As discussões sobre a Reforma Tributária vêm se arrastando por muitos anos, mas, agora, parece que finalmente se chegou a um consenso sobre a necessidade de sua realização e, inclusive, existem propostas que vem servindo de base para exame do Congresso.
Na Câmara dos Deputados, tramita a PEC 45/2019 e no Senado a PEC 110/18 que, embora tenham alguns pontos em comum, apresentam diferenças significativas que tornam difícil a conciliação dos dois textos.
Falta ainda a proposta do governo, apresentada informalmente e parcialmente pelo Secretário da Receita Federal e que, segundo ele, deverá ser depois acoplada à proposta do Congresso que estiver mais adiantada.
Adicionalmente existe um texto alternativo às PECs 45 e 110, que se propõe a ser uma proposta aglutinadora, mas que ainda não foi encampada por qualquer membro do Congresso, além de inúmeras sugestões de emenda às propostas que tramitam na Câmara e no Senado, visando defender setores específicos, mas que contrariam a lógica que norteou a elaboração das mesmas, e que ainda não foram acolhidas pelos congressistas.
A PEC 45/19 foi elaborada a partir de proposta do Centro de Cidadania Fiscal e se baseia na substituição e cinco tributos- IPI, ICMS, ISS, PIS e COFINS em um único imposto, o IBS, que atingiria todos os bens e serviços, com alíquota e legislação uniforme em todo território nacional, mas sem retirar a autonomia tributária dos estados e municípios. Reconhecendo que a realização da Reforma Tributária é urgente para alavancar a economia brasileira, a exposição de motivos define os princípios nos quais se assenta, a saber: simplicidade, neutralidade, equidade e transparência. Assegura ainda que não haverá aumento da carga tributária.
A multiplicidade de objetivos obrigou a que fossem sacrificados os princípios, além de retirar o sentimento de urgência para desburocratizar a legislação tributária, uma vez que foi estabelecido um período de transição que não apenas posterga a simplificação (dez anos), como aumenta nesse prazo as obrigações acessórias para as empresas. A neutralidade pretendida é afetada na medida em que o Setor Serviços sofre aumento significativo da tributação. Em nome da equidade, aumenta-se fortemente a regressividade do sistema tributário, procurando compensar alguns segmentos sociais via bônus financeiro, em mais um aumento da burocracia.
Uma crítica que se faz, com razão, é a de que a Constituição brasileira á muito detalhista e dificulta a realização de reformas modernizantes de uma forma geral, vide Previdência, o que se aplica também ao sistema tributário, pois qualquer alteração em sua sistemática só pode ser feita por emenda constitucional. Quando surge uma oportunidade de se mexer na Constituição, deixando na Carta apenas os princípios gerais, remetendo para a Lei Complementar e legislação ordinária os detalhes, de forma a ser mais fácil qualquer adaptação à evolução da tecnologia e do mundo dos negócios, a PEC 45/19 vai no sentido inverso, alterando 121 itens da Constituição, descendo a detalhes sobre matérias que deveriam ser facilmente alteradas, como os fundos de transferências. Com a expansão da economia digital, das telecomunicações e da globalização do setor serviços é preciso ter flexibilidade para poder tributar essa nova realidade, o que não está contemplado na PEC 45/19.
O objetivo de alíquota única, apresentado como grande fator de simplificação, não se sustenta na medida em que estados e municípios poderão alterar suas alíquotas, o que compromete também a promessa de não aumento da carga tributária. Um ponto pouco debatido dessa proposta é sobre o efeito do forte aumento da tributação do setor serviços na taxa de inflação, ao atingir itens como alimentos, saúde, educação e habitação e, também o impacto sobre o emprego e a formalidade dos trabalhadores.
Em conclusão, considero que a PEC 45/19 apresenta uma estrutura consistente e calcada na experiência internacional, mas que se perdeu pela multiplicidade de objetivos, muitos conflitantes e que não levou em consideração a realidade da economia brasileira. Me parece que não será possível aperfeiçoas a Emenda Constitucional sem abandonar seus princípios e objetivos.
*Marcel Solimeo, é economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo
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