Naquele junho de 1968, a King Lanche do Gordinho, bem ao lado da Kibelanche do Aparício, se transformou em um entra-e-sai de jovens que embalados pela noite fria da cidade, aguardavam a chegada das 8h para realizar seus sonhos na brincadeira dançante marcada para o salão do Asilo de Mendicidade, na Avenida D. Pedro II. Era assim que essa gente jovem e bonita agitava a cidade emergente no coração do Estado.
Apresentação dos Atômicos na sede do Country Clube, às margens da Rodovia Washington Luís em 1968: Guitarra-solo – Aníbal Romano; Guitarra base – Cláudio Fachini; Gervásio dos Santos, na bateria; Nivaldo Dal Ri, piston e Hélio Ferrenha, guitarra-base
“Como no ano de 1967, tínhamos vários grupos musicais em Araraquara, influenciados pelo Programa Jovem Guarda levado ao ar aos domingos, pela TV Record, o amigo Cláudio Fachini resolveu formar mais um”.
É assim que Anibal Romano, hoje diretor de uma empresa de seguros na cidade, lembra dos momentos mais festivos que viveu em Araraquara e tudo por conta da música.
Agora, passados exatos 50 anos da história criada pelos Atômicos, um grupo formado exclusivamente por amigos que se encontravam na Avenida Djalma Dutra, n° 1.119, no bairro do Carmo, para a realização dos ensaios. É hora de revisar um tempo que não volta mais.
O Cláudio, diz Anibal, convidou a mim e mais três amigos – Hélio Ferrenha, Gervásio dos Santos e Nivaldo Dal Ri para ajudarmos na construção do conjunto e todos estavam dispostos em assumir naquele momento a carreira musical. Após algumas reuniões, definimos a participação de cada componente: Anibal, na guitarra-solo; Hélio, na guitarrabase; Gervásio, na bateria; Cláudio, no contra-baixo e Nivaldo, no piston, acentua Aníbal.
Estava assim formado o conjunto Os Atômicos, pronto para incendiar a cidade.
Em 1968, Anibal, Nivaldo, Hélio, Gervásio e Cláudio na formação inicial do grupo, em apresentação ocorrida na sede social da APCD, na Avenida Espanha entre as ruas São Bento e Padre Duarte
PROJETO ACABA AVANÇANDO
Só que havia um problema no meio do caminho: ninguém dispunha de recursos para aquisição dos discos que dariam origem ao repertório e tão pouco para a compra de uma guitarra-solo e bateria. É verdade que o conjunto em fase de montagem possuía uma guitarra, um contra-baixo e um piston, quando então o meu pai, diz Anibal, decidiu nos auxiliar e comprou a bateria e a guitarra para completar os instrumentos.
Os Atômicos a partir de agora, forçosamente eram obrigados a ouvir os programas das rádios locais – Cultura e Voz da Araraquarense, principalmente aqueles voltados para o estilo da época – Jovem Guarda – e que o grupo pretendia seguir em frente. Era um tempo dos conjuntos The Jet Blacks, The Clevers, The Jordans, Herb Alpert and Tijuana Brass e outros.
Os Atômicos animaram o reveillon do Clube 24 de Maio em Botucatu
O mundo parecia sorrir para os meninos atômicos em brincadeiras dançantes e domingueiras, além de bailes, festas de aniversários, quermesses, festivais de música e centros acadêmicos.
“Eu lembro que inicialmente o nosso grupo era instrumental, só que queríamos mais e passamos a procurar o cantor e o tecladista”, diz Anibal.
Nesta perigrinação na busca de melhorar a qualidade e o repertório, é que surgiu o Toninho Lavítola. Ele apareceu nos ensaios e apresentou o José Ronaldo Nakamoto (Nado), para um teste. “Ele foi aprovado e começamos a ensaiar”, comenta Anibal.
Mas ainda faltava o tecladista e para a euforia de todos, o Antonio Roberto Corrêa Borges (Fiico) aceita o convite que lhe fora feito, um dia antes. Os Atômicos que eram cinco na sua formação inicial, agora se transformam em sete amigos, definitivamente.
Atração musical da Festa Jovem no Líder Clube de Cabo Verde, em Minas Gerais
LEMBRANÇAS
“Lembro-me, com saudade, das domingueiras no Salão de Festas do Asilo de Mendicidade, Clube 22 de Agosto, Clube 27 de Outubro, Palmeiras da Vila, Nipo Brasileira na Avenida José Bonifácio, Salão da Usina Tamoio, Country Club ainda em formação e APCD”, afirma Aníbal.
Com a divulgação crescendo nas rádios e jornais da cidade, os Atômicos começaram a se apresentar nas cidades da região. Os convites vinham de todas as partes como Batatais, Botucatu, Cabo Verde (Minas), Gavião Peixoto, Nova Europa (Usina Santa Fé), Santa Lúcia, Rincão, Tabatinga (com a presença de Sérgio Reis que fazia sucesso com Coração de Papel). O mundo parecia então sorrir para eles.
Anibal Romano, Nivaldo Dal Ri e Cláudio Fachini – 50 anos depois
SAUDADES
“Em uma de nossas viagens, que foi para a cidade de Cabo Verde, Minas, transportados pela kombi do José Fernandes, amigo de todos, após o baile, que foi um sucesso, no retorno encontramos na rodovia, um porco que caíra de um caminhão. Trouxemos o porco e o nosso baterista Gervásio, que já tinha trabalhado em açougue, destrinchou e dividiu o animal entre nós”.
Outro caso que considero engraçado ocorreu após chegarmos de uma viagem e ao descarregarmos os instrumentos, fomos dormir. O nosso pistonista Nivaldo nos contou, no ensaio seguinte “que foi dormir só por volta de 7 horas da manhã, muito cansado”.
Ele, diz Aníbal, estava sozinho em casa, pois a esposa tinha viajado. Acabou por insistentes palmas no seu portão e ao atender, pensando em alguma coisa grave, abriu a porta e ouviu de um persistente garoto, “o senhor tem garrafas velhas para me dar? Imaginem o humor do Nivaldo, soltando os cachorros atrás do garoto…”
José Ronaldo Nakamoto (Nado), Antonio Roberto Corrêa Borges (Fiico) e Gervásio dos Santos
PONTO FINAL
Só que o grupo que trouxe tanta alegria para os jovens da época, em meados de 1969, devido aos afazeres particulares, e a exigência de maior dedicação, achou que estava na hora de parar. Foi triste porém a gente tinha que encontrar novos caminhos e aquilo que foi feito com tanto carinho, acabou se tornando apenas recordações, argumenta Anibal.
Hoje, meio século depois, cada um tem a sua vida: Cláudio é pecuarista em Palmas (Tocantins); Fiico é engenheiro civil; Hélio faleceu no ano 2000; Gervásio e Nivaldo são aposentados e eu (Aníbal) tenho a minha corretora de seguros (Romano Seguros); Nado também tem a sua corretora de seguros (Nakamoto Seguros): “Continuamos tocando juntos no grupo “Sweet Music”, finaliza Aníbal, participante de um período que não dá pra esquecer.