Poucos lugares têm sido palco de inovações tecnológicas com aplicação tão efetiva quanto o campo. Nesta realidade, o Brasil se destaca, principalmente no que diz respeito a sua principal commodity agrícola, a soja. Prova disso é que desde a safra 1976/77 – quando o país começou a quantificar a produção – até o ciclo 2020/21, o número de oleaginosa colhida aumentou 11 vezes, enquanto a área plantada teve incremento de apenas 5,6.
Isso porque, neste período, a produtividade média mais do que dobrou, partindo de 1.748 kg por hectare (29,1 sacas) para 3.525 kg/ha (58,7 sacas), de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Além de pesquisa focada em novas cultivares resistentes, é inegável que técnicas de manejo cada vez mais bem-sucedidas, como a pulverização de defensivos direcionada à planta, foram fatores que contribuíram para o êxito do grão dourado em solo nacional.
Desta forma, partindo dos pulverizadores costais, que permitem cobertura em apenas 0,1 hectare por hora, e indo para os autopropelidos atuais com barras de quase 40 metros e que, no mesmo intervalo de tempo, possibilitam a aplicação de produto em cerca de 70 hectares, muita coisa está mudando em relação à atividade em terrenos acidentados que não permitem a entrada de grandes máquinas. Um exemplo é o ingresso massivo dos Veículos Aéreos Não Tripulados (Vants) na agricultura, os populares drones. Apesar da limitação da bateria dos modelos atuais, cuja duração não ultrapassa dez minutos, esses equipamentos são capazes de pulverizar – dependendo dos obstáculos e relevo do terreno e do vento – até três hectares por voo, chegando a seis hectares por hora.
Assim, parece claro que dispositivos voadores não têm a capacidade de substituir os autopropelidos e, sim, complementar o serviço deles. Tanto isso é verdade que empresas tradicionais de maquinários consultadas pelo Projeto Soja Brasil durante a Expodireto Cotrijal 2022 aventaram a possibilidade de incorporar drones em suas estratégias de negócio em um futuro próximo.
Pelo preço do equipamento, que hoje pode alcançar até R$ 300 mil, o uso a partir de prestadores de serviço já é realidade consolidada. Mas quanto custa ao produtor contratar essas aplicações? Segundo a sócia e pilota da PlanejAr, Jéssica Freitas, o preço varia de 120 a 140 reais por hectare. “Em algumas culturas, como na batata, o valor por hectare é mais alto porque é preciso aumentar um pouco a vazão para ter mais molhamento foliar. Trata-se de uma cultura extremamente sensível a doenças e a cada três, quatro dias é preciso entrar na lavoura para fazer aplicação, mas na soja e de forma geral, o custo é esse”, explica.
Ela opera um modelo T30, com capacidade de 30 litros ou 32 kg (pela capacidade de acoplar distribuidor de sólidos), da DJI. O equipamento pesa cerca de 70 kg, considerando a calda e a bateria. “Há a possibilidade de trabalhar com mais de um drone em um mesmo controle, mas existem restrições legislativas no Brasil quanto a isso”, lembra.
Quem também detalha o processo é o pesquisador da Embrapa Instrumentação, Lúcio André de Castro Jorge. “Considerando o trabalho de ir com o drone até o ponto correto, jogar o fertilizante, voltar, carregar com mais produto e recarregar a bateria, um equipamento desses tem rendimento médio de 35 a 40 hectares por dia. Esse número não é maior, obviamente, porque a pulverização precisa obedecer certos horários do dia e condições climáticas para acontecer”, contextualiza.
E os dados mostram que o produtor parece já ter entendido que os veículos aéreos não tripulados podem ser mais uma ferramenta à disposição em seu planejamento de lavoura. “Fizemos uma pesquisa pela Embrapa em 2020 em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Sebrae com mais de mil entrevistados, entre produtores e prestadores de serviço, sobre o uso de tecnologias digitais no campo. Esse levantamento apontou que 59% dos produtores usavam drones”, afirma o pesquisador.
VANTAGENS E LIMITAÇÕES
Jéssica conta que apesar de a duração da bateria ser um fator limitante à operação, os modelos em uso atualmente evoluíram frente aos primeiros que eram adotados na agricultura. “Em relação aos equipamentos de gerações anteriores, já tivemos melhoras, pois as baterias atuais carregam muito mais rápido. O T20, por exemplo, que é o anterior ao que usamos hoje, tinha bateria com 600 ciclos, carregava em cerca de 15 a 20 minutos e esquentava muito. Conseguíamos fazer de 0,8 a 1,8 hectares com ele e precisávamos de seis baterias. Já no T30 são só três baterias”, detalha.
De acordo com ela, já é comum encontrar produtores que utilizam Vants em áreas completas, desde as primeiras aplicações à dessecação. “A aplicação por drones exige um pouco mais de técnica, mas dá mais resultado porque se tem menos perdas com amassamento. Por isso, o aumento de produtividade pode ser até 10% superior”.
Na esteira da evolução do equipamento, a sócia e pilota da PlanejAr afirma que há previsão do modelo T40 chegar ao Brasil ainda em 2022. “Ainda há muitos rumores a respeito dele, mas já se fala em uma grande melhoria em relação à autonomia, visto que do T20 para o T30 houve um grande avanço”.
A nova geração deste drone já aparece em pré-venda no site da DJI. A versão mais básica é encontrada a partir de R$ 245 mil (sem dispenser de sólidos e gerador) e, conforme as informações técnicas, sua bateria carrega totalmente em nove minutos e o equipamento tem cargas de pulverização de até 40 kg, com largura de aplicação de 11 metros. COMO
O DRONE EVITA A DERIVA
Um produtor de soja de Água Boa, Mato Grosso, ouvido pelo Projeto Soja Brasil durante a Expodireto contou que utiliza drone na lavoura em áreas específicas porque o equipamento não depende de condições de solo para operar. Além disso, na rotação com o milho, uma cultura de grande porte, onde um autopropelido não tem condições de adentrar, o Vant se adapta melhor.
Jéssica afirma que é justamente nestes casos em que uma revolução está em curso. “Grandes produtores de milho conseguem contratar o serviço de pulverização aérea com avião, mas, mesmo assim, ela é limitada a algumas áreas. Por isso, o drone tem entrado como uma importante ferramenta em áreas menores, assistindo também o pequeno produtor”, explica.
Uma das principais dúvidas quanto à aplicação por Vants é o risco de deriva, ou seja, quando a trajetória da gota é desviada durante a aplicação de um defensivo, fazendo com que o produto não atinja a cultura desejada. “Para diminuir essa questão, trabalhamos com pontas de pulverização com vazão um pouco maior. Quanto ao drone, o vento que sai das hélices faz o efeito vortex, que empurra o produto para baixo, o que ajuda a reduzir o problema. Além disso, evitamos aplicar em condições de muito vento para diminuir parâmetros de deriva”, conta Jéssica.