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O voto: exercício da cidadania.

Por Tiago Romano

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O voto não é uma obrigação do cidadão e sim um direito, conquistado com muito esforço e lutas democráticas. O cidadão deve se sentir orgulhoso de poder ir até uma urna eleitoral livremente sem sofrer violência física ou moral, bem como ter sua vida ceifada como acontece ainda em vários países que não conhecem o Estado Democrático de Direito, pelo simples fato de ser apoiador ou opositor de determinado candidato.

Verifiquei com muita preocupação ao conversar com a população o desinteresse ou mesmo a convicta afirmação de que o exercício democrático do voto era desnecessário e que não davam valor a esse direito, pior ainda tratando o ato de votar como obrigação penosa e desagradável. Mais preocupação ainda porque no meu mister de Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de Araraquara converso com pessoas simples desde um cidadão egresso do sistema prisional que busca uma informação na Casa da Advocacia e Cidadania de como proceder para dirigir-se até o fórum e assinar o seu termo mensal de comparecimento do cumprimento de pena no regime aberto até pessoas diplomadas com pós-doutorado, pessoas que viajaram o mundo todo e o mesmo discurso constante causou a preocupação. Me preocupa a forma como é displicente a negativa ao voto.

Vivemos na plenitude de uma democracia onde é possível criticar os mandatários públicos, sem ser preso, torturado ou morto. Nesse compasso a Sociedade Civil deve se conscientizar que não há mecanismo melhor que a Democracia, e esta somente será efetivada se o cidadão se conscientizar da importância do exercício da cidadania e do voto popular.

Apenas para relembrar vou rememorar alguns dados e fatos importantes da história do Brasil e da conquista popular do voto.

No dia 23 de janeiro de 1532 o Brasil conheceu pela primeira vez o direito de voto, onde dados históricos relatam que, os moradores da primeira vila fundada na colônia portuguesa de São Vicente foram às urnas para eleger o Conselho Municipal. A votação foi indireta: o povo elegeu seis representantes, que, em seguida, escolheram os Oficiais do Conselho. Já naquela época, era proibida a presença de autoridades do Reino nos locais de votação, para evitar que, os eleitores fossem intimidados.

Em 1821 as pessoas deixaram de votar apenas em âmbito municipal. Na falta de uma lei eleitoral nacional, foram observados os dispositivos da Constituição espanhola para eleger 72 representantes junto à Corte Portuguesa. Os eleitores eram os homens livres e, diferentemente de outras épocas da história do Brasil, os analfabetos também podiam votar. Os partidos políticos não existiam e o voto não era secreto.

Com a independência do Brasil, foi elaborada a primeira legislação eleitoral brasileira, por ordem de Dom Pedro I. Essa lei seria utilizada na eleição da Assembleia Geral Constituinte de 1824.

Os períodos colonial e imperial foram marcados pelo chamado voto censitário e por episódios frequentes de fraudes eleitorais. Havia, por exemplo, o voto por procuração, no qual o eleitor transferia seu direito de voto para outra pessoa. Também não existia título de eleitor e as pessoas eram identificadas pelos integrantes da Mesa Apuradora e por testemunhas. Assim, as votações contabilizavam nomes de pessoas mortas, crianças e moradores de outros municípios. Somente em 1842 foi proibido o voto por procuração.

Em 1855, o voto distrital também foi vetado, mas essa lei acabou revogada diante da reação negativa da classe política. Outra lei estabeleceu que, as autoridades deveriam deixar seus cargos seis meses antes do pleito e que, deveriam ser eleitos três deputados por distrito eleitoral. Em mais uma medida moralizadora, o título de eleitor foi instituído em 1881, por meio da chamada Lei Saraiva.

Depois da Proclamação da República, em 1889, o voto ainda não era direito de todos. Menores de 21 anos, mulheres, analfabetos, mendigos, soldados rasos, indígenas e integrantes do clero estavam impedidos de votar, somente sendo igual a todos em décadas recentes.

Nossa Constituição Federal promulgada em 05 de outubro de 1988 garante o voto a todos e a todas de forma democrática, razão pela qual o voto é uma missão de cidadania, um mister público destinado ao cidadão, não podendo ser encarado como uma obrigação.

Poderia relatar fatos históricos e vários outros episódios de lutas pelo direito ao voto, mas o importante é conscientizar a população a exercer o seu direito de forma livre, ética, seguindo o fruto de seu coração, sem qualquer interferência espúria de práticas eleitorais criminosas.

Em suma o voto não é uma obrigação do cidadão é um direito garantido constitucionalmente e que visa proteger a democracia que rege a nossa Sociedade Civil e o seu não exercício fatalmente culminará tempos sombrios à civilização.

* Tiago Romano, é presidente da OAB de Araraquara

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