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E as policias em SP continuam escravizadas!

Por Wagner Tadeu Silva Prado

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Logo pela manhã de hoje (13), vi a notícia que o governador João Agripino Doria sancionou Lei Complementar para que os policiais civis também realizem a chamada Atividade Delegada, no mesmo molde que os policiais militares já fazem junto a diversos municípios do Estado de São Paulo.

A matéria retrata que, após a regulamentação que ainda será feita pelo Executivo, os policiais civis poderão trabalhar, em suas horas de folga, em atividades que são de competência do município. A principal delas é a fiscalização de ambulantes (comércio irregular), dentre outras.

E mais uma vez notamos que a segurança pública em São Paulo permanece aos frangalhos. Tanto a Polícia Militar como a Polícia Civil têm os piores salários do Brasil. Esses “penduricalhos” que encampam o chamado “bico oficial” acabam, literalmente, “escravizando” os profissionais da segurança pública. Ao terem os piores salários do país, boa parte dos PM se sujeita à atividade delegada e à DEJEM (Diária Especial por Jornada Extraordinária de Trabalho Policial Militar), outro penduricalho. Na Civil, o nome é DEJEC, criada em 2016.

Essa prática faz com que aqueles que trabalham no regime de 12 horas de serviço por 36 de descanso, por exemplo, tendo, portanto, 15 dias de folga no mês, usem até 10 dessas folgas para exercício da DEJEM. E, ainda, podem usar o restante dos 5 dias para a Delegada. Esse excesso de trabalho sobrecarrega o profissional e acarreta inúmeros problemas de ordem física e psíquica.

Confesso que quando a DEJEM e Atividade Delegada foram autorizadas, ainda quando eu ocupava o posto de major, aplaudi a iniciativa, pois foi uma forma encontrada de tirar o policial militar dos famosos “bicos” nas portas de padarias, postos de combustíveis, farmácias, supermercados, dentre outros, cujos riscos de morte são iminentes, já que o PM trabalha sozinho, sem rádio comunicador, sem colete, ou seja, expondo sua vida a enorme risco. Vi alguns PM sendo mortos na folga nessas condições.

Após quase uma década da DEJEM em curso, hoje penso totalmente diferente. E os motivos são óbvios. Como já dito, ganhando bem mal, o PM se sujeita a trabalhar nas horas de folga para complementar sua renda, a fim de colocar comida na mesa, pagar suas contas e dar um pouco de dignidade à sua família. Mas o estresse gerado pelo acumulo de horas no trabalho tem provocado suicídios, divórcios, fadiga, depressão e outras doenças, especialmente de ordem psicoemocional. E essa sobrecarga pode acarretar a fadiga no trabalho exercido em suas horas normais de trabalho também, colocando em risco sua vida em ações de confronto, em face do cansaço apresentado.

Sem contar que, além da DEJEM e Delegada, muitos ainda se sujeitam aos antigos “bicos”, trabalhando praticamente o mês todo entre 8 a 18 horas diárias.

O que nossos policiais realmente necessitam é receber um salário melhor e digno, como já prometeu inúmeras vezes o atual governador Doria. Inclusive, que seríamos a segunda polícia mais bem paga no país, grande sonho de todos nós que cada dia mais se esvai pelo ralo. Finalizando, lembro que esses “penduricalhos” não incorporam ao salário e quando você, policial militar ou civil, “aposentar”, ficarão em situação financeira ainda pior.

(*) Wagner Tadeu Silva Prado é Coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP); bacharel, mestre e doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública; bacharel em Direito; especialista em Gestão de Segurança Pública e Justiça Criminal pela Universidade de São Paulo (USP) e Tesoureiro Geral da Associação Defenda PM.

Fonte:
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2022/01/doria-autoriza-policiais-civis-a-aderirem-a-bico-oficial-que-era-exclusivo-dos-pms.shtml