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Porque jogam futebol, não deixarão de ser lindas. E campeãs…

Por Ivan Roberto Peroni

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É verdade que nem o mais incomodado dos homens desta minha cidade, naquele dia de final do Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino, conseguiu se calar. Ainda que com meio sorriso escapando pelos cantos da boca, esboçou um gesto de felicidade, enquanto as mulheres se arrepiavam por sentir que havia dentro delas um grito de liberdade.

A Ferroviária que até então chegara a ser tri-campeã de futebol só no interior por força e talento dos homens, agora se tornara campeã brasileira pelas mãos de uma mulher, goleira valente, e de sobra pelos pés da outra mulher que por ironia do destino lhe sobrara a chance de esconder a bola onde bem quis.

Elas hoje são mais que iguais, são melhores ainda, pois lhes sobram o amor próprio, uma espécie de amor divino esmaltado pela cor do vinho e do sangue que derramam por paixão a arte. São guerreiras, são grenás, debochando de um Getúlio Vargas que num passado até bem recente – mais exatamente, há 40 anos – sentenciava pela força inapropriada dos tempos de que o futebol, no Brasil, considerava por decreto, que seria uma prática inapropriada para mulheres.

E Getúlio então durante a ditadura do Estado Novo, no artigo 54 do decreto-lei 3.199, afirmava que ”às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país”.

Ora, é que o distinto presidente não conheceria então o poder destas mulheres que desconhecendo os caminhos incertos da política seriam a simbologia da pátria e por extensão da nossa terra, não por acaso, mas pelo capricho de amar o que Deus lhes deu escrevendo que elas – estariam acima de todas as coisas, até mesmo da natureza feminina de serem – só mãe.

Se Vargas tinha em seu discurso a ideia da mulher como alguém que só deve cuidar da família e que deve gerar os filhos fortes da nação, a ele sobra mergulhado no outro lado da vida o sopro que o destino lhe informa que – somos uma cidade de campeãs.

Ele, quem sabe associava essas mulheres ao belo, ao feminino, ao maternal, ao delicado e até entendia que nenhum desses adjetivos tem ligações com o esporte, mas nem por isso o relógio vai deixar de andar, os tempos são outros e se elas nos dão a oportunidade para um sorriso é preciso que entendamos que estarão sempre dentro do esporte a desafiar a “essência feminina” idealizada por ele, presidente.

Porque jogam futebol, não deixarão de ser lindas. São maravilhosas, encantam nossos dias, se submetem aos caprichos do ganhar pouco em relação aos homens que não dividem bola, que fogem da zona do perigo, que preferem ser covardes vivos do que heróis mortos. Creio, que até por serem chamadas de “guerreiras” tem validade a revogação do que Getúlio escreveu, pois a vida não lhe deu tempo de conhecer o que essas meninas grenás deixariam para um outro lado da história.

Parabéns campeãs brasileiras, a cidade lhes deve muito mais…

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