo para o desenvolvimento de várias regiões do Estado de São Paulo. Mas os valores gastos nesse processo de expansão superaram, de forma significativa, o aporte recebido, principalmente no que se refere à contratação de pessoal. O modelo multicâmpus da Unesp é um complicador, pois implica uma série de despesas adicionais que universidades menos dispersas, como a USP e a Unicamp, não têm. Espero que o governador reconheça o papel que a Unesp desempenha na transformação e no desenvolvimento dos 24 municípios em que está presente.

PU: O senhor citou a demanda crescente por Permanência Estudantil. Qual é o custo social da inclusão na Universidade?

SV: Essa é outra causa que apontamos para o nosso desequilíbrio. O atual programa de inclusão da Unesp foi estabelecido em 2013 em razão de uma demanda do governo do Estado. Criamos uma porta de entrada independente para egressos de escolas públicas. Hoje, 50% das nossas vagas são oferecidas para alunos de escolas públicas e, dessas vagas, 35% são destinadas a pretos, pardos e indígenas. Conseqüentemente, vem ocorrendo um aumento expressivo na quantidade de estudantes com perfil de vulnerabilidade socioeconômica, o que exige a ampliação dos investimentos em programas para apoiar esses estudantes. Investimos cerca de R$ 70 milhões em Permanência Estudantil em 2018, um recorde na história da Unesp. Essa é uma parte importante hoje de nosso orçamento, atrelada a um investimento social que poderia ser assumido pelo governo estadual.

PU: O crescimento da folha dos inativos também é uma causa do desequilíbrio orçamentário e financeiro da Universidade?

SV: Sim, nossa insuficiência financeira, que é a diferença negativa entre os benefícios e as contribuições previdenciárias dos servidores, é a situação mais intensa, com grande impacto sobre nossas contas. Desde a criação da SPPrev, em 2007, os valores da insuficiência financeira vêm crescendo progressivamente e chegaram a R$ 700 milhões em 2018, o que representa 31% do total das liberações financeiras da cota-parte da Unesp. Esse não é um problema específico da Unesp, mas o número de inativos que permanecem na nossa folha é maior que aqueles da USP e da Unicamp. O crescimento da folha de inativos e a insuficiência financeira estão comprometendo a nossa capacidade de contratação de pessoal, impedindo portanto o crescimento da folha de ativos.

PU: Quantas vezes o senhor já pediu audiências e se reuniu para expor o problema da Unesp a secretários de Estado e governadores nesses dois anos como reitor?

SV: Inúmeras, perdi a conta. Mas não perco a fé nem a minha motivação para trabalhar. Mesmo que eu não usufrua dos benefícios de pôr as contas em ordem, quero que meus sucessores nunca mais passem por esta situação que estamos enfrentando. A Unesp merece um futuro mais sustentável.

PU: E como foi a última gestão nesse sentido, no último dia 17, com a secretária de Desenvolvimento Econômico Patrícia Ellen?

SV: Expusemos a ela a situação crítica em que a Unesp se encontra. Ela foi muito atenciosa e se mostrou uma pessoa aberta ao diálogo e disposta a contribuir na busca de solução para o problema. Apresentamos as possibilidades que vinham sendo tratadas com os governos anteriores: o crédito suplementar extra-limite, a antecipação de um duodécimo do orçamento atual e a antecipação de receita orçamentária. Demos à secretária um relatório com as economias que a Unesp tem feito e com as nossas propostas de reformas, planejadas para dar sustentabilidade à Universidade. Ela disse que trataria do assunto na Secretaria da Fazenda e Planejamento, na tentativa de ajudar a encontrar uma solução.