Serra está iluminada até o topo
Cerca de 50 montanhistas se uniram na região do Campo das Vertentes, em Minas Gerais, em torno de uma iniciativa inédita no Brasil. Eles iluminaram o trajeto até o topo da Serra São José, que divide cinco municípios: Tiradentes, São João Del-Rei, Prados, Santa Cruz de Minas e Coronel Xavier Chaves. O objetivo era gerar imagens que contribuam tanto para o debate da preservação ambiental quanto para celebrar a história da região.
Hoje, atraente ao ecoturismo devido à sua beleza natural e à concentração de cachoeiras, a Serra de São José tem importância econômica e histórica para Minas Gerais. Em suas encostas, bandeirantes paulistas que desbravaram a região encontraram ouro no início do século 18. Mais tarde, a região sediou diversas reuniões de líderes da Inconfidência Mineira. Eles se encontravam ao pé da serra, na Fazenda Ponta do Morro, que pertenceu a Hipólita Jacinta de Melo, a única mulher entre os inconfidentes. A Serra São José traz ainda resquícios de um tempo histórico, como os acessos a trechos vicinais da Estrada Real e à Calçada dos Escravos, um caminho de pedras feito por negros vítimas das escravidão no auge da mineração.
A iluminação foi feita no último sábado (23) e ocorreu em trajeto que tem início em Prados, município que tem pouco mais de 8 mil habitantes. A iniciativa, que recebeu o nome de projeto “Caminho de Luz”, foi idealizada pelo geógrafo Roberto Franco. Ele conta que o evento gerou grande expectativa na cidade. “As luzes ficaram acessas das 18h às 20h30 e os moradores se mobilizaram para apreciar a cena, que pôde ser vista de diversos locais. Houve também uma movimentação de diversos fotógrafos que buscaram pontos estratégicos e os melhores ângulos para fazer as imagens”.
Roberto explica que a iniciativa, colocada em prática pela primeira vez no Brasil, foi inspirada em experiência realizada em 2015 no Matterhorn, uma montanha da cordilheira dos Alpes, localizada na Suíça, perto da fronteira com a Itália. “Lá, a montanha é mais íngreme, neva e houve apoio de fabricantes de equipamentos de escalada. As lanternas usadas eram de extrema qualidade. Aqui aproveitamos a cultura de montanhismo na cidade e fizemos uma grande mobilização de voluntários, sem os quais não conseguiríamos atingir o objetivo”.
Assim como a experiência nos Alpes marcou os 150 anos da primeira expedição ao cume do Matterhorn, a mobilização dos montanhistas mineiros também celebrou os 150 anos do Passeio à Serra São José, organizado anualmente por moradores de Prados. A expedição integra o calendário oficial do município. Segundo Roberto Franco, é o passeio ecológico em montanha mais antigo do Brasil.
CONSERVAÇÃO
O projeto “Caminho de Luz” recebeu o apoio estrutural da prefeitura de Prados e do Instituto Estadual de Florestas (IEF-MG), órgão que é responsável pela gestão e conservação da Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra São José. “Tudo o que aumenta a visibilidade da unidade de conservação contribui e chama atenção para a importância da preservação. Tomara que aconteça novamente nos próximos anos”, diz Itamar Christófaro Silva, gerente da APA.
Segundo ele, há uma preocupação permanente com incêndios que ocorrem no período mais seco da região, entre agosto e outubro, e os casos quase sempre são decorrentes da ação humana. Uma média de 150 hectares são atingidos anualmente, mas as ocorrências vêm se reduzindo devido ao trabalho de prevenção e patrulhamento. Itamar afirma que as principais causas observadas são a ação ilegal de criadores de cavalos, que invadem áreas de propriedades alheias, e o descontrole do fogo ateado a lotes. Ele destaca, porém, que os proprietários de fazendas próximas à Serra São José estão deixando de recorrer a queimadas nos últimos anos.
“A evolução da conscientização da população tem ajudado. De 2016 para 2017, houve redução de aproximadamente 30% de área queimada. O que não significa que não possamos ainda ter grandes incêndios, pois depende muito das condições do clima, do vento, de onde se inicia”, diz o gerente.
De acordo com o IEF-MG, a Serra de São José tem rica biodiversidade, reunindo ambientes com vegetação distinta, incluindo áreas de Mata Atlântica, cerrado e campos rupestres. O órgão estima que a região serve como habitat para cerca de 120 espécies de libélulas, o que representa quase 50% de todas as espécies conhecidas em Minas Gerais e 18% das mapeadas no Brasil. Além disso, ela abriga aproximadamente 240 espécies de aves, 80 de orquídeas e, pelo menos, nove de mamíferos, algumas delas ameaçadas de extinção como o lobo-guará e algumas espécies de primatas.
Agência Brasil