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Ferroviária 70 anos: o descenso e o acesso se transformaram em Tri do Interior

Além de marcar seu nome na história do futebol paulista, a Ferroviária teve também o privilégio de encarar a Seleção Brasileira, que se preparava para a disputa da Copa do Mundo do Chile, em 1962.

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A Locomotiva grená de 1966 ficou na história do futebol paulista

RCIARARAQUARA revisita mais uma vez a parte da história da Ferroviária, que agora parte para a década de 1960, onde tiveram lágrimas de tristeza e de muita alegria, colocando a equipe em um outro patamar.

Após iniciar a sua primeira década com acesso ao Campeonato Paulista, onde ocupou a terceira colocação em 1959, e com a excursão para África e Europa, a Locomotiva continuou vagando muito bem nos trilhos e mostrou-se um clube que começaria a revelar bons jogadores ao futebol brasileiro.

Em 1961, o ponta-direita Faustino e o atacante Pimentel foram envolvidos em uma troca com o São Paulo, que cedeu o centroavante Peixinho e se tornaria uma das mais importantes figuras da história do clube grená.

No mesmo ano, a equipe participou de um jogo decisivo. No dia 13 de dezembro, na Vila Belmiro, o Santos goleou a Ferrinha por 6 a 2 e ficou com o título do Campeonato Paulista. A disputa da competição era por pontos e o time araraquarense terminou na quinta colocação, sendo o melhor do interior. No ano seguinte, repetiu a dose, mas terminou na sexta posição.

JOGO-TREINO CONTRA A SELEÇÃO BRASILEIRA

Jornal Folha de São Paulo de 30 de abril de 1962 destacou o jogo-treino entre Brasil x Ferroviária

Por possuir um futebol de muita técnica, em 29 abril de 1962, a Ferroviária recebeu um convite para participar dos treinamentos da Seleção Brasileira na cidade de Serra Negra, São Paulo, que se preparava para a disputa da Copa do Mundo, ano do bi mundial.

A esquadra brasileira contou com dois times, azul e amarelo. Foram três tempos de 40 minutos, em que a Ferroviária enfrentou a Seleção Azul, o time considerado reserva, e empatou por 0 a 0. No jogo seguinte, as seleções se enfrentaram e também ficaram no zero.

No terceiro e último jogo, o Seleção Amarela, time titular, acabou levando a melhor e, com gols de Didi, de pênalti e de falta com seu famoso chute “folha seca”, venceu o escrete grená por 2 a 0.

A Seleção Amarela foi a campo com Gilmar; Djalma Santos, Bellini, Jurandir e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo.

Já a Ferroviária encarou a seleção com Toninho; Ismael, Antoninho, Rodrigues e Zé Maria; Dudu e Bazzani; Mateus, Laerte, David e Beni.

Estiveram presentes no Estádio Municipal de Serra Negra 5.034 pagantes, para renda de Cr$ 1.697.700,00.

Apesar do revés, o jornal “Folha de São Paulo” destacou, no dia seguinte das partidas amistosas, a boa apresentação feita pelo time grená diante da esquadra brasileira. Confira:

“DOMÍNIO DA FERROVIÁRIA

O terceiro período do treinamento foi o que mais interesse despertou pois a seleção amarela, considerada a titular, enfrentava a equipe da Ferroviária que já havia descansado durante 40 minutos. Dudu repetindo suas atuações no Campeonato Paulista fez com que a equipe da Ferroviária se destacasse de forma exuberante.

Esse período foi bastante prejudicado pelo mau estado da cancha pois a essa altura chovia constantemente.

A Ferroviária, nos primeiros minutos dessa fase do jogo, encontrou várias oportunidades para finalizar com sucesso, aproveitando-se da falta de melhor estado físico do médio de apoio Zito, o qual abria vários corredores, por onde se infiltrava com facilidade o meia armador Bazzani. Contudo, a equipe de Araraquara não conseguia superar o arqueiro Gilmar, que cumpria sua primeira e destacada atuação desde que foi convocado para este selecionado.

Aos 5 minutos, Rodrigues, que vigiava individualmente Pelé, cometeu falta quando o mesmo procurava infiltrar-se. A falta cobrada por Didi foi convertida em gol.

Aos 7 minutos, após uma boa “tabelinha” entre Dudu e Laerte, este último arrematou, mas a bola foi defendida bem por Gilmar.

Aos 14 minutos, Gilmar teve outra oportunidade quando Beni do lado esquerdo e a 15 metros arrematou forte. Dez minutos depois, era Bazzani que se apresentava e arrematava falta para fora da meta.

Aos 25 minutos, Bazzani cortou bola com a mão, cometendo falta fora da área. Didi cobrou esta falta executando a sua conhecida “folha seca” que surpreendeu o guardião Toninho.

Até o final do encontro após a marcação do segundo tento, houve ainda domínio da equipe da Ferroviária.”

A SEGUNDA EXCURSÃO

Já em 1963, a Ferroviária realizou sua segunda excursão internacional, desta vez na América do Sul e Central.

Sob o comando de Francisco Sarna, a equipe disputou 17 jogos, sendo oito na Colômbia, e o resultado foi positivo: 14 vitórias e apenas três derrotas, marcando 49 gols e sofrendo 12, ficando com saldo positivo de 37 gols.

Delegação afeana antes do embarque para a excursão nas Américas

DUDU NO PALMEIRAS

Depois de surgir no escrete grená em 1959, Olegário Tolói de Oliveira, o Dudu, se transferiu para o Palmeiras no dia 31 de março de 1964, justamente quando deu início ao golpe militar no Brasil.

O site do Palmeiras traz um curioso trecho sobre os apuros em que o jogador, que faria parte das Academias alviverde entre 60 e 70.

“Depois de cinco anos brilhando no interior, chamou a atenção do Palmeiras e foi contratado em 31 de março de 1964, curiosamente na data em que eclodiu o golpe militar no Brasil, fato que dificultou o retorno de Dudu a Araraquara porque a estação ferroviária fora fechada. A sorte foi que o hotel onde a Ferroviária costumava se hospedar ficava próxima à estação, e o gerente era seu conhecido. Assim, mesmo sem dinheiro para pagar a diária, o garoto teve onde dormir.”

EM 65, O REBAIXAMENTO. EM 66, O ACESSO

O ano da Locomotiva em 1965 não foram dos melhores e conheceu, pela primeira vez, o rebaixamento para a Primeira Divisão (de acesso) do Campeonato Paulista depois de exatos 10 anos na elite.

Mesmo contando com experiência e com jogadores que passaram por grandes clubes, não adiantou. Naquele ano, o diretor de futebol grená, Arnaldo de Araújo Zocco, o popular Cana, em carta enviado ao jornal “O Imparcial”, convocou a imprensa e os intelectos araraquarenses do futebol para debater qual rumo a Ferroviária deveria tomar para que o rebaixamento não fosse sacramentado, mas foi em vão.

Foram 30 jogos, obtendo apenas quatro vitórias, cinco empates e incríveis 21 derrotas. Marcou 32 gols e tomou 58, ficando com saldo negativo de 26.

Porém, no ano seguinte, quando manteve uma base e contrataram alguns jogadores, a Locomotiva mostrou um futebol de encher os olhos e encantou o estado de São Paulo. E uma coisa rara aconteceu neste período: a cidade abraçou o time. A frase “Ela Voltará!” foi espalhada e podia ser vista nos principais pontos da cidade.

Com uma campanha irretocável sob o comando de Agenor Gomes, conhecido como Manga (ex-goleiro do Santos), a equipe concretizou 30 jogos na competição, venceu 19, empatou oito vezes e foi derrotada em três oportunidades.

Na decisão, a Ferroviária encarou a equipe do XV de Piracicaba em dois jogos, realizados no estádio Paulo Machado de Carvalho, no Pacaembu, em São Paulo.

O primeiro jogo, realizado no dia 18 de dezembro, domingo, as equipes empataram por 1 a 1. Passarinho fez para o grená, enquanto Nicanor marcou para o alvinegro.

Na segunda partida, realizada no dia 21, uma quarta-feira, Maritaca fez o gol que deu o segundo título da divisão para a Locomotiva e retornava assim à elite.

Bazzani foi o artilheiro da equipe na competição com 13 gols. Na temporada, o centroavante Téia assinalou 24 gols.

A equipe campeã foi a seguinte: Machado; Beluomini, Brandão, Rossi e Fogueira; Bebeto e Bazani; Passarinho, Maritaca, Téia e Pio. Técnico: Manga.

Faixa do campeonato de 66 exposta no Museu do Futebol – Crédito: Paulo Micali

TRICAMPEÃ DO INTERIOR

As três estrelas ostentadas acima de seu escudo até hoje é representada pelo tricampeonato do interior, conquistados em 1967, 68 e 69, por ter sido a melhor equipe fora de São Paulo melhor colocada que os demais no Campeonato Paulista. O troféu era patrocinado pelo jornal Folha de São Paulo.

Em 1968, na entrega das faixas pela conquista de 67, o destaque foi para a presença da atriz romena Jacqueline Myrna, que integrava o elenco da Praça da Alegria, que nesta época era transmitido na TV Record.

Jacqueline Myrna com a chave de Araraquara

Por puxar muito a letra ‘R’, Myrna aparecia no quadro humorístico e diversas vezes pronunciava “Arrrrarrrraquarrrra”. Simpática, a artista foi convidada e compareceu na Fonte Luminosa Além da entrega das faixas, também segurou a chave de Araraquara e fez um desfile de carro aberto pela cidade.

Voltando para as quatro linhas, na campanha de 1968, ocupou novamente a terceira colocação do Campeonato Paulista. Foram 26 jogos, com 11 vitórias, oito empates e sete derrotas. Marcou 42 gols e sofre 31, ficando com saldo de gols positivo de 11.

Além disso, Téia desbancou ninguém menos que Pelé e foi artilheiro da competição com 20 gols.

Em pé: Antenor, Rossi, Bebeto, Fogueira, Baiano, Machado, Jacqueline Myrna e Aldo Comito; agachados: Valdir, Maritaca, Teia, Bazzani e Nei.

AMISTOSO COM O NAPOLI E TERCEIRA EXCURSÃO

Em comemoração ao bicampeonato do interior, a Fonte Luminosa recebeu o seu primeiro jogo internacional no dia 9 de junho de 1968, quando o Napoli apareceu na Morada. Os italianos estavam excursionando pelo Brasil, onde enfrentou Coritiba, Palmeiras e Ponte Preta, empatando estes confrontos.

Com grande recepção na cidade, a Locomotiva fez bonito e não tomou conhecimento do adversário, emplacando 4 a 0. Zé Luis foi o destaque do jogo, marcando três gols. Bebeto fez o outro.

Em novembro do mesmo ano, a equipe se aventurou mais uma vez pelas Américas do Sul e Central, sendo esta a sua última excursão em sua história, encarando as seleções do Haiti, El Salvador, Honduras e Costa Rica.

Foram 13 jogos, com nove vitórias afeanas, três empates e apenas uma derrota, marcando 22 gols e sofrendo nove gols, ficando com saldo de gols positivo de 13.

Já no dia 17 de agosto 1969, a Locomotiva disputou o Torneio Quadrangular de Goiânia, vencendo o Vila Nova (GO), na decisão, por 3 a 2.

Por ter conquistado o tricampeonato do interior em 1969, ficando na sexta colocação do Campeonato Paulista, o clube ficou com a posse definitiva do troféu promovido pela Folha de São Paulo.

Em 1970, a equipe realizou um amistoso comemorativo pela conquista diante do Palmeiras, na Fonte Luminosa, e venceu o prélio por 3 a 2. Nei, duas vezes, e Valdir fizeram os gols grenás.

No mesmo ano, a equipe ficou na sétima colocação no Paulista e foi vice do Interior, ficando atrás apenas da Ponte Preta, que somou mais pontos naquela edição.

Os 22 jogadores de Ferroviária e Napoli juntos para a foto histórica na Fonte Luminosa

Fontes: Blog “Ferroviária Em Campo”, de Vicente Baroffaldi; Livro “Fonte Luminosa”, de Luis Marcelo Inaco Cirino; Acervo Folha de São Paulo