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No jogo da vida perdemos Valdemar Verri

Por Ivan Roberto Peroni

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A morte do “seo Valdemar” e era assim que nós o chamávamos nos anos 90, nos fez nesta quarta-feira dar um mergulho no passado. Nele, Valdemar Verri, existia dentro dos passos lentos do seu caminhar o corpo alto, esguio, silencioso que me conduzia constantemente a pensar como poderia ser ele técnico de futebol? Normalmente, treinador de futebol, salta, esbraveja, solta os gritos que até combinam com a correria da molecada. Mas, Valdemar não. Como na música, era o “pacato cidadão”.

Sua sina de professor da bola ao longo do tempo foi de vitórias, derrotas e empates, não mais que isso, desde que para sua carreira não se contabilizassem os “wo” que seriam os jogos marcados mas não realizados se os adversários não aparecessem para jogar. WO é a sigla para a palavra em inglês walkover, que traduzido para a língua portuguesa significa “vitória fácil”.

Mas para Valdemar Verri, talvez seja este então o único jogo, que é o da vida, que não vai estar presente pois alguém o tirou de nós. Tivemos que aceitar sua ausência. Ele não está aqui.

E era este um momento importante, precisávamos dele, afinal como soldado que também foi na sua carreira profissional Valdemar por nós seria convocado para ser o general a comandar no front a tropa de ontem, meninos ainda, hoje cidadãos formados, que de crianças correndo atrás das vitórias se tornaram homens, pais de famílias, amigos e companheiros prontos para enfrentar essa tal de pandemia, a mesma que o pegou desprevenido para leva-lo embora.

Não faz tanto tempo assim. Vi o “seo Valdemar” sentado do lado de fora do Bar do Divur no Vale do Sol, sozinho, como também fora sozinho a lutar pela sobrevivência do seu time de futebol nos tempos da Drogaria Cervan e do próprio Vale do Sol. Contava-se nos dedos o tamanho da ajuda. Mas para ele, o que vinha era o que dava para pagar a lavagem das camisas, calções e meias entre um jogo e outro, de domingo a domingo. E era isso o que lhe sobrava às vezes – ter que ele próprio lavar, pois o time tinha que estar elegante quando o juiz apitar.

Mas, naquele dia em que eu vi “seo Valdemar” não parei. Como das outras vezes eu iria ver tristeza no seu jeito de ser e com olhos quase molhados pois se os campos de futebol eram o prolongamento do seu lar, aos poucos o progresso estava tirando o que seria também a continuidade da sua própria vida. Como tirar essas crianças da rua se acabaram com o Estádio Municipal, Estádio do Palmeiras, Estádio do Estrela e nem a própria Ferroviária tem o que deveria ser seu, em seu nome, o campo de futebol?

Via quase sempre nele o desgosto, foram anos e anos, lutando pela formação do cidadão, despretensioso, quieto, fala mansa, a buscar algo que parecia chegar ao fim.

Mas, ele cumpriu o seu papel como ser humano disposto a estender a mão ao próximo. Na sua  Escola de Futebol foi ele o presidente, o treinador, o roupeiro a romper o silêncio igualzinho a tantos outros como Zé Lemão, Tota, Tim, Armando Clemente, Mau, Dorival Crepaldi, Noé, que escreveram, cada um ao seu jeito, a base do nosso esporte amador, formando atletas que depois seguiam para times de grande porte.

Agora, tal como no futebol sustentado por rios de dinheiro, vamos imaginar que os céus precisam de um bom técnico neste momento para o Campeonato Mundial Azul Celeste que recomeça logo depois da pandemia. Por empréstimo então vai “seo Valdemar Verri”, o pai do vereador Magal, o soldado de todos os tempos a formar a Guarda de Honra para quem haverá de chegar.

*Ivan Roberto Peroni, jornalista e membro  da ABI, Associação Brasileira de Imprensa

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