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O cabelereiro que tingia um dos ‘mamonas’ atende hoje em Araraquara

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Nelson com sua jaqueta exclusiva ao lado de quadro autografado

Uma notícia estampada nas manchetes dos jornais chocou o País numa manhã de domingo de 1996. No auge do sucesso, a banda Mamonas Assassinas desaparecia num trágico acidente aéreo quando voltava de um show em Brasília (DF).

O jatinho que transportava os integrantes do grupo de canções e performances irreverentes, chocou-se no fim da noite do dia 2 de março com a Serra da Cantareira, a poucos minutos do pouso em Guarulhos, cidade natal dos músicos.

Com apenas um álbum lançado, cujo título levava o nome da banda, os meninos humildes venderam mais de 2 milhões de cópias em semanas e se transformaram nos artistas preferidos do público adulto e infantil.

Mamonas 02Júlio cortando o cabelo no salão de Lima, em Guarulhos/SP

Influenciados pelo rock´n´roll, o Mamonas Assassinas nasceu em 1990 das cinzas do grupo Utopia. Alcançou o sucesso após a parceria com o produtor paulistano Rick Bonadio, que lapidou o som do grupo, trazendo diversas influências musicais/regionais, fora a consolidação de um humor ácido e direto, cheio de críticas sociais sutis. Assim nascia um dos maiores fenômenos comerciais do mercado fonográfico brasileiro.

Em cerca de 9 meses de carreira, o grupo fez 182 shows e participou de muitos programas de televisão. O quinteto já se preparava para a sua primeira turnê internacional. O próximo pouso seria em Portugal. Seria.

E uma das mais curiosas e famosas lendas envolvendo a morte dos Mamonas Assassinas vai ao encontro da premonição do tecladista e vocalista Júlio Rasec (Júlio Cesar Barbosa) que, poucas horas antes confessava, em vídeo, um sonho envolvendo o acidente. “Não sei. Esta noite sonhei com um negócio assim. Parece que o avião caia. Não sei”, disse o jovem, à época, com 28 anos.

O responsável por registrar o material foi seu cabeleireiro de confiança, Nelson Lima, 56, que atende hoje em um salão montado no bairro do Vale do Sol, em Araraquara. Lá, ele nos recebeu e contou com detalhes essa história, que ganhou o Brasil.

Mamonas 03O único CD lançado pelo grupo

“O Júlio era meu cliente desde os 12 anos de idade. Depois que ficou famoso, continuava a vir, só que quinzenalmente, mais ou menos. Tudo virava uma bagunça, porque muita gente vinha pedir autógrafo e conversar com ele, sempre muito atencioso com todo mundo”, conta Lima.

E para registrar esses momentos, Nelson Lima resolveu comprar uma câmera de vídeo e foi justo nela que gravou a fatídica premonição. “Como sabia que eles iriam para Portugal, pedi que ele contasse alguma piada de português. Ele contou e saiu do quadro, mas logo voltou e proferiu o sonho”, revela.

Ao ficar sabendo da tragédia, o cabeleireiro sabia que tinha um material importante em mãos, afinal a comoção no Brasil era geral e muito intensa. Assim, ele tentou contato com SBT e Rede Manchete, sempre tratado como louco, segundo ele.

Sua melhor recepção foi na Rede Globo, que mostrou interesse, porém com certa descofiança. E foi durante o velório dos Mamonas que Lima cruzou com o repórter Caco Barcellos. Ciente do material, Barcellos pediu para assistir a fita e, ao comprovar que não era fraude, entrou em contato com a produção da emissora. “O vídeo acabou rodando muito. Eu tive, inclusive, alguns problemas por direitos autorais, que me fizeram até abrir processos. Tenho esse VHS ainda comigo, mas penso em passar para algum fã dos Mamonas. Meus filhos não ligam, então tenho medo que o material se perca de vez”, lamenta.

MUITA AMIZADE

O acervo de itens de Nelson Lima vai muito além de uma fita de vídeo. Sua coleção, recebida do próprio Júlio Rasec, inclui CDs, diversas revistas e jornais, ingressos para shows, jaquetas exclusivas e, talvez, a peça mais curiosa: cachos vermelhos do cabelo do músico, guardados em um pote.

“Nós escolhemos juntos essa cor, algo misturando laranja, rosa e vermelho. O Júlio queria ficar diferente no palco. Realmente ficou. E ele só deixava que eu fizesse os retoques. As tinturas que usávamos, eu ainda guardo comigo. Para prestar uma homenagem, batizei um dos meus filhos de Júlio Rasec Sparapan Lima. Ele nasceu 1 ano e quatro dias após o acidente”, revela.

A relação de Nelson com Júlio Rasec (César, ao contrário) estende-se à família, principalmente ao pai do músico, Júlio Cesar Barbosa. Ele também frequentava seu salão. Até hoje, ambos têm contato. Com autorização dele, o cabeleireiro usa uma mamona no nome de seu estabelecimento.

Mamonas 04O salão no Vale do Sol com a logo autorizada dos Mamonas

“Certa vez, o Júlio trouxe a banda toda aqui: o Dinho, o Bento Hinoto e os dois irmãos Reoli, Sérgio e Samuel. Imagina como ficou o lugar? A simplicidade deles era grande. Lamento só não ter conversado mais com eles, justamente por conta desses tumultos”, brinca.

Técnico em eletrônica e torcedor do São Paulo, Júlio Rasec foi o último a entrar para banda. Isso ocorreu por intermédio de Dinho, que já era seu amigo. Começou como roadie do Utopia, grupo pré-Mamonas, onde também tocou teclado.

Junto com Dinho era o principal compositor dos Mamonas Assassinas. Além de tecladista, Júlio também fazia vocal em algumas músicas. Interpretava Maria em ‘Vira-Vira’ e, nas apresentações ao vivo, cantava ‘Sábado de Sol’ e ‘Sabão Crá Crá’. também imitava o cantor Belchior em ‘Uma Arlinda Mulher’.

Mamonas 05Nelson e o filho Júlio Rasec Lima, uma homenagem ao mamona