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Carlos Coutinho, o pioneiro dos lanches de rua em Araraquara. Era o ‘Au-Au’.

Dois dias após seu falecimento relembramos uma das façanhas pioneiras do cirurgião dentista Carlos Coutinho de Oliveira Filho: ele e alguns empresários entraram no ramo de alimentos em Araraquara; em 1968 surgiu o carrinho de lanches, então inédito na cidade. Cinquenta e quatro anos depois, o RCIA recorda o sucesso do Au-Au Lanches.

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Ciro Camargo, Nelson Bueno da Silva, Arnaldo Smirne, Carlos Coutinho de Oliveira Filho e os irmãos Munaretti com o primeiro carrinho de lanches que circulou pelas ruas da cidade

Filho de uma doméstica e de um ferroviário, Carlos Coutinho de Oliveira Filho, ou doutor Coutinho para os amigos, foi diretor de futebol profissional da Ferroviária de 1964 até 1969, cirurgião-dentista formado pela Unesp de Araraquara, vendedor, empreendedor e, como ele mesmo diz, um autodidata. Quando completou 80 anos, ele disse ao RCIA que teve uma vida muito boa. “Sempre fui muito honesto e fiel à minha esposa. Estamos casados há 55 anos (hoje seriam 63 anos). Quero sempre o bem do próximo e fui um batalhador. Fiz tudo o que poderia fazer”, revelou.

Foi ocupando um dos mais altos cargos da AFE, que ele criou os primeiros carrinhos de lanches em Araraquara. Em 1968, 7 de abril, um domingo, Arnaldo Smirne, Ciro Camargo, Raphael Rodrigues e Coutinho acompanharam um jogo da Ferroviária em São José do Rio Preto. Andando pelas ruas, viram algo inédito até então. Um carrinho de lanches feito de forma artesanal e muito simples, que vendia hot-dog. Ficaram surpresos com a criatividade de poder vender lanches em qualquer parte da cidade. Foram até o vendedor, que explicou como funcionava.

As festas de aniversário, principalmente das crianças, passaram a exigir a participação do Au-Au Lanches que se tornou “uma febre na cidade”

Doutor Coutinho sempre contava a história com detalhes. “Tudo era mágico. Jamais tínhamos visto aquilo. Conversamos sobre a novidade durante a viagem de volta para Araraquara. Não perdemos tempo e fomos logo atrás de resolver tudo. O cunhado do Arnaldo, Walter Lima, era um excelente marceneiro. Ele nos fez dez carrinhos que ficaram a coisa mais linda que eu já vi, todos padronizados. Enquanto o Walter fabricava os carrinhos, fomos para São Paulo e compramos tudo o que era possível. Panelas, butijões de gás com reserva, a mostarda da marca Jimmy, etc”.

Com muito entusiasmo, Coutinho contava que seus amigos e ele andaram por muitas cidades para experimentar os tipos de hot- dog que existiam. “Fomos para Ribeirão Preto, Campinas, Bauru, Rio Preto e até São Paulo. O melhor de todos, com certeza, foi o que comemos em 1968, na rua Francisco Glicério, em Campinas. Fantástico!”

Após algum tempo, Raphael Rodrigues saiu da sociedade, por incompatibilidade na agenda. No lugar dele entrou o Nelson Bueno da Silva, o Neno.

Ao voltar para Araraquara, com quase tudo finalizado, Coutinho foi até a proprietária da panificadora Flório. Na ocasião, formularam uma receita de pão, cujo sabor era um pouco adocicado, diferencial para outros tipos de lanches.

Os quatro amigos procuravam locais para abrir uma lanchonete fixa, que vendesse os hot-dogs e reabastecesse os carrinhos pelas ruas. Então, por muitos anos, o endereço do Au-Au foi na Avenida XV de Novembro, em frente ao antigo chafariz da Igreja Nossa Senhora do Carmo.

Em sua casa, Coutinho lembrava sempre dos bons tempos do Au-Au e dos então meninos – Munaretti

Coutinho contou as experiências e a fase “romântica e poética” da época. Os dez carrinhos de lanches participaram da abertura das festividades natalinas de 1968. “Desfilamos com todos os nossos carrinhos atrás do caminhão que carregava a banda do Olavo Filipe”.

Tempos depois, o Au-Au foi contratado para servir na festa de confraternização da antiga empresa Anderson Clayton. “Os organizadores do evento pediram para prepararmos 3 mil lanches. Começamos a preparar no sábado à tarde, trabalhamos toda a madrugada e domingo de manhã seguimos com os carrinhos para a indústria. Trabalhamos demais esse fim de semana. Ainda tive a infelicidade de, quase acabando a festa, ser mordido por um cachorro que me rendeu mais de dez vacinas contra doenças, no umbigo. Naquele dia, cheguei em casa às 17h e dormi até a manhã de segunda-feira”.

Para melhorar ainda mais a qualidade dos produtos, a dona Vilma Carnesecca, mulher do Neno, preparou um molho que foi adicionado aos ingredientes do lanche. “Ela melhorou ainda mais nossos lanches. Era delicioso, não tinha para ninguém”, relembrava Coutinho.

Depois de alguns anos – que não soube precisar – os amigos se reuniram para decidir o destino do Au-Au. Foi o fim da era de carrinhos de hot-dog em Araraquara. “Estávamos muito ocupados. Cada um tinha suas coisas fora do Au-Au. Tínhamos empreendimentos. Construímos dez edifícios na cidade, fora os loteamentos do Vale do Sol, Martinez e outros tantos. Não conseguiríamos mais dar conta de todo aquele sucesso”.

O fim dos dez carrinhos de lanche e de tudo o que tinha nele, nem Coutinho nem o Neno souberam dizer, em 2014, quando deram a entrevista ao RCIA. O que sobrou foram as fotos do auge do Au Au Lanches, que encantava as crianças pelo logotipo feito pelo pintor araraquarense Cabral.