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‘Milena poderia sair de um lugar comum’, diz pesquisadora local

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Para Valquíria Tenório, personagem negra da Turma da Mônica poderia ter avançado o ‘historicamente óbvio’: a criação em uma família de músicos e de jogadores de futebol.

turma da monica milena TRATVia redes sociais, o cartunista Maurício de Sousa anunciou uma grande novidade para 2018: nos primeiros meses deste ano, a Turma da Mônica terá a primeira personagem negra em suas revistas de quadrinhos: Milena Sustenido viverá aventuras ao lado dos pais e irmãos sempre em um ambiente ligado à música e futebol. 

Na avaliação de Valquíria Tenório, membro do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros e Indígenas (NEABI), professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP – Matão), e doutora em Sociologia pela UFSCar, uma reflexão positiva sobre essa ação vai ao encontro de três pilares: a socialização, identidade e representatividade.

“É provável que os ecos e reivindicações dos movimentos negros e feministas, que discutem, tencionam essas questões, tenham chegado aos ouvidos do editor. Ou pode ser um amadurecimento do marketing da empresa, que passou a observar a sociedade brasileira por outras lentes”, analisa.

Porém, um detalhe chamou, negativamente, a atenção da pesquisadora e professora. Para ela, não há uma ruptura em relação ao esperado para o negro na sociedade brasileira, isto é, a família Sustenido reitera um lugar historicamente definido: música e futebol.

“Não é um lugar ruim, afinal temos grandes nomes em ambas as áreas. Deixo destacado que não é isso que estou dizendo. Porém, Maurício de Sousa poderia ter ido mais longe nos tempos atuais, trazendo  uma Milena em uma família negra na ciência, por exemplo?”, questiona.

Profa. Dra. Valquíria Pereira Tenório TRATHOMENAGENS

Para contextualizar sua linha de pensamento, Valquíria lembra a história da Profa. Dra. Joana Félix, uma mulher negra cientista da área da Química que tem feito trabalhos brilhantes, aparecendo na mídia constantemente. Ela também ressalta o trabalho do Prof. Me. Carlos Machado “Gênios da Humanidade: ciência, tecnologia e inovação africana e afrodescendente”, lançado  em 2017 e já esgotado.

“Muitos são os exemplos. Será que o editor ou sua equipe conhecem esses dados? Se sim, por que não se arriscaram em criar uma personagem com um perfil diferente? Por que bater na velha fórmula da música e do futebol? Foi algo pensado, intencional ou seria mais um exemplo de como a nossa sociedade se construiu com definições bem evidentes dos papéis de brancos e negros?”, pergunta.

Defendendo sempre novas fórmulas e quebra de paradigmas, Valquiria Tenório aguarda  as histórias a serem escritas com certa ansiedade. “Quem sabe elas possam suprir (ao menos um pouco) a falta de representatividade negra tão escancarada em uma rápida passagem por uma banca de jornal brasileira”, finaliza.