Ele sentiu o desejo de fazer rir desde o momento em que viu em seu sobrinho e seus amigos, o sorriso fácil e inocente das crianças
Texto: Jean Cazellotto
Jairo com alguns acessórios do seu personagem e, ao fundo, o ônibus Tirico Tico, companheiro de todas as viagens
Eram 9 horas da manhã. Sol entre nuvens e um dia agradável – nem muito calor, nem muito frio. Segui para o endereço que foi passado para mim no dia anterior depois de um breve bate-papo. Cheguei em frente a um portão simples com muros azuis. Apertei o interfone e uma jovem senhora me atendeu pelo aparelho. Identifiquei-me e passei a olhar os pinheiros – esses plantados do lado de fora – e as palmeiras que estavam em seu quintal. Mais de dez metros de altura, com certeza, e aquilo me fascinou por alguns instantes.
Ao abrir o portão, Jairo Garófalo, o eterno Tiririca. Com um aperto de mão firme, ele me cumprimentou e entrei. O espaço é enorme. E ao fundo, um barracão ainda maior. Quando entrei ali, mergulhei nas lembranças da infância enquanto ele me apresentava o espaço. Inúmeros itens que “gritavam” em um gesto de comemoração de como foi bom estar ao seu lado durante mais de 35 anos de carreira.
Um ônibus, o Tirico Tico, uma Kombi, um carro e milhares de objetos que foram companheiros do Tiririca me saltavam aos olhos graciosamente. Entramos em seu escritório, um pequeno espaço no canto do galpão. Ali começamos a conversar.
“Vamos iniciar aos moldes jornalísticos”, disse Jairo, depois de tantas entrevistas. “Meu nome é Jairo Garófalo, tenho 61 anos, sou casado com Elizabete com quem tive duas filhas, Mariana, a mais velha e que mora em São Paulo e Jordana, que trabalha em uma escola infantil e vive comigo”, disse com um brilho nos olhos ao falar das filhas. “Ah, tem a neta também, de quatro anos, filha da Mariana”. Nesse momento, o sorriso mostrou toda a história de felicidade dessa família.
“Comecei por acaso, quando tinha mais ou menos 22 anos, com meu sobrinho Denis. Um dia minha cunhada fez uma festinha pra ele e me chamou pra brincar com as crianças. Eu improvisei uma fantasia de carnaval, o nariz de palhaço que ela já tinha feito, e fui. Descobri nesse instante que o riso de uma criança era a melhor coisa que tinha. Descobri que era fácil entretê-los. A partir desse momento, vivi o palhaço dentro de mim”.
Questionei sobre o nome artístico. Ele disse que havia um conhecido que era apelidado de Tiririca e os amigos começaram o chamar assim também. “Eu não gostei, tentei outros nomes, mas quando cheguei a uma festa com meu Fusca, as crianças vieram me receber gritando ‘o Tiririca chegou’. Deixei assim porque já havia pegado”.
“No início, eu me oferecia para alegrar as festas dos filhos dos meus amigos. Eu trabalhava em uma multinacional em Araraquara e estava bem financeiramente, mas me vestir de palhaço era o que me deixava feliz. Depois de quatro anos, a empresa me mandou embora e pude viver o Tiririca 100% do meu tempo. Eram eventos de segunda a segunda. Durante a semana íamos em escolas e no final de semana fazia festas infantis. E não era uma, não. Eu cheguei a fazer cinco festas em um sábado”.
“Todas as minhas brincadeiras e palhaçadas envolvia sempre algo educativo. Fiz uma parceria com a CPFL e visitamos mais de 60 cidades durante dois anos de projeto, incentivando as crianças a não desperdiçarem energia elétrica. As escolas vencedoras em cada município recebiam o circo”, relembrou.
É hora de agradecer: Jairo reconhece o trabalho de todos e tem profunda gratidão por cada objeto que levou com o Tiririca durante todos os anos de carreira
FAMÍLIA
“Minhas filhas me acompanhavam, fizeram muitos espetáculos comigo, a Bete, minha esposa, deixava tudo organizado e comandava a turma enquanto brincava com as crianças. Para mim foi sempre isso, enquanto estava vestido de palhaço, eu apenas brincava. A hora de trabalhar era enquanto arrumava algum novo equipamento ou montava um novo espetáculo. Minha cabeça não parava de criar. Meu trabalho sempre foi criar e improvisar”.
Os tempos mudaram, isso todos nós sabemos. Mas ele sentiu bem próximo como a evolução na educação das crianças o afetou. “Hoje não faço mais festas infantis. Não tenho mais a agilidade de antes e devo aceitar isso. Faço alguns espetáculos, geralmente na semana que antecede o Dia das Crianças e Papai Noel, que virou uma tradição também, mas apenas entregando presentes na noite anterior à Ceia”.
SURPRESAS
Jairo, com orgulho, disse sobre as surpresas que sua carreira lhe trouxe. Entre uma delas, com um sorriso estampado no rosto, me disse “eu fiz três casamentos”. Espantei-me com a colocação e quis saber mais sobre. “Eu fui dançar com a Maisena (dança com a boneca em tamanho de humano, ao estilo ‘nega maluca’) em três casamentos. Isso me exigiu uma preparação a mais por conta da idade. Ela é muito ágil”, indagou aos risos.
“Foram casamentos de mulheres que eu fiz as festas quando eram crianças. Uma delas foi surpresa até para os convidados. Ter participado da vida dessas pessoas, pra mim, foi como fechar um ciclo. Hoje vivo com as lembranças e me sinto extremamente agradecido a todos que ao longo do tempo estiveram carinhosamente envolvidos na minha vida”.
Tiririca, em meados da década de 90, pronto para entrar no palco e fazer a alegria da criançada