
Ao sol do meio-dia os olhos mal se abrem, porém nas mãos está a riqueza do homem do campo, preparado para colocar na mesa do consumidor o produto de qualidade que ele vê nascer com tamanho orgulho.
Nesta edição, a Revista Comércio Indústria e Agronegócio em parceria com o Sindicato Rural de Araraquara, vai ao campo para contar parte da história de trabalhadores rurais que trabalham de segunda a segunda, faça chuva, sol ou geada para entregar aos araraquarenses produtos sempre fresquinhos e livres de agrotóxicos. Conversamos com gente simples, porém
orgulhosa em tirar o sustento da enxada cravada na terra.
Como uma tela bem colorida pintada no estilo näif (arte produzida sem preparação acadêmica que faz referência direta ao campo), ou mesmo um poema escrito em um papel de pão com uma caneta velha, a vida de um produtor rural carrega sim seu lado romântico: o som do silêncio, o cheiro da mata, a noite iluminada pelas estrelas.
Muito mais bucólico e forte que tudo isso está o esforço representado por cada gota de suor derramada na terra; o trabalho em uma madrugada fria e um turno de segunda a segunda para garantir o sustento da casa e também o alimento saudável no prato de tantas outras famílias, que optam por produtos cada vez mais naturais, distantes do intenso uso de agrotóxicos.
ONDE FOMOS
Tendência mundial, em Araraquara e região essa cultura é extremamente presente devido a sua alta quantidade de trabalhadores rurais que, em seus sítios, alimentam os varejões e supermercados da cidade, além de participar de feiras, levando frutas e hortaliças frescas para o araraquarense que busca um equilíbrio alimentar.
A reportagem da Revista Comércio Indústria e Agronegócio fez um giro por todo o Assentamento Monte Alegre para identificar algumas dessas famílias. Para chegar nesse pessoal, contamos com a ajuda de Carlos César Rocha Silva, da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp), que conhece, há décadas, cada via daquele espaço, cercado por muito verde em contraste com o vermelho do chão batido.
Por lá, talvez a história mais conhecida é do clã Xavier, liderado pelo patriarca João Joaquim Xavier, que chegou na Região após deixar o Mato Grosso no fim da década de 70. Ele ficou conhecido em toda a região do Monte Alegre como João da Horta, tamanha era sua disposição em plantar verduras. Em 1996, ao lado dos filhos Aparecido Domingos Xavier, vulgo Cido e Luis Xavier, passaram a comandar praticamente uma fazenda no Assentamento Monte Alegre V. Hoje, tornaram-se referência de sucesso, sendo exemplo de conquista para os outros assentados.
Em uma área com mais de 2 alqueires, Cido, o principal responsável pela produção, planta diversos tipos de hortaliças em duas grandes estufas – com destaque para alfaces hidropônicas, além de abacaxi (com mais de 60 mil mudas por safra) e milho. “Por aqui também temos eucaliptos e seringueiras. Fui pioneiro neste assunto dentro do Assentamento”, diz Cido, de 53 anos.
Ao seu lado, no dia a dia de batalha, estão sua mulher Renata, os filhos Gabriel e Mateus (futuro engenheiro agrônomo) e o sobrinho Tiago. “Fazemos feiras em Matão e Araraquara, sendo Araraquara nosso maior consumo. Tenho orgulho de tudo que conquistei e fico ainda mais feliz em saber que meus filhos entenderam toda a batalha de nossa família, dando sequência a ela”, diz Cido.
Além dos familiares, outro grande parceiro de Cido na batalha diária é Carlos Alberto Vieira, o Carlinhos, cuja fazenda fica, há mais de 20 anos, no Assentamento Monte Alegre III. Pai da Daiane e Beatriz, ele trabalha ao lado do irmão Fernando Vieira para plantar abacaxi, milho, maracujá, limão e hortaliças diversas. No fundo, ele também tem um tanque onde cria tilápias. “Cido e eu trabalhamos juntos há 12 anos. Conhecemo-nos no Assentamento e hoje dividimos o trabalho. Sonhamos com a criação de uma cooperativa. Sei que vamos conseguir”, diz Carlinhos.
ORGULHOSO EM MOSTRAR
‘Para eu começar a suar, preciso de no mínimo duas horas embaixo do sol’. Foi com esta brincadeira que ‘seo’ Alcenir Arlindo, de 66 anos, abordou o jornalista que vos escreve (que sofria sob um sol antes nunca encarado) – enquanto estávamos a caminho do Assentamento Monte Alegre III.
Simpático, ele rapidamente nos mostrou seu sítio, do qual se orgulha em dizer: sempre trabalhei sozinho. Com cinco filhos espalhados pelo país, ele mora hoje apenas com Luana, que estuda Agronomia.
Residindo numa casa simples desde 1989, ele faz sua colheita e a vende sem a ajuda de ninguém em feiras duas vezes por semana em Matão. Como novidade em sua terra, ele cultiva coco e também vagem de metro. “Aqui quero morrer, no meu sítio”, finaliza Alcenir.