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Crônica – Aos poetas que ficam e aos que se foram

Texto dedicado ao poeta Rogério Noia da Cruz (em vida) ,Pedro Paulo Zavagli, o Spiga e Zé Roberto Telarolli (em memória)... e também ao Pedrinho Renzi, que saiu na foto

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Noia entre os poetas Spiga e Pedrinho Renzi pelos bares da cidade
Pedro Paulo Zavagli, o Spiga

Rogério Noia da Cruz é um dos bons amigos que a vida me apresentou.  Conheci o poeta no início dos anos 2000 na redação do jornal O Imparcial por meio do amigo Teroca. Ele estava acompanhado pelo inseparável amigo, poeta e compositor Pedro Paulo Zavagli (Spiga), que nos deixou nesta quinta-feira (14).

Estava lá para uma entrevista sobre seu mais recente livro de poemas. Logo no começo do bate-papo, percebi que tanto ele quanto o Spiga estavam desconfortáveis. Mexiam-se na cadeira sem parar. Na mesma hora, levantei e os convidei para continuar a conversa no Bar da Imprensa, a poucos metros da redação, que era na Av. José Bonifácio, quase esquina da Rua 5.

Brindamos com um copo de cerveja, mas ainda assim não estavam totalmente à vontade. Pediu uma dose de pinga, bebericou e aí sim começou a prosear. Ficamos os três ali a tarde toda. Foi o começo de uma grande amizade.

Sempre que vinha a Araraquara saíamos eu, ele e o Spiga para algum bar. Seguíamos pela boemia – no Centro, na Vila – bebendo e conversando sobre as coisas boas da vida.

“Vida Versada em Samba e Soneto” foi o primeiro livro do Noia a que tive contato. Depois, em 2007, lançou “Girassol”. Já em 2009, gravou o CD “Pequeno Ensaio de um Poeta em Construção”, em que assina as letras sozinho e com parceiros como Eduardo Gudin, Ibys Maceioh, Teroca, entre outros, com participações de grandes músicos e intérpretes como Dominguinhos, Renato Teixeira, Osvaldinho da Cuíca, Carmen Queiroz, Dona Inah e Sérgio Turcão.

Jornalista Luís Zakaib com Rogério Noia da Cruz apresentando o documentário Revolução da Cuíca para Osvaldinho da Cuíca em São Paulo

Além da literatura e da música, passou a se dedicar também ao intercâmbio cultural entre Brasil e Cuba. Em setembro de 2011 tive a felicidade de integrar um dos grupos que foi à ilha de Fidel. A viagem resultou no documentário “Revolução da Cuíca”, que mostra a “guerrilha cultural” do mestre Osvaldinho da Cuíca e seus camaradas.

Demonstrando seu estreito laço com Araraquara, produziu o CD “Poeta das Vilas” em homenagem ao poeta e compositor araraquarense José Roberto Tellaroli. O show homônimo foi apresentado no Teatro Municipal em agosto de 2013.

Em 2015, voltou à Morada do Sol para lançar mais um trabalho, “Poemas Escolhidos”, que marcava 33 anos de poesia – o primeiro livro foi “Fato ato feito”, de 1982, época em que ingressou na Faculdade de Letras da PUC-SP. 

Nesta semana, perdeu seu grande amigo Spiga, com quem viveu muitos momentos de amizades nos bares da vida e nos palcos. Eram mais que irmãos. Spiga era um poeta de corpo e alma. Autêntico, sem firulas. 

Spiga compôs dezenas de letras de músicas e poemas, algumas já imortalizadas na voz e nos instrumentos de cantores e instrumentistas, sobretudo artistas araraquarenses. Muita coisa deve estar guardada e precisa ser resgatada.

O poeta Zé Roberto Telarolli

Nesse momento em que Araraquara fica um pouco menos poética, inevitável lembrar da obra de outro poeta, Zé Roberto Telarolli, homenageado por Noia na música “Poeta das Vilas”, que fala da morte do poeta:

“Santo Antônio estava escura
e apesar da luz da lua
toda Vila escureceu
fez-se um breu de amargura
frente a praça ao rés da rua
um poeta emudeceu”

Porém, os três últimos versos nos remetem à vida que segue e é por isso que fiz a referência e a reverência ao amigo Noia, que hoje optou por Araraquara para fazer sua morada:

“Reacende Araraquara
que o poeta está na vala
mas seu samba não morreu.”
(Rogério Noia da Cruz)

por Luís Zakaib